É um dia com má fama. Compreender o que leva algumas pessoas a detestá-las e, por antecipação, também os domingos é meio caminho para contornar as “monday blues” e ter melhores experiências com o arranque da semana.
Os domingos de infância de Aline Denise Maia, 47 anos, trazem memórias associadas a mimo, angústia e tristeza, sobretudo depois do almoço. O peso da responsabilidade de cumprir tarefas escolares e a angústia do afastamento dos seus pais tornavam este dia da semana mais difícil de ultrapassar. “À noite, tudo se agravava. A dificuldade em adormecer era muita, o adiar a hora de deitar era uma constante, pois era nesse momento que os medos vinham ao de cima”, confessa. Lembra-se de ter medo do escuro até tarde e de a irmã ser o seu porto de abrigo. “Tenho ideia de que esta angústia só começou a ficar mais ténue na altura da faculdade, mas, mesmo assim, ainda hoje, ao domingo a meio da tarde, faço questão de estar em casa e de me organizar, nem que seja mentalmente, para o início da semana.”
Para a nutricionista, o facto de se sentir pouco autónoma no que diz respeito aos horários de trabalho conduzem-na a um sentimento de culpa permanente. “Sou perfeccionista, exijo muito de mim e não me permito errar”, admite. É comum acordar ao domingo com o pensamento de que é o último dia do fim da semana e não consegue passar as horas seguintes descansada, acabando por condicionar a sua rotina às exigências das segundas-feiras. “Após o pequeno-almoço, começo logo a organizar as lancheiras, a minha, a do meu marido e da minha filha, para o dia seguinte. Preparo as mochilas, os sacos do desporto e coloco tudo no hall de entrada para que não haja esquecimentos.” E é nesta luta contra o tempo que vive. Agarrada ao relógio de forma a conseguir realizar todas as tarefas atempadamente. “Nunca me sinto totalmente disponível e entusiasmada.”
Andreia Azevedo Moreira, 42 anos, agradece o facto de morar ao pé da praia para ter estratégias que lhe permitem encarar as segundas-feiras com outro ânimo. Mas isto de não gostar dos domingos surgiu com a pandemia porque, até então, era o dia a que associava aos lanches em família, algumas vezes, em casa de uma tia-avó muito próxima. Aproveita todos os minutos antes de se deitar. “As segundas já eram outra conversa. A manhã era sempre mais lenta e o dia, no geral, menos produtivo. Como se demorasse a habituar o corpo e a mente à ideia de já tinha acabado a libertação que o fim de semana permite.” O verdadeiro tormento instalou-se com o primeiro confinamento. “Segunda-feira passou a ser sinónimo de teletrabalho, telescola e quatro pessoas permanentemente encerradas, com múltiplos afazeres, num T2 sem varanda, sem escape, sem escolha, sem ar.”
Rapidamente se instalou na vida de Andreia aquilo a que intitula de “cansaço crónico” e um desânimo, a cada início da semana, difícil de contrariar. “Quando o despertador toca à segunda-feira, raramente me apetece sair da cama.” Mesmo agora, com os dois filhos Tiago e Gonçalo, de dez e oito anos, na escola, esta impressão crónica, “quase dolorosa”, colou-se à sua pele.
Que as segundas-feiras têm uma má fama já não é novidade. E não é apenas o Garfield a afirmar com todas as letras o quanto as odeia. É comum ouvirmos comentários depreciativos sobre o primeiro dia útil da semana, mas existem explicações especializadas para este sentimento. “Para muitas pessoas, a segunda-feira marca o fim de dois dias de descanso e o regresso ao trabalho, o que significa uma mudança de ritmo. Somam-se tarefas estruturadas em que o sentimento de responsabilidade predomina, em comparação com o fim de semana, onde a espontaneidade e o lazer prevalecem”, enquadra Filipa Jardim da Silva, psicóloga clínica e da saúde. A chamada “depressão das segundas-feiras” deve-se ao facto de ser um dia de transição em que as rotinas de deitar e de acordar, com horários mais rígidos, acabam por contrastar com a calma vivenciada ao fim de semana. “Esta sensação torna-se preocupante e patológica quando a funcionalidade diária se perde, quando surgem comportamentos de evitamento deste dia da semana e expressões somáticas de elevados níveis de ansiedade na transição entre fim de semana e semana.”
