Jorge Manuel Lopes

A esperança que dança


Reuniões de artistas em compilações é uma de várias formas de enfrentar a devastação causa pela pandemia, em especial entre aqueles, nas artes, cujos rendimentos dependem substancialmente de atuações ao vivo e prestações como DJ. Assim fez a editora lisboeta Príncipe, que lançou “Verão dark hope”, juntando em formato digital 32 composições de outros tantos nomes. A totalidade dos proveitos da venda desta recolha, que pode ser adquirida em conjunto com uma seleção de t-shirts, reverte para os autores envolvidos.

No elenco de “Verão dark hope” convivem muitos dos produtores que têm feito da Príncipe uma entidade central na bem-sucedida propagação das ondas de invenção e renovação eletrónicas de batidas da diáspora africana. Os que seguem este tornado criativo conhecerão e saudarão a presença de gente como Nídia, DJ Lycox, DJ Firmeza ou DJ Nigga Fox.

Talvez fruto do contexto global, pressente-se uma melancolia numa parte apreciável das faixas (algumas são composições recentes, outras saíram do arquivo). Melancolia que, numa perspetiva de copo-meio-cheio, pode ser encarada como luzes de esperança que pulsam entre cascatas de ritmos e melodias sintéticas em código morse. Há aqui dezenas de criadores numa singular sintonia de inspiração e maturidade, e com algumas incursões menos comuns entre o elenco da editora: Nuno Beats, com “Esse verão”, e Lilocox, com “Greatness”, abrem autoestradas house rumo ao pôr-do-sol e que salpicam todo o disco. Não faltam batidas em aceleração, de Mixbwé com “I miss Galopz” à exuberância de DJ Nervoso (“Conga”) e DJ Marfