
Artigo de opinião de Carlos Jalali, professor de Ciência Política da Universidade de Aveiro.
Em janeiro de 1946, numa conferência, perguntaram a Albert Einstein porque é que a mente do ser humano, que podia chegar tão longe que conseguia descobrir a estrutura do átomo, era incapaz de conceber os meios políticos para controlar o poder atómico e garantir que este não extinguiria a Humanidade. Ao que Einstein terá respondido: “Caro amigo, isso é simples. É porque a política é mais difícil do que a física”. Passados 75 anos, o facto de a pandemia covid-19 continuar a ser um tema central para 2022 sugere que a política não é apenas mais difícil do que a física; também o é em relação à medicina.
Os meios médicos para conter a pandemia estão, em larga medida, desenvolvidos. A 31 de dezembro de 2020, a Organização Mundial da Saúde validava a primeira vacina contra a covid-19, suscitando a convicção de que o novo ano que se avizinhava traria o fim da pandemia. Um ano depois, terminamos 2021 com uma infeliz certeza: a pandemia prossegue.
O que falhou? Como diria Einstein, foi o mais difícil: a política. Contudo, não foi a política nacional dos diferentes Estados que falhou de forma fundamental. Em maior ou menor grau, estes têm procurado mitigar a situação sanitária e atenuar os seus efeitos sociais e económicos. Antes, o falhanço foi coletivo: derivou da ausência de coordenação e cooperação a nível global.
A ausência de coordenação política fez com que os Estados adotassem – e continuem a adotar – medidas de contenção (p.ex., confinamentos) de forma desarticulada uns dos outros. Desnecessário será dizer que as fronteiras não representam qualquer barreira contra o vírus. O confinamento pode temporariamente reduzir a incidência pandémica de um país. Mas é incapaz de resolver a pandemia enquanto o vírus circular noutros pontos deste Planeta comum.

(Foto: DR)
A falta de cooperação fez com que a vacinação procedesse de forma extremamente desigual a nível global. A título de exemplo: quase um ano depois da aprovação das vacinas, o maior país do continente africano tem apenas 1,9% da população com a vacinação completa. Resultado? A circulação do vírus e o fomentar de novas variantes, que põem em causa a própria eficácia das vacinas.
Na pandemia, e nos desafios económicos e sociais que esta gera, a resposta política requer compreender que o Planeta é uma casa comum, onde estamos todos interligados. Que somos “ondas de um só mar”: a visionária expressão proferida há mais cem anos por Abdu’l-Bahá e que foi relembrada no pico da pandemia quando acompanhou um carregamento de equipamento médico enviado a Itália.
Não é preciso ser Einstein para compreender isto. Mas, já agora, Einstein concordaria. Como escreveu em 1940, “estou convencido de que uma organização política internacional é não só possível como incondicionalmente necessária” para evitar que a “situação do nosso Planeta” se torne “insustentável”. Será 2022 o ano em que a política se torna capaz de responder aos desafios globais? Não será fácil. Mas não é impossível. E, ao contrário das leis físicas, a política depende de nós.
Este artigo de opinião é parte integrante de um trabalho publicado na edição impressa da Notícias Magazine, em que desafiámos vários pensadores, de diferentes áreas, a lançar o ano de 2022. Carlos Jalali abordou o ano que aí vem na perspetiva da Política.