Filha de militar, foi aluna do Instituto de Odivelas. Muito organizada, gosta do verbo “rasgar”. De “luz e de água”. Não prescinde de um lápis. Aponta e guarda os “pensamentos soltos”. Adora Coca-Cola e amendoins. Em 74 anos de existência da Cáritas Portuguesa, é a segunda mulher na cadeira da presidência.
Deixa uma primeira impressão de pessoa afetiva, que gosta de ouvir. “Sou melhor ouvinte do que falante”, reforça. As notas escolares permitiam a entrada em qualquer curso, mas Rita Valadas seguiu o chamamento do serviço social, “espécie de sociologia aplicada, com o objetivo de melhorar a vida das pessoas, intervindo no indivíduo, no grupo e na comunidade”. É, portanto, uma “mulher do terreno”.
O primeiro trabalho, no início dos anos 1980, levou a recém-formada à península de Setúbal, epicentro de uma crise severa que levou a classe média à pobreza. Daí, seguiu para a Misericórdia de Lisboa e para um novo projeto, dedicado à transformação da zona de Chelas, tempos de “aprendizagem fantástica”.
Vocacionada para “melhorar a vida das pessoas”, é avessa, porém, à política partidária. “Afugenta-me”, diz. Por isso, quando foi convidada para integrar gabinetes ministeriais, como técnica, respondeu “nem pensar”, decisão que a conselho amigo tomaria. A conselheira chama-se Paula Guimarães. Levam 30 anos de amizade. “Se recusarmos esses desafios, não podemos depois reclamar”, disse-lhe na altura.
“Na área da ação social, concretamente na área da ação social da igreja, sente-se um peixe na água”, começa por referir António Bagão Félix. O antigo ministro do Emprego e da Segurança Social contou com o apoio técnico de Rita Valadas. “É discreta, não reivindica protagonismo e quer saber sempre mais”, características que considera fundamentais numa profissão que exige mundividência.
Teresa Caeiro, ex-secretária de Estado da Segurança Social, salienta “a generosidade”. A capacidade de trabalho. “A Rita chega a tudo. Trabalha em várias coisas ao mesmo tempo, sempre com grande capacidade mobilizadora.” Paula Guimarães repisa esse aspeto da personalidade da amiga: “Empodera os que a rodeiam. De tal maneira que sentimos que vale a pena estarmos ao lado dela”. Lembra uma técnica “que foge à visão caritativa e assistencialista da intervenção social”. Uma amiga “sempre atenta e disponível a qualquer hora”. Trabalharam juntas na Misericórdia. “A Rita foi a única dirigente que pintou o gabinete. E a única que levava o filho bebé, tantas vezes deitado em cima da secretária.”
Usa o silêncio para se ouvir melhor e aos outros. “O silêncio restaura-me.” Gosta de “luz e água”. Da madrugada e do entardecer. Nada diariamente. Não deixa pendentes para o dia seguinte. Filha de militar, foi aluna do Instituto de Odivelas. Aí completou o 12.º ano, aí aprendeu, realça, “o valor e o exercício da amizade”. A tomar conta de si. Adolescente “serena”, estudante muito aplicada e participante ativa nas festas de garagem organizadas pelo irmão gémeo nos fins de semana, recorda a “educação completa” que incluía “costura, bordados e caligrafia”. Não que aprecie lavores. “Mas gosto de cozinha.” Ainda que lá em casa todos pratiquem, sobretudo os dois filhos, os dotes de Rita são apreciados. Tem por palavra-chave “rasgar, no sentido de abrir”, explica. Gosta de avaliar contraditórios, o que está visível e o que está escondido. Não prescinde de um lápis. Aponta e guarda os “pensamentos soltos”. Pecados? Coca-Cola – “durante anos foi o meu pequeno-almoço” – e amendoins ao serão. A nova presidente da Cáritas Portuguesa conhece os cantos à casa, mas nem por isso esperava o convite. “Habituei-me a pensar que era lugar para um homem.” Em 74 anos da instituição, é a segunda mulher na cadeira da presidência.
Rita Isabel Morais Tomaz Valadas Pereira Marques
Cargo: presidente da Cáritas Portuguesa
Nascimento: 26/02/1963 (57 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Lisboa)