Secretismo e suspense são os ingredientes-chave dos Escape Games. Fortemente afetado pela pandemia, o negócio reinventa-se com desafios online e novos espaços no Porto e em Caminha.
Quatro paredes brancas e uma televisão. À entrada, tudo parece diferente da maioria dos Escape Games, em que a decoração é um ponto forte. Depois de a porta fechar, só resta uma hora. A música de suspense é constante, para pôr os nervos em franja. O trabalho de equipa é fundamental, a comunicação é a chave para a saída. No novo jogo de fuga, os enigmas aparecem de onde menos se espera e as tarefas vão-se complicando.
O nível de dificuldade é grande, pois neste novo jogo localizado no Estádio do Dragão, no Porto, apenas 12% dos participantes conseguem escapar. Chama-se A.I. Manager e consiste numa entrevista de emprego para a equipa técnica do F. C. Porto, tudo comandado por uma inteligência artificial. Abriu portas no mês passado e promete ser a reinvenção de sucesso dos Escape Games em Portugal, numa parceria entre a Porto Exit Game e o clube portista. Mais a norte, em Caminha, outra novidade: o desafio é escapar do Forte da Ínsua.
Para quem não está familiarizado com a tendência, os Escape Games consistem num jogo em que uma equipa é fechada num espaço (que pode ter uma ou várias salas) e dispõe de um determinado tempo, normalmente uma hora, para conseguir escapar, procurando pistas e resolvendo desafios. As histórias por detrás do jogo podem ir desde a fuga de um museu ou escapar de um grupo terrorista. O secretismo e o enredo são fundamentais para os jogadores se sentirem numa experiência imersiva. “É como estarmos dentro de um filme”, resume Jorge Correia.
O entusiasta de Escape Games e dono da empresa de jogos de fuga mais antiga a funcionar em Lisboa recorda que “o primeiro jogo que abriu em Portugal foi um sucesso estrondoso, com três semanas de espera para marcar um jogo, mas foi por volta de 2017 que se começou a dar a massificação”. A primeira empresa do género surgiu em 2014 e esse foi também o primeiro contacto de Jorge Correia com o conceito. “É isto”, pensou, e no ano seguinte decidiu abrir a própria empresa, a Puzzle Room.
Desde aí, todas as viagens servem para ter a experiência em diferentes pontos do Globo. Japão, Estados Unidos da América, Holanda, Grécia, entre tantos outros. A base do jogo é a mesma em todo o lado, mas “há uma diferença muito grande no conceito de jogo entre continentes”, seja pela a construção, a história ou o tipo de enigmas.
Uma das pioneiras em Portugal é a Porto Exit Games. Fundada em 2014, foi a segunda empresa do setor a abrir e atualmente é a mais antiga ainda em funcionamento. Nasceu pelas mãos de um casal que teve o primeiro contacto com o conceito em Espanha e percebeu que com os jogos de fuga conseguiriam escapar dos empregos incapazes de arrancar os sorrisos que agora recebem diariamente. Joaquim Valente era engenheiro informático e foi o primeiro a deixar o emprego. Thais Nomi, médica ortopedista, estava cansada da carga negativa associada à profissão. “Agora sinto apenas gratidão e alegria sempre que um grupo de clientes termina um jogo.”
Os Escape Games surgiram na Ásia, por volta de 2009, segundo Jorge Correia. A história que se conta acerca da origem do conceito é a de um homem desempregado que, inspirando-se nos jogos de computador e telemóvel baseados no mesmo conceito de resolução de enigmas, decidiu trazê-los para a vida real. Quando o jogo surgiu em Portugal, já estava no auge pela Europa.
O segredo é a alma do negócio
Apesar de ser uma tendência em todo o Mundo, são poucos os grupos organizados desta comunidade. Um deles chama-se Escape Games Portugal, funciona na plataforma Facebook e conta com 717 membros, parte deles donos de empresas da área. Quem administra a página é um grupo de quatro amigos entusiastas da modalidade, de Salvaterra de Magos. Já participaram em cerca de 40 jogos e percorreram todas as empresas atuais de jogos de fuga do país, conta Rosa Silva.
“O primeiro contacto foi por engano”, em 2017. Habituados a aventuras e experiências em grupo, compraram o bilhete para o primeiro jogo sem saberem do que se tratava. A página de Facebook surgiu depois de 12 jogos, com o objetivo de partilhar as experiências e opiniões dos jogos que iam fazendo.
O secretismo é um dos fatores fundamentais do jogo. Os pormenores não podem ser partilhados, o que explica, segundo Rosa Silva, que não haja um maior sentido de comunidade. O enredo é o segundo ponto destacado pela entusiasta e administradora da página de Escape Games. “Uma boa história é a que, ao entrar no jogo, nos faz esquecer da realidade.”
Antes da pandemia, Jorge Correia apontava para a existência de cerca de 50 empresas no país. Número que não consegue precisar atualmente devido aos vários encerramentos sem data prevista de reabertura. “Só em Lisboa, metade das empresas relacionadas com esta atividade faliu”, sentencia o dono da Puzzle Room.
A reinvenção ditada pela pandemia
Para fazer frente às dificuldades que as restrições sanitárias trouxeram, a Puzzle Room investiu no modelo digital. Durante os períodos de encerramento forçado, tiveram de procurar “formas de reinventar o conceito” e surgiram os Escape Games aplicados a atividades online. Jorge Correia faz um balanço positivo, até porque permite a realização de jogos sem constrangimentos geográficos.
Uma novidade que cruza ainda mais a realidade com o jogo está na DiverMinho, que apresenta este verão o Escape Game no Forte da Ínsua, em Moledo, Caminha. A aventura começa com uma viagem de barco. Depois, o objetivo é escapar resolvendo os enigmas, percorrendo e conhecendo as muralhas do forte. “Uma experiência holística e multissensorial”, garante a organização.
Já a Porto Exit Games lançou o novo jogo em parceria com o F. C. Porto, que “está a moldar o futuro do jogo em Portugal”, afirma Joaquim Valente. “Foi uma aposta arriscada, mas é uma atividade que promove o convívio e as pessoas sentem falta disso”, considera Thais Nomi, positiva quanto à recuperação do setor.
Neste jogo, não há público-alvo. “É como perguntarmos quem é que vai ao cinema. Toda a gente”, resume Jorge Correia. Desde os mais novos aos mais velhos, há experiências adaptadas a todos. Rosa Silva e o grupo de amigos já passaram o entusiasmo aos filhos. Joaquim Valente arrisca afirmar que “é o único jogo em que o neto joga de igual para igual com o avô”.