Escolhas de Fernando Alvim: ao sol, num navio

Fernando Alvim é animador de rádio e TV (Foto: Jorge Amaral/Global Imagens)

O cinema do Fellini

Nesta quarentena tentei fazer de tudo para não enlouquecer. Estive para entregar a minha alma ao fabrico de pão usando ingredientes saudáveis, sendo inventivo, misturando ingredientes secretos e exóticos, mas em vez disso dediquei-me a ver tudo o que havia sobre a cinematografia de Fellini. E não me dei mal. Fiquei daqueles militantes que agora quer ver tudo o que houver disponível, que quer ser convidado de honra naqueles ciclos da Cinemateca. É fácil falar de “La Dolce Vita”, do “Fellini 8 1/2”, mas é melhor ir para lá do óbvio e sugerir “A Cidade das Mulheres” ou “O Navio”. Eu sei que parece demasiado intelectual, mas juro que não é nada essa a ideia.

Calor

Estou a passar férias na Amareleja com uns amigos que tenho há muitos anos. Viemos os três para podermos falar sobre as nossas vidas, sobre as nossas relações, sobre o que achamos que ainda estará por vir. A meio do caminho, um deles diz para ouvirmos a música “Calor” dos Glockenwise, com a voz emprestada do Rui Reininho. E desde aí, desde o quilómetro cento e pouco, que tem sido o hino desta nossa estadia. Em loop, como os sonhos não realizados.

A Sul de nenhum Norte

Não há uma estação do ano para regressar a Charles Bukowski, mas no verão, por haver mais tempo, forçosamente regresso a ele. E de cada vez que o leio sinto-lhe o hálito, a voz soturna e torpe, o nevoeiro tabágico, o som do uísque a verter no copo com gelo. Leio-o como se o ouvisse e tento adivinhar a sua voz a cada palavra. Bukowski dá que pensar.