Carlos Moedas: o corredor de fundo

Carlos Moedas é o futuro presidente da Câmara Municipal de Lisboa

Apresenta-se no ponto de partida com “uma estratégia muito clara”, capaz de “grande persistência” e com fôlego para disputar, em caso de necessidade, um sprint final. Falta-lhe em carisma o que lhe sobra em empatia. E capacidade de diálogo. Até adversários extremados o reconhecem.

A surpresa serve-se fria, na última noite, quando o adversário se prepara para celebrar a vitória anunciada de sondagem em sondagem, ao longo de sete meses. De 25 de fevereiro a 26 de setembro de 2021, Carlos Moedas é o candidato vencido do PSD à Câmara Municipal de Lisboa, o adversário capaz, competente, mas sem hipótese de tirar a reeleição ao socialista Fernando Medina.

“O Carlos é um corredor de fundo”, lembra Isabel Mota. Alguém que se apresenta no ponto de partida com “uma estratégia muito clara”, capaz de “grande persistência” e com fôlego para disputar, em caso de necessidade, um sprint final. A presidente da Gulbenkian recorda o dia em que o amigo decidiu trocar a confortável cadeira que ocupava no governo da Fundação, e um futuro que pode trazer-lhe a presidência, para se pôr à prova. “Por um lado, fiquei triste, fazia-me falta, mas não pude deixar de lhe dizer que se tratava de uma decisão corajosa, muito corajosa.”

Moedas não é uma figura carismática. Demonstrou-o nos debates e na oratória. Falta-lhe o dom da palavra, a voz não ajuda. Mas ganha na rua, dizem os que o acompanham. “Em afabilidade, amabilidade e muita empatia”, garante Isabel Mota.

Palmilhou a cidade, sem trejeitos de enfado ou cansado, dizendo aos lisboetas que corria por gosto. Demonstrando “enorme disponibilidade para ouvir as pessoas”. Terá sido “um fator essencial da sua campanha e do sucesso eleitoral”, diz a amiga Isabel.

Capacidade reconhecida até por adversários e críticos extremados do Governo a que pertenceu como secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro Passos Coelho. Mesmo os que recordam que foi durante três anos um dos rostos da austeridade e da vontade política de ir “além da troika”.

“Enquanto comissário europeu procurou ouvir todas as partes e recolher o contributo de todos.” Marisa Matias lidou de perto com Carlos Moedas. O então comissário da Investigação, Ciência e Inovação (2014 a 20120), responsável pelo maior programa-quadro de sempre de investigação e inovação da UE, o Horizonte 2020, e por um orçamento de 80 mil milhões de euros, e a deputada europeia do Bloco de Esquerda participaram em várias negociações. “É muito fácil lidar com ele.” É certo que a lógica de Bruxelas é a lógica da negociação do diálogo. Porém, não deixa de ser relevante a afirmação da bloquista: “Em quatro anos de trabalho conjunto não tenho nada a apontar”. Resta saber se levará essa capacidade para a Câmara da capital, onde terá pela frente uma maioria de Esquerda. “Não esperem que seja desabrido ou perca a serenidade”, vai avisando Isabel Mota.

Manuela Ferreira Leite acredita na capacidade negocial de Moedas, parte integrante da personalidade do autarca eleito. Foi das poucas a crer na vitória. Na opinião da antiga líder do PSD e ex-ministra das Finanças, Moedas – “muito afável muito sereno, muito educado” – trouxe à campanha uma mais-valia fundamental: “Transmite competência e desprendimento relativamente a lugares, escolhendo dedicar-se, com gosto, ao serviço público”. Admite: “Pode não ter o carisma do político tradicional, um perfil ativo e agressivo”. Para concluir: “Na verdade, os portugueses estão fartos desses políticos”. Conhecem-se há muitos anos, trabalharam juntos. Recorda “um técnico extremamente competente, muito trabalhador, muito profundo nas análises que fazia”.

Foi Passos Coelho quem lançou este discreto poliglota, primeiro como secretário de Estado, depois como comissário europeu, cargo em que Moedas manteria colaboração estreita e amigável com o Governo de António Costa, que chegou a elogiar. Foi Passos Coelho quem aproveitou a apresentação do livro “Vento Suão: Portugal e a Europa”, de que é autor, para contar que a primeira escolha para o lugar europeu recaíra sobre Maria Luís Albuquerque. Apesar da estratégica campanha contar com o auxílio de vários passistas, notou-se a ausência de Passos Coelho. Ao contrário de Manuela Ferreira Leite, de Marques Mendes e de Pinto Balsemão, não se ouviu ao ex-primeiro-ministro uma declaração de apoio ao candidato.

Economista reconhecido, Carlos Moedas começou por seguir Engenharia Civil. Filho de um comunista alentejano, trocou Beja, a cidade em que nasceu e cresceu, pela capital. Tinha 18 anos. No Instituto Superior Técnico conheceu Pedro Couceiro, amigo que ficaria para a vida. “O Carlos passava grande parte dos dias em minha casa. Numa entrevista recente, recordou esses tempos e a minha mãe, o que me deixou comovido”, revela o piloto de automóveis, para quem o amigo “é uma pessoa de afetos”. Desses primeiros anos de convívio fala de “um rapaz muito pragmático, apostado em conhecer mundo”.

Quando Carlos Moedas foi desafiado para a corrida eleitoral, conversaram. “Demos um longo passeio. Falamos da vida, do futuro, mas uma coisa eu sabia: se ele avançasse, só terminaria a corrida quando a bandeira de xadrez baixasse. O Carlos é assim.”

Carlos Manuel Félix Moedas
Cargo:
futuro presidente da Câmara Municipal de Lisboa
Nascimento: 10/08/1970 (51 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Beja)