Voltar a um trabalho que não se gosta
As pessoas que mais antecipam – com resistência – o início da semana tendem a condicionar todo o domingo e a viver aquilo a que a psicóloga intitula de ansiedade antecipatória. “Quando esta aversão à segunda-feira é tão intensa, é importante refletir sobre o que torna a nossa semana tão pesada e desagradável em comparação com o fim de semana.” A transição entre dias de descanso e de trabalho é menos suave quando não se gosta da profissão, por exemplo. “Para mudar o nosso paradigma em relação aos dias da semana e à segunda-feira em particular, pode ser necessário fazer mudanças estruturais na nossa rotina semanal e nas nossas atividades”, sugere Filipa Jardim da Silva.
Também Bárbara Cacho Tavares, positive coach e pós-graduada em Gestão de Recursos Humanos e em Psicologia Positiva, considera que há determinadas fases da vida em que “sentimos a obrigação de desempenhar tarefas que geram insatisfação laboral, frustração e estagnação ou somos alvo de incompetência profissional”, em que o ambiente e “o relacionamento com superior hierárquicos e/ou colegas não é construtivo, gerando conflito e incompatibilidade”, a que se somam “a necessidade de enfrentar horas de trânsito, uma alimentação incorreta, noites sem dormir”. Destas sensações a uma posição de luta pela sobrevivência vai um pequeno passo, acrescenta.
Maria Luísa (nome fictício) tem 48 anos e está desempregada há dois meses. De há uns anos para cá, os domingos eram um verdadeiro suplício, com dores de estômago, ansiedade, taquicardia e dores de garganta. Aos sintomas físicos somou-se um outro problema: burnout. Para a técnica administrativa, que chegou a ter ataques de pânico, não eram as funções que a inquietavam, mas o ambiente de trabalho pouco favorável e tranquilo. “As relações interpessoais, sobretudo com a minha chefia, não eram as melhores.” A sensibilidade extrema agravou-se a ponto de ser preciso recorrer a apoio psicológico e a medicação.
As situações de desemprego podem trazer um outro desafio às segundas-feiras. Não foi o caso de Maria Luísa que passou a apreciar os domingos como há muito não acontecia. “Estar desempregada trouxe-me alívio, pois já não antecipo o regresso ao trabalho que era algo muito complicado. O facto de saber que não vou voltar para aquele local tira-me 95% do peso que sentia e dos sintomas que tinha.” Atualmente, aproveita para apostar na formação na área de marketing digital que poderá vir a ser útil num projeto futuro que gostaria de concretizar.
Para outras pessoas, o desemprego confere um peso acrescido às segundas-feiras. “Podem ser igualmente avassaladoras pelo vazio que representam, a insegurança, o medo de não encontrar trabalho, a solidão e até falta de apoio familiar e social, o que aumenta o nível de ansiedade, depressão e as temidas consequências económicas que naturalmente abalam o bem-estar do próprio e dos que o rodeiam”, define Bárbara Tavares.
Rotinas e estratégias para preparar a semana
Filipa Jardim da Silva explica que o tema das “mondays blues” ou a depressão de segunda-feira pode ser a alavanca necessária para explorar em consultas um melhor autoconhecimento dos pacientes. “Procuramos investigar o que poderá estar a comunicar este sentimento, exploram-se rotinas, ritmos e hábitos, analisa-se o grau de satisfação com o trabalho, e reflete-se sobre o que pode contribuir para um maior equilíbrio entre vida pessoal e profissional, entre outros aspetos.”
Existem rotinas que se podem implementar para que as segundas-feiras não sejam um drama e passem a ser vivenciadas com maior leveza. Aline Maia desenvolve algumas atividades para ocupar os domingos. Considera-se uma pessoa de rotinas e muito organizada e aproveita para preparar a semana, para cozinhar vários pratos para a semana, verificar se as tarefas escolares da filha Mia, de oito anos, foram realizadas, dar seguimento aos emails em atraso, preparar a roupa para o dia seguinte, entre outros afazeres.
Desde que aliviaram as medidas relativas à pandemia de covid-19, Andreia Moreira passou a tentar contrariar a falta de vontade no início da semana e adotou algumas estratégias como, por exemplo, colocar o alarme do despertador para mais cedo para poder realizar, antes do início da jornada contínua em teletrabalho, atividades que lhe deem prazer e ânimo para começar o dia. “Leio algumas páginas de um livro ou sigo para a praia que fica a cinco minutos de carro, descalço-me e vou até à areia. Não há dia que custe a começar depois de mergulhar os pés no Atlântico.”