Cancro do colo do útero mata uma mulher por dia em Portugal

Esta é a Semana Europeia de Prevenção para o Cancro do Colo do Útero

Em 2020, foi o terceiro cancro mais frequente nas mulheres portuguesas com menos de 50 anos, tendo sido detetados 865 novos casos, 379 dos quais acabaram por ser fatais. Esta é a Semana Europeia de Prevenção para o Cancro do Colo do Útero. A vacinação e o rastreio são essenciais.

O cancro do colo do útero é causado por uma infeção persistente do vírus HPV (Vírus do Papiloma Humano) de alto risco. Numa fase inicial, não apresenta qualquer tipo de sintomatologia específica. Numa fase mais avançada, a doença pode manifestar-se através de vários sintomas como perda de sangue fora do período menstrual ou após relação sexual, corrimento vaginal anormal e com mau odor, dor pélvica, alterações urinárias e retais. Em Portugal, morre uma mulher por dia com este cancro.

Cerca de 75 a 80% das pessoas sexualmente ativas são infetadas pelo vírus HPV ao longo da vida. Os homens, mesmo não manifestando esta doença em específico, são um veículo de transmissão do vírus para as mulheres e passam a estar em risco de desenvolver outros cancros relacionados com o HPV, como os cancros da região anal, do pénis e da cabeça e do pescoço. A vacina é a melhor forma de prevenção, uma vez que evita a infeção do vírus e confere uma proteção estimada em 90%.

“Apesar dos avanços significativos no rastreio, diagnóstico e tratamento das lesões pré-malignas, os números de novos casos continuam a ser alarmantes, posicionando o cancro do colo do útero como o quarto tipo de cancro mais comum em mulheres em todo o Mundo, o sexto nas mulheres europeias e o terceiro mais comum nas mulheres portuguesas com menos de 50 anos”, adianta Amélia Oliveira Pedro, presidente da Secção Portuguesa de Colposcopia e Patologia do Trato Genital Inferior da Sociedade Portuguesa de Ginecologia.

O vírus infeta 75 a 80% das pessoas sexualmente ativas. O cancro do colo do útero manifesta-se, na grande maioria dos casos, após vários anos de infeção persistente

Há grandes disparidades, quer na Europa quer a nível mundial, na incidência, na atuação clínica e na mortalidade. Segundo a ginecologista e obstetra, em 2020, cerca de 604 mil mulheres foram diagnosticadas com este cancro em todo o Mundo e cerca de 341 mil morreram da doença. Em Portugal, no mesmo período, foram diagnosticados 865 casos com 379 mortes, o que corresponde a uma incidência de 16 novos casos por 100 mil mulheres.

“O Vírus do Papiloma Humano (HPV) é responsável por praticamente todos os casos de cancro do colo do útero, 90% dos cancros anais, 40% dos cancros da vulva, da vagina e do pénis e 12% dos cancros da orofaringe. É, por isso, considerado um carcinogéneo humano, mas a infeção raramente leva ao cancro. Isto, porque a maioria das infeções por HPV é eliminada espontaneamente e não causa sintomas.” No entanto, a especialista sublinha que a infeção persistente pode causar cancro do colo do útero, existindo um longo período de latência, que pode chegar aos 15 anos, entre a infeção pelo HPV e o cancro. Ou seja, há um período prolongado desde a infeção à apresentação de sintomas.

O HPV é a infeção sexualmente transmissível mais comum e as relações sexuais são a principal forma de transmissão, ou seja, pelo contacto com a mucosa genital. Neste sentido, os fatores de risco para a infeção são semelhantes aos das outras infeções sexualmente transmissíveis, como o início precoce da atividade sexual, número de parceiros sexuais, o comportamento sexual dos parceiros, imunossupressão, tabaco, contraceção hormonal e paridade.

Não fumar e usar sempre preservativo são dois comportamentos que contribuem para um menor risco de contrair o HPV

Esta é a Semana Europeia de Prevenção para o Cancro do Colo do Útero. Há estratégias de prevenção primária, a vacinação, e secundária, o rastreio. A primeira evita a infeção e, por sua vez, o aparecimento da doença. A segunda evita que uma lesão já existente progrida para cancro.

Neste momento, em Portugal, o programa de rastreio do cancro do colo do útero destina-se à população do sexo feminino com idade igual ou superior a 25 anos e igual ou inferior a 60 anos. O teste primário é a pesquisa dos HPV de alto risco, em citologia vaginal, a realizar de cinco em cinco anos. “A presença de sinais ou sintomas ginecológicos, como, por exemplo, sangramentos vaginais anormais, dispareunia ou outros, justificam observação fora do âmbito do programa de rastreio e devem ser encaminhadas para consulta externa”, adianta Amélia Oliveira Pedro.

Neste período complexo devido à covid-19, o rastreio da doença oncológica, segundo a especialista, “tem vindo a falhar pela grande diminuição de consultas e, consequentemente, pela redução dos exames de rastreio e de diagnóstico precoce que permitem detetar o cancro e a doença pré-maligna.” Os primeiros meses da pandemia tiveram um impacto bastante negativo no diagnóstico atempado de muitos doentes com cancro, levando ao adiamento de tratamentos e ao cancelamento de cirurgias.

Mais de 90% das mulheres até aos 27 anos, completados em 2019, estão vacinadas contra o HPV

“De acordo com a estimativa da Liga Portuguesa Contra o Cancro, nos últimos dez meses, e devido ao contexto atual de pandemia, perto de mil novos casos de cancro da mama, colo do útero e colorretal não foram diagnosticados”, revela.

A ginecologista e obstetra realça a importância de manter a vigilância periódica em ginecologia, sem receios, bem como a urgência de retomar o normal funcionamento do esquema de vacinação preconizado no Plano Nacional de Vacinação (PNV) com a vacina nonavalente contra o HPV, a cargo do Serviço Nacional de Saúde e dos centros de saúde.

Em setembro de 2020, esta vacina, que era até então direcionada apenas para as raparigas, foi alargada aos rapazes. “Uma decisão importante para a imunidade de grupo que contribui, a longo prazo, para a redução da circulação do vírus e para a diminuição das infeções.” “No entanto, apesar de serem decisões importantes que posicionam Portugal como um exemplo a nível mundial, a sua eficácia depende da ação de todos os portugueses, isto é, da taxa de cobertura da vacinação nas crianças com dez anos”, observa Amélia Oliveira Pedro.