Chegou a ser vetado pela Igreja e “acusado” de deturpar o sabor dos alimentos. A forma atual tem dedo de um príncipe francês.
Se há expressão reveladora da forma como o talher dentado é hoje universalmente aceite é a do “bom garfo”, aplicada a todos quantos gostem de comer bem. Mas a história deste objeto não se faz de consenso nem de reconhecimento imutável. Pelo contrário, chegou a ser proibido pela Igreja, por causa da associação, imagine-se, ao Diabo.
Antes disso. Para descobrir a origem deste objeto é preciso recuar até uns séculos antes de Cristo, por alturas da civilização grega. Na altura, o garfo, com dois dedos apenas, era usado única e exclusivamente para servir os alimentos – até porque naquela época se comia com as mãos.
Mais tarde, em meados do século XI, a filha do imperador Constantino VIII, de Constantinopla, trouxe para a Europa uma novidade: um garfo dourado de dois dedos que, pasme-se, usava para espetar a comida. Podia ter sido o início da nova vida deste objeto, mas não. É aqui que começa a embirração da Igreja a propósito do mafarrico. Diziam os senhores do Clero que esse garfo se assemelhava demasiado à forquilha do Diabo. E que sendo os alimentos uma dádiva divina deveriam ser comidos à mão.
Foi preciso esperar, por isso, até ao século XV para ver o garfo voltar a dar que falar. Primeiro em Itália, depois em França, onde ainda assim se deparou com uma certa resistência: agora, o argumento era de que o metal deturpava o sabor da comida. Quem muito contribuiu para acabar de vez com os estigmas foi o rei Henrique III, de Inglaterra, que criou o garfo individual, tornando todo o conceito bem mais higiénico. Estava então aberto o caminho da aceitação universal.
Tanto que, algures pelo século XVII, o paradigma já se tinha invertido: comer com as mãos era agora o problema, enquanto a utilização dos talheres era vista como prática associada a um certo status quo. Nesse mesmo século, o garfo “ganhou” o terceiro dente, com o quarto a aparecer já no século XIX, muito graças ao príncipe francês Fernando de Bourbon, que não se amanhava a comer esparguete nos garfos de três dedos. Consta que era um bom garfo.