Pires de Lima: o risco e a insatisfação

Pires de Lima é presidente executivo da Brisa (Ilustração: Mafalda Neves)

Adolescente triste e solitário, assumiu aos 15 anos que não seguiria Direito, a tradição familiar. “Não deixes para a outra vida o que pode fazer nesta” é um dos lemas de vida que o novo presidente executivo da Brisa procura cumprir.

Não sabe viver no meio do muro. Personalidade complexa, contraditória, de extremos que nem sempre se temperam, Pires de Lima não teme dobrar a esquina. “O António são dois”, resume a amiga Helena Forjaz. Duas pessoas, muitas vezes à vez. “Profissionalmente muito sensato, na vida pessoal é emocionalmente excessivo.” Numa frase, “o Tó é uma estrela errática nem sempre consensual”, frisa.

“A vida dele não é nada linear, certinha, direitinha”, descreve António Lobo Xavier, primo afastado e amigo. Reconhece a dualidade. “O António é alegre e explosivo. E é recolhido, reflexivo e triste”, exemplifica. Gestor “único, sensato e constante”. E pessoa de risco, sem carreira pré-configurada, que muda de vida sempre que insatisfeito. “Um homem de contradições no olhar dos outros”, admite o próprio Pires de Lima. Não discorda. “A excessiva previsibilidade tem em mim um efeito depressivo e a surpresa ou falta de controle irritam-me.” Muito disciplinado nas empresas é “desabrido fora delas”, diz. Entre os seus, “não tem filtro”. É um amigo “leal, mas impaciente”. Solidário, mas suficientemente independente para, quando dedicado a uma causa, desiludir alguns.

Helena Forjaz conheceu-o no primeiro ano da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Lembra um rapaz “antipático, muito inteligente, personalidade muito complexa e muito intuitiva”. Difícil de convencer e de satisfazer. “Dele gosta-se porque sim.” Paulo Portas, amigo de infância – conheceram-se no Colégio São João de Brito -, elogia o “caráter à prova de bala e o amigo fora de série”. “Um gestor entre os melhores”, um decisor “pragmático e rápido”. Acrescenta: “Num país pouco habituado a pessoas frontais, o António tem superavit de frontalidade”. Que assumiu aos 15 anos, anunciando que não seguiria Direito, a tradição familiar. “O meu pai e o meu avô são as minhas referências masculinas, mas pensando bem passei a vida a fazer escolhas diferentes.”

Quinze anos. “Era tímido, triste, solitário.” A adolescência sofrida marcar-lhe-ia para sempre a personalidade. “Adolescência pouco vivida, rebeldia toda a vida”, afirma. Daí “a sede de entusiasmo, de um motivo, de mudança”. Nas empresas e na vida pessoal – “Já levo dois divórcios” – precisa de um motivo para continuar. “Preciso de me sentir vivo.” Católico “não especialmente praticante”, professa o lema “não deixes para a outra vida o que pode fazer nesta”. Por isso, opõe a solitude noctívaga, na companhia de um charuto, “longe de tudo”, a gargalhada rara. “É absolutamente única. Traduz a sua forma de viver”, define Helena Forjaz. “Pode ser surpreendente e agitar uma sala”, salienta Lobo Xavier. “O António é muito inteligente, muito rápido, muito divertido. Se bem-disposto, faz uma noite.” Mas pode ter tiradas desagradáveis. “Socialmente é preciso aprender a gostar dele. Na profissão, onde é único, deixa logo os gestores muito bem impressionados.” Gosta que gostem dele, naturalmente. Mas não evita o contrário. Foi assim no último congresso do CDS, o partido de que é militante. As palavras duras e diretas dirigidas a Francisco Rodrigues dos Santos foram recebidas com vaias. Registou. A política permitiu-lhe sair da “zona de conforto”. “Achava que a minha vida não se devia limitar às empresas e a criar valor para os acionistas.” Convidado para ministro da Economia em 2013, aceitou “da noite para o dia”.

Não é homem de palácios e alcatifas, dizem dele. “Em muita coisa é até frugal”, garante Lobo Xavier. “Tenho grande resiliência ao desconforto.” Se pensa nele é por causa das filhas. De todos os discursos que fez nenhum foi maior e mais querido do que o proferido há dois meses, no casamento de uma delas. São cinco. “Cinco filhas e a minha mãe. Vivo rodeado de mulheres.” Sorri. “Um bocado egocêntrico”, reconhece. Interessa-o a arte, a música – da clássica aos Arcade Fire -, o golfe. É do Sporting e do CDS, “o que hoje em dia não é fácil”. Talvez, “lá para os 70 anos”, regresse à política ativa. Pouco centrista, nunca no meio do muro.

António de Magalhães Pires de Lima
Cargo:
presidente executivo da Brisa
Nascimento: 07/04/1962 (58 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Lisboa)