Em Portugal, são diagnosticados mais de quatro mil novos casos de cancro do pulmão todos os anos, 70% dos quais já em estado avançado. O tabagismo é o principal fator de risco, 80 a 90% dos doentes fumam ou já fumaram. Tosse crónica durante mais de três semanas, dificuldade em respirar ou falta de ar, rouquidão, tosse acompanhada de sangue, alteração de cor ou volume da expetoração, dor no tórax são os sintomas mais específicos. Os típicos não específicos incluem perda de apetite e de peso, febre e fadiga.
O cancro do pulmão continua a ser a principal causa de mortalidade por tumores malignos no nosso país. Em termos mundiais, o cenário é igual com mais de dois milhões de novos casos diagnosticados anualmente, responsável por cerca de 18,4% das mortes relacionadas com cancro. “Estes números refletem dois dos principais inimigos para quem quer combater a doença: o tabaco e o tempo até ao diagnóstico”, refere Pedro Fernandes, especialista em cirurgia torácica, médico no Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto.
Em 2018, o cancro do pulmão matou cerca de dois milhões de pessoas em todo o Mundo
Não há dúvidas: o tabaco é comprovadamente o principal fator de risco para o cancro do pulmão, responsável por mais de 80% dos casos. As políticas de cessação tabágica e de consciencialização da população para os efeitos do tabaco reduziram, de forma gradual, as curvas de incidência da doença. Mas não chega. “Os números demonstram que nas sociedades ocidentais entre dois a três em cada dez adultos são fumadores ativos, assim como a iniciação de hábitos tabágicos nos jovens ainda é substancial, pelo que é expectável que o cancro do pulmão se mantenha um importante problema de saúde global nas próximas décadas”, sublinha o especialista.
O diagnóstico é outro problema. O percurso silencioso da doença determina, em grande parte, a sua elevada mortalidade. Pedro Fernandes adianta que, após diagnóstico, apenas 15% dos doentes estão vivos cinco anos depois. Aproximadamente 70% dos casos são diagnosticados numa fase avançada. “O maior estudo europeu de rastreio de cancro do pulmão deu a conhecer os seus resultados recentemente, demonstrando que o rastreio da doença realizado com tomografia computorizada de baixa dose em homens considerados de alto risco (entre os 50 e os 74 anos, fumadores ou ex-fumadores) evidenciou uma redução da mortalidade de 26%, sendo essa redução ainda mais acentuada nas mulheres consideradas de alto risco.”
diagnóstico precoce pode evitar tratamento radical e apostar em procedimentos minimamente invasivos
O diagnóstico precoce é necessário e urgente, o rastreio é essencial e merece toda a atenção das políticas de saúde. Com o diagnóstico precoce e com a deteção de maior número de casos em fases precoces da doença, o doente entrará numa “via verde” hospitalar do cancro do pulmão. “Este conceito, em fase de introdução em várias unidades hospitalares, pretende reduzir cada vez mais o tempo entre o diagnóstico e o momento em que o doente é tratado radicalmente, nomeadamente até ao ponto em que é submetido a intervenção cirúrgica.”
O objetivo é que este percurso tenha uma duração que não ultrapasse os 30 dias. Para isso, segundo Pedro Fernandes, “é essencial a mobilização de recursos no sentido de permitir um estadiamento mais rápido da doença, com a disponibilização de meios complementares de diagnóstico e profissionais dedicados, de forma a entregar o doente para tratamento o mais breve possível”.
A cirurgia é a opção de eleição no tratamento do cancro do pulmão numa fase inicial que possibilita uma terapêutica potencialmente curativa. No campo da cirurgia torácica, o desenvolvimento da técnica e da abordagem cirúrgica permitiram que, neste momento, se possa oferecer aos doentes um procedimento cirúrgico minimamente invasivo.
Prevenir, diagnosticar, tratar são três pontos essenciais para diminuir os números da doença
A cirurgia toracoscópica vídeo-assistida permite, através de uma única porta de três a cinco centímetros, sem necessidade de afastamento de costelas, remover o lobo pulmonar ou o segmento pulmonar afetado pelo cancro do pulmão. Pedro Fernandes explica que essa é uma abordagem cirúrgica menos agressiva, que possibilita ao doente um pós-operatório menos doloroso, menor tempo de internamento, com uma recuperação funcional mais positiva e um rápido retorno à atividade normal.
Uma abordagem extremamente benéfica também para o Serviço Nacional de Saúde (SNS), já que permite uma mais rápida libertação de camas, acarreta custos inferiores de internamento por doente e menor custo em readmissões e consultas. “Decisões que enquadradas numa estratégia global permitem que os doentes regressem mais rapidamente à atividade laboral e tenham uma melhor qualidade de vida, ao mesmo tempo que o SNS liberta recursos para tratar outros doentes, o que, nesta fase de pandemia da covid-19, é fundamental.”
Prevenir, diagnosticar e tratar. Três aspetos essenciais que, na opinião do especialista, ajudam a diminuir drasticamente esse flagelo. “A mensagem que devemos deixar é de mudança. Aliando a inovação tecnológica dos nossos dias à abertura da consciência da sociedade para diversas causas, estamos no ponto de rutura com o passado e podemos atuar decisivamente nesses pontos essenciais do cancro do pulmão”, remata Pedro Fernandes.