Manual de instruções para curar os excessos

Não vale a pena, o Natal é sinónimo de exageros. Muito álcool e fartos manjares. As consequências são inevitáveis, mas a farmácia contornável. Um chef, um barman e uma nutricionista dão alternativas caseiras.

Viva a festa. E os encontros com os amigos, muito próprios da época. Viva a família reunida na ceia de Natal. Vivam os jantares fartos. Regados com bom vinho. Ou champanhe. Talvez haja cerveja antes e licor no fim. E bagaço. Da terra, que esse é que é bom. Vivam os dias em que se come de tudo. Na cidade e na aldeia. Bacalhau, polvo e cabrito. Aletria, rabanadas e leite-creme.

E quando o frenesim acalma – pelo menos até à passagem de ano – o corpo dá sinais de vida. Ou de quase morte (brinquemos). Mas que se ressente, ressente. A intoxicação é grande. Abusamos nas quantidades de bebidas e comidas, ricas em calorias e gorduras. Ficamos desidratados e com a cabeça a latejar por conta do álcool. Inchados, enfartados, empanturrados. De tudo. Por isso, há dicas que vêm a calhar. E mitos a evitar. Para ajudar temos um prato sugerido por um chef, uma bebida por um barman e os conselhos de uma nutricionista. Receitas caseiras para quem quer evitar uma ida à farmácia.

“Peixe a vapor ou cozido com água e algas com molho de plâncton”
Rui Paula
Chef

Antes de mais esqueça o “beber mais cura a ressaca”. A não ser que esteja a falar de água. Isto porque ingerir álcool em cima de álcool apenas vai mascarar os sintomas. Ou atrasar o inevitável: uma ressaca ainda pior. Cristina Teixeira, chefe do serviço de nutrição do Hospital de S. João, no Porto, explica: “Os sintomas da ressaca sentem-se entre 12 e 14 horas após o último consumo”. Nessa altura, ficam no organismo as toxinas resultantes do processo de assimilação do álcool.

“O mal-estar aparece quando o fígado não consegue concluir o processo de metabolização. Daí as náuseas e as dores de cabeça.” Portanto, se depois da primeira ressaca continuar a beber, haverá uma altura em que vai ter de parar. E os sintomas irão massacrá-lo. Não há uma cura milagrosa, mas é possível atenuar as consequências de se ter bebido demais. “Por exemplo, preventivamente, pode tomar-se um copo de água hora a hora, intercalando as bebidas.” Mas, se não acontecer, no dia seguinte há solução.

João Freitas, responsável pela comida e bebida do Vogue Café, sugere um sumo detox de framboesa e chá verde, que está aliás na carta do estabelecimento portuense, pensado para os dias de excessos. Mas quem não o conseguir experimentar no Vogue Café pode facilmente replicá-lo em casa. “É uma receita rápida e simples. Com ingredientes leves e dietéticos, ideais para desintoxicar das muitas coisas boas a que não resistimos.”

O cesto de compras é pequeno: framboesas “frescas, não as congeladas”, chá verde e iogurte grego light, “que mantém o sabor mas sem gordura”. Preparar a poção mágica leva apenas uns minutos. Numa liquidificadora, misturar as framboesas lavadas com o iogurte grego. As quantidades vão obviamente depender do número de consumidores. À parte, preparar o chá verde que deve ferver e depois arrefecer. Quando isso acontecer, junte-o à primeira mistura. A consistência, mais ou menos cremosa, fica a gosto. Mas o ideal é ser servido com gelo.

“Hidratar e comer frutas e verduras”
Cristina Teixeira
Nutricionista

“Este detox vai ajudar a manter a sensação doce do espírito natalício, com muito menos açúcar.” Atenção, só recomendável a partir de dia 26, “quando todas as asneiras já foram cometidas e estamos realmente prontos para desacelerar a gula”, sugere João Freitas.

O iogurte e as frutas são de facto um aliado no pós exageros, refere Cristina Teixeira. Ajudam, entre outras coisas, a repor o magnésio e o potássio. A laranja e o tomate, por exemplo, vão fornecer vitamina C, ajudando o fígado a digerir o álcool. “Funcionam como antioxidante para fígado, são ótimos desintoxicantes.” Outra dica importante, aliás, fundamental, é a ingestão de água. Ou chás e tisanas.

“Sem estimulantes porque o objetivo é descansar.” Aconselham-se lúcia-lima, chá de camomila, infusões de ervas (sem cafeína, reforça a especialista). Os hidratos de carbono também são recomendados. E a diminuição de sal. “Cereais e pão integral. Arroz branco. Vão ajudar a repor os níveis de glicose.” E, por último, Cristina Teixeira incentiva a abusar das verduras. “Sem gordura. Aproveitar a nossa cultura e jantar apenas uma sopa, por exemplo.”

“Detox de framboesa e chá verde é rápido e simples”
João Freitas
Barman

Ou um peixe cozido com legumes, sugere o chef Rui Paula. Melhor, “peixe a vapor ou cozido com água e algas com molho de plâncton. Em alternativa, um prato vegetariano”. Serve o propósito. “É um prato leve, mas que satisfaz e que ajuda a desenjoar.” Principalmente dos doces. “Qualquer pessoa o consegue cozinhar. A cozedura depende da altura do peixe. Porém, em meia hora está pronto.” Uma sugestão com variações. “Em vez das algas podem ser legumes. Basta cozê-los e depois arrefecê-los em gelo, para manterem as propriedades. Saltear com um fio de azeite e sal.” Mais nada.

“Podem ser couve-coração, cenoura, brócolos, couve-flor. Ou só feijão-verde. Eu como isso muitas vezes. E então nesta altura, em que também aproveito para experimentar de tudo, cai bem. É prático de fazer. Já se sabe, se abusamos depois temos de fazer regime. E esta é uma boa opção.”

Cristina Teixeira desaconselha sentimentos de culpa. Resistir a tantas delícias seria quase pecado. Mas antes de terminar a conversa resume a informação. “A mensagem é simples: hidratar e comer muitas frutas e verduras.” Anotou? Boas festas.