As pausas no trabalho são prejudiciais ou benéficas?

Em Portugal, as pausas laborais não costumam estar referidas nos contratos de trabalho, exceção feita para o período de almoço Ilustração: Bárbara R.

Interromper o trabalho durante cinco ou dez minutos, tomar um café, fumar um cigarro ou tão-só apanhar ar é uma necessidade, mas também uma mais-valia. Não só para o trabalhador como para a entidade patronal.

“Por mais que muitas empresas continuem a pedir uma dedicação plena, sem intervalos nem distrações, não nos podemos esquecer das nossas características e necessidades, nem ignorar os dados elaborados nos últimos anos em torno da produtividade”, alerta Filipa Jardim da Silva. A psicóloga clínica e coach menciona, por exemplo, um estudo que analisou 5,5 milhões de registos diários de funcionários de um escritório, destacando que os profissionais mais produtivos trabalham uma média de 52 minutos até fazerem uma pausa de cerca de 17. “São muitos os estudos que, nos últimos anos, têm aferido os múltiplos benefícios de micropausas ao longo de um dia de trabalho ou de estudo, seja para garantir maiores níveis de saúde física e mental, seja para favorecer a maior eficácia.”

Em Portugal, as pausas laborais não costumam estar referidas nos contratos de trabalho, exceção feita para o período de almoço. Mas isso não quer dizer que muitas empresas não tenham normas e regulamentos internos que são comunicados aos trabalhadores.

Bárbara – que prefere não expor o último nome – ,assistente de backoffice numa empresa de trabalho temporário, está familiarizada com uma política de intervalos bem definida pela empresa. “Tínhamos direito a quatro minutos de pausa por cada hora de trabalho, e este ano passou a cinco.” Isso significa que, além da hora do almoço, tem direito a 40 minutos diários que pode usar como entender. Por norma, divide este tempo entre uma interrupção a meio da manhã, para pequeno-almoço e café, e outro a meio da tarde, para relaxar e conversar com os colegas. Mas também admite que esta gestão flexível não se verifica em todos os departamentos da empresa: quem faz atendimento ao público, apesar de usufruir dos mesmos 40 minutos por dia, precisa de ser autorizado a parar, para não haver sobreposições que prejudiquem o serviço.

A empresa controla estes tempos através de uma aplicação onde fazem login e logout, conforme estão ou não no posto de trabalho. Assim, fica registada a hora de entrada, de saída, o tempo de paragem para almoço e as pausas ao longo do dia. Até agora, a regra tem tido uma função meramente indicativa. “Os tempos de pausa não são descontados se forem ultrapassados e numa situação pontual também não somos chamados à atenção. Mas a verdade é que praticamente toda a gente cumpre a indicação.” Apesar de compreender que exista este limite, Bárbara compreende menos bem uma alteração que a empresa já tentou várias vezes, encontrando sempre oposição dos trabalhadores: que as idas à casa de banho passassem também a ser contabilizadas como tempo de pausa.

Arejar é preciso

Filipa Jardim da Silva não tem dúvidas de que as “pausas regulares, a cada hora, promovem não só uma maior produtividade, mas também uma melhor capacidade de decisão e de resolução de problemas, maiores níveis de criatividade, uma maior consolidação de aprendizagens e de memórias e níveis de motivação mais sustentáveis”.

Mas se é verdade que as interrupções são importantes para todos, revestem-se ainda de maior importância para a produtividade de quem tem “empregos cerebrais” ou trabalha em áreas criativas. Quem é que nunca passou pela experiência de encontrar soluções quando deixa de pensar no problema? “Para tarefas que exijam mais do nosso cérebro do que do nosso corpo, a estrutura do córtex pré-frontal é particularmente requerida. É esta área do nosso cérebro que nos ajuda a manter focados nos objetivos e é também esta área que é responsável pelo funcionamento lógico, funções cognitivas superiores e capacidade de tomada de decisão em detrimento de impulsos”, explica a psicóloga. E estes breves períodos de inatividade revitalizam a capacidade de atenção.

É por isso que Dalila Madureira, de 36 anos, designer e diretora de arte numa agência de comunicação, está habituada a um sistema livre: não há controlo ou regra alguma quanto a interrupções no trabalho. A única coisa que importa é que tudo apareça feito a tempo e horas. “É preciso fazer pausas para ‘limpar a vista’. Quando voltamos ao fim de dez ou 15 minutos olhamos para os trabalhos de outra forma, apagamos, mudamos, vemos que afinal há coisas que não fazem sentido.” E no que toca a situações de bloqueio criativo, estes momentos longe do computador são ainda mais importantes. “É muito contraproducente insistir em vez de parar para arejar. No caso de bloqueio, insistir significa passar horas de volta de um trabalho sem necessidade. Por norma, quando se está bloqueado, basta parar um bocado e ir fazer outra coisa que, quando se volta, sai tudo com mais facilidade e mais rapidamente.”

Mas as pausas não são todas iguais, e não apresentam todas as mesmas vantagens. Para que cumpram o seu propósito, diz Filipa Jardim da Silva, é fundamental assegurar que existe uma mudança de foco: “Se vamos continuar a falar sobre trabalho ou a dizer mal da colega do lado, naturalmente, este tempo não será tão eficaz como poderia”. Por outro lado, faz sentido aproveitar para fazer “algum movimento físico, seja dentro do escritório ou num espaço exterior”, para atenuar as longas horas sentado em frente a uma secretária e a um computador, e “aproveitar estes intervalos para abastecer o corpo com bons níveis de hidratação e uma nutrição de qualidade”.

Fotossíntese e recarregar baterias

Dalila tem por hábito fazer duas pausas, uma a meio da manhã, outra a meio da tarde, mas se for necessário faz mais ao longo dia. Sente que lhe fazem bem às pernas, à vista e à disposição. “Temos uma copa com varanda no escritório. Quando vamos buscar um café ficamos ali um pouco a fazer a fotossíntese e recarregar baterias.” Além disso, lembra, estas paragens também beneficiam o ambiente laboral. “Fazemos um trabalho de equipa: socializar e conversar um pouco reforça as relações entre colegas.”

Nunca sentiu que alguém a olhasse de lado, que lhe controlasse as entradas, saídas ou pausas, até porque o trabalho aparece feito a horas. Mesmo quando isso implica meter mãos à obra a desoras ou ao fim de semana. “Trabalhei no sábado passado, por exemplo. Porque a questão também é esta: quando são flexíveis connosco, nós somos igualmente flexíveis. E a motivação para produzir é outra.”