Tiroide: a glândula que regula o organismo

A tiroide equilibra o corpo, mas nem sempre funciona como devia. Um nódulo no pescoço é um sinal.

Maria da Piedade Torres descobriu a doença por ironia do acaso. “Tinha uma tosse irritante e seca”, recorda. O otorrino analisou a situação, não havia razão para aquela tosse que persistia, pediu uma ecografia à zona da garganta. O exame detetou nódulos na tiroide, era preciso ver o que se passava com um especialista no assunto. Não esperou muito. “Sou de resolver as coisas, não valia a pena fazer de conta. Se tenho uma dúvida, tenho de confirmar.”

Três dias depois, o médico comunicava-lhe que tinha um carcinoma papilar, um dos tipos de cancro da tiroide. Ficou assustada, angustiada, a palavra cancro é sempre difícil de assimilar. Pelo caminho, percebeu-se que a tosse que sentia era afinal uma reação alérgica a um medicamento que andava a tomar. Nada tinha a ver com a tiroide. “Não tive, portanto, qualquer sintoma de que estava com um carcinoma. Ainda bem que o problema foi detetado a tempo.”

Os nódulos estavam só de um lado, o médico explicou que a tendência era para que se desenvolvessem, a cirurgia era a melhor opção. “Se assim era, então que rapassem tudo de uma vez.” Quinze dias depois, Maria da Piedade estava na sala de operações, ficou dois dias internada, veio para casa. “Nas duas semanas até à operação, aquele friozinho na barriga”, admite. Recuperou bem, fez três sessões de iodo radioativo.

Tinha 60 anos, hoje tem 73, está reformada da área comercial. Nasceu no Barreiro, agora vive em Felgueiras. Na altura, não fazia a mínima ideia do poder da tiroide. “Não imaginava a sua gestão de equilíbrio de uma série de funções no organismo”, conta. Treze anos depois, toma um comprimido por dia e faz controlos da tiroide de seis em seis meses.

A tiroide é uma glândula única que produz duas hormonas que, quando são libertadas, atuam em quase todas as células do organismo. Está localizada na base do pescoço, abaixo da laringe, da conhecida maçã de Adão, reveste a maior parte da traqueia, e pesa entre 15 e 25 gramas no adulto.

“A tiroide atua no crescimento de crianças e adolescentes. Regula os ciclos menstruais. Influencia o peso. Regula a frequência cardíaca e o funcionamento do intestino”, explica a endocrinologista Inês Sapinho
(Foto: DR)

A sua forma assemelha-se a uma borboleta por ser constituída por dois lobos laterais. E influencia todo o nosso organismo. “Atua diretamente no crescimento e desenvolvimento de crianças e adolescentes. Regula os ciclos menstruais e a fertilidade. Influencia o nosso peso. Atua na memória, na concentração, no humor e no controlo emocional. Regula a frequência cardíaca, a respiratória, a pressão arterial e o funcionamento do intestino”, especifica Inês Sapinho, médica endocrinologista, autora do livro “Os segredos da sua tiroide”, que integra o Grupo de Estudos da Tiroide da Sociedade Portuguesa de Diabetes e Metabolismo.

Pele seca, fraqueza muscular

As doenças da tiroide afetam mais de um milhão de portugueses e 300 milhões de pessoas em todo o Mundo. A 24 de setembro assinala-se o Dia de Sensibilização do Cancro da Tiroide. Este tumor maligno da glândula tiroideia surge habitualmente sob a forma de um nódulo, quase sempre sem dor. Todos os anos, afeta 400 portugueses, é mais comum entre os 25 e os 65 anos, e é cerca de três vezes mais preponderante no sexo feminino.

À volta de 5% dos portugueses têm nódulos na tiroide, e apenas 10% dos quais são malignos. A maior parte não é visível nem palpável. O cancro da tiroide pode ser completamente assintomático, segundo Maria João Oliveira, endocrinologista, diretora do serviço do Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho, membro do conselho consultivo da Associação das Doenças da Tiroide. “Contudo, o aparecimento de uma tumefação (inchaço) na parte anterior ou lateral do pescoço, de crescimento rápido, dura e pouco móvel, pode ser o primeiro sinal de cancro da tiroide”, avisa. Mais ainda se houver rouquidão ou dificuldades em engolir.

A causa exata não é conhecida. “O cancro da tiroide ocorre quando uma das suas células sofre uma alteração genética. Esta mutação vai permitir que a célula cresça e se multiplique rapidamente. A célula também perde a capacidade de morrer, como as células normais. A acumulação destas células alteradas constitui o tumor”, resume Inês Sapinho. “Ter fator de risco não significa que se desenvolva cancro da tiroide e algumas pessoas desenvolvem a doença sem terem nenhum fator de risco”, acrescenta.

“O aparecimento de uma tumefação no pescoço, de crescimento rápido, pode ser o primeiro sinal de cancro da tiroide”, reconhece a endocrinologista Maria João Oliveira
(Foto: DR)

A disfunção da tiroide tem os seus sinais, mesmo que subterrâneos. Se a produção de hormonas pela tiroide for insuficiente, o metabolismo desacelera, o hipotiroidismo manifesta-se. Se houver excesso de produção, o metabolismo acelera, e o hipertiroidismo é detetado. “À medida que o corpo começa a funcionar a um ritmo mais lento surge o cansaço, maior sensibilidade ao frio, queda de cabelo, pele seca e descamativa, aumento de peso, edemas, fraqueza muscular, obstipação, depressão e perda de memória”, enumera Maria João Oliveira. Por vezes, o quadro é confundido com uma depressão. “Nas crianças, há geralmente uma desaceleração no crescimento, um atraso de desenvolvimento e podem surgir dificuldades de concentração e aprendizagem”, refere a endocrinologista.

O diagnóstico é fácil: palpação da tiroide, ecografia para detetar e caracterizar os nódulos. O tratamento inicial é cirúrgico para a retirada da totalidade ou parte da glândula. A maioria dos cancros da tiroide são tratáveis, mais de 80% curam após o primeiro tratamento, e a mortalidade é muito baixa.

Sintomas

  • Dor de garganta que não passa e dificuldade em engolir ou em respirar.
  • Cansaço sem muitos esforços e taquicardia. Palpitações com o batimento acelerado do coração. Fadiga constante sem motivo aparente.
  • Nervosismo, ansiedade, irritabilidade. O metabolismo do organismo aumenta e provoca essas sensações.
  • Ganho ou perda de peso sem explicação aparente. Essa oscilação na balança implica que as hormonas da tiroide sejam avaliadas.
  • Dores e cãibras musculares. Sintomas do hipotiroidismo que provoca uma sensação de formigueiro no corpo.
  • Raciocínio lento e perda de memória. O metabolismo do sistema nervoso e dos músculos diminui e pode provocar também tristeza e depressão. A redução da atividade metabólica pode provocar irregularidades menstruais e prisão de ventre.
  • Aumento do volume da tiroide, presença de nódulos. Inflamação por carência de iodo na alimentação.
  • Colesterol elevado. Níveis reduzidos de hormonas aumentam o colesterol mau e podem aumentar os níveis de triglicéridos.
  • Distúrbios digestivos, como a diarreia inexplicável.