Graça Freitas: a médica que coleciona orquídeas

Graça Freitas nasceu no Huambo, em Angola, em 1957 (Foto: Tiago Petinga/Lusa)

Não se imagina sem livros nem plantas. “As páginas mais bonitas que já li”, diz, foram escritas por V.S. Naipaul em “Uma Casa para o Sr. Biswas” (“A House for Mr. Biswas”, 1961), tinha ela quatro anos. Pouco depois, aprenderia a ler. “Tudo, devorava tudo”, conta, recordando um dos grandes prazeres de infância.

Tivesse a família terras e teria seguido outra paixão: a agricultura. À falta de terreno extenso, dedica-se a jardins caseiros, camélias e orquídeas, as favoritas, que a levam pelo Mundo à procura dos melhores parques botânicos e estufas. “Vi em Washington a mais magnífica coleção de orquídeas”, salienta, com entusiasmo.

De si, afirma não ser “nem perfeita nem santa”. De resto, define-se em duas palavras: “Absolutamente normal”. Discordam amigos e subordinados. Graça Freitas convoca elogios. “Interessada, aplicada, estudiosa, rigorosa.” E, é raro, “humilde”. Foi Jorge Torgal quem a convidou para a Direção-Geral da Saúde (DGS) em 1996. Médico e professor catedrático jubilado, recorda: “Começou por recusar porque tinha outras propostas profissionais. Bem a avisei: ‘olha que há propostas que falham’. Meses depois bateu à porta a perguntar se o lugar ainda estava vago, com extraordinária humildade”. Estava, claro. Trabalhava então no Centro de Saúde da Ajuda, depois da formação em Santa Maria e oito meses de Saúde Pública em Ponte de Sôr. Na Travessa das Florindas, 5, avisava: “Vou ali em comissão de serviço durante três anos e logo volto”. Não voltaria. “Depressa se tornou uma colaboradora ideal”, conta Jorge Torgal. Que o diga também Francisco George, ex-diretor-geral, que teve em Graça Freitas, diz Torgal, “o braço direito e o esquerdo”. Sem a exuberância comunicacional do antecessor, “a Graça é igualmente eficaz e muito mais tranquila”.

Nasceu no Huambo, Angola. Iniciou o curso na Faculdade de Medicina de Luanda. Não se lembra de querer ser médica. “Julgo que terei sido influenciada por duas grandes amigas.” Nunca se arrependeu. Da exposição mediática a que tem estado sujeita não gosta, “mas sabia que vinha com o cargo”. À pressão dos holofotes reage bem, ainda que a deixe “impaciente”. “Preciso de muita segurança na informação que passo aos cidadãos”, justifica.

O bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, normalmente parco em elogios, lembra “a serenidade e a confiança que transmite sempre que fala”. “E o trabalho excecional na DGS.” Filipe Froes, pneumologista e professor, conhece bem a técnica dedicada – “uma formiga, prejudicada pelo esvaziamento de recursos da DGS” -, a amiga “leal e frontal”. A doente fácil. “Já a internei e acatou. Questiona, mas confia nas respostas.” Utente do SNS, “nunca se fez valer da posição que ocupa”. Na doença, que conhece bem, Graça Freitas é mais resiliente que nunca. “Vou-me abaixo, fico por vezes muito triste, mas sou paciente e resisto.” Acredita que a vida é feita “de picos e vales” e, por isso, não fica a remoer.

Dá importância aos pormenores: não é por acaso que as pregadeiras que habitualmente usa combinam com os brincos. Jorge Torgal, seu chefe durante quatro anos, lembra um defeito. “É demasiado condescendente com quem a maltrata.” Graça Freitas sorri, mas repete: “Não sou santa”.

Deixou de fumar há 20 anos. Toma quatro ou cinco cafés diariamente. Descreve um dia perfeito: “Acordar sem dores, tomar longamente um bom pequeno-almoço (café, pão, iogurte), dar uma caminhada, visitar a mãe, tratar das plantas e ler. Ouvir Jorge Palma. O que eu gosto de ‘Estrela do Mar’”.

Cargo: Diretora-geral da Saúde
Nascimento: 26/08/1957 (62 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Angola)