É causada por uma deficiência na atividade de uma enzima, danifica tecidos e órgãos do corpo, pode progredir de forma silenciosa. Abril é o mês de sensibilização para esta patologia ainda sem cura.
É uma doença heterogénea, apresenta um espectro variável de gravidade e de progressão, habitualmente manifesta-se mais cedo e de forma mais severa nos homens do que nas mulheres. Pode apresentar sintomas a partir da infância, como episódios de dor intensa principalmente nas extremidades do corpo, nas mãos e nos pés, ou através de sintomas gastrointestinais, febres recorrentes e sem explicação, intolerância ao calor, aparecimento de pequenas lesões na pele de cor vermelha escura a arroxeada.
É uma patologia rara causada pela deficiência na atividade de uma enzima que existe no interior de um compartimento celular, designado lisossoma, que leva a uma acumulação de gorduras nos tecidos e órgãos. “Ao longo dos anos, afeta gradualmente a função de órgãos vitais e pode causar morte prematura ou morbilidade significativa, resultante de complicações renais (insuficiência renal), cardíacas (arritmias, angina, isquemia miocárdica, insuficiência cardíaca) ou cerebrovasculares (acidente vascular cerebral em idade jovem)”, adianta Luísa Pereira, internista e paliativista do Hospital CUF Tejo, coordenadora-adjunta do Núcleo de Estudos de Doenças Raras da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna.
A doença de Fabry foi descrita pela primeira vez em 1898. É hereditária com uma prevalência estimada de 1:3100 recém-nascidos do sexo masculino
O diagnóstico é difícil pelo número de órgãos que podem ser afetados e pela pouca especificidade da maioria dos sinais e sintomas. O padrão sintomático varia de doente para doente, mesmo dentro da mesma família. Segundo Luísa Pereira, “diversos trabalhos demonstram que o diagnóstico definitivo da doença de Fabry é feito, em média, 15 anos após o início dos sintomas.” Neste momento, não há cura para esta patologia.
Nas mulheres, o diagnóstico definitivo exige o estudo genético com identificação da mutação familiar específica no gene da α-galactosidase A, habitualmente em amostra de sangue. Nos homens, é pela determinação de atividade enzimática, numa amostra de sangue. No caso das mulheres, é necessário teste genético, para caracterização, no DNA, da mutação causal. A α-galactosidase é responsável pela degradação nos lisossomas das diferentes células do organismo, como por exemplo, nas células renais, do coração e dos vasos, nos neurónios, entre outras. “Este fenómeno cumulativo leva a um vasto leque de sintomas, que expressam a existência de doença sistémica, levando muitas vezes a graves manifestações e potencialmente à morte do doente”, adianta a especialista.
Falência renal, doença cardíaca E AVC são as principais causas de morte
Trata-se de uma doença genética, é transmitida de pais para filhos através do cromossoma X. Nesse sentido, salienta a internista, “é importante salientar que existe o risco de outros elementos da família serem doentes ou portadores da doença, devendo procurar-se aconselhamento especializado.” Os doentes devem ser referenciados para centros especializados, isto é, para centros de referência de doenças hereditárias do metabolismo ou de Doenças lisossomais de sobrecarga, onde estão equipas multidisciplinares com diferentes especialistas para cada etapa da doença.
Há dois tipos de tratamento específico para retardar ou prevenir uma possível lesão grave de um órgão: a terapêutica enzimática de substituição e a terapêutica com “chaperones” (proteínas) farmacológicos. E há ainda o tratamento sintomático que consiste na administração de fármacos não específicos para a doença, mas com atuação no alívio da dor, na proteção da função dos diferentes órgãos ou até na substituição da sua função (como por exemplo na insuficiência renal, a hemodiálise), entre outros.
As estratégias de tratamento devem ser definidas individualmente, tendo em atenção a idade do doente e a fase da doença
“Na ausência de tratamento, a expectativa de vida geralmente é reduzida em 20 anos em pessoas do sexo masculino e em 15 anos nos indivíduos do sexo feminino, comparativamente com a população em geral, com a morte a ocorrer usualmente devido a falência renal, doença cardíaca ou AVC”, sublinha a especialista.
Luísa Pereira adianta ainda que o prognóstico destes doentes tem vindo a melhorar nos últimos anos. Há maior disponibilidade de técnicas médicas avançadas, tais como a hemodiálise ou o transplante renal, bem como disponibilidade de terapêuticas específicas dirigidas à doença, que, sustenta, “modificaram de forma determinante o curso natural da doença, com significativa modificação na qualidade de vida dos doentes, diminuição de eventos clínicos graves, percebendo-se que o seu início precoce parece prevenir a lesão irreversível de órgão, podendo modificar o seu prognóstico a longo prazo.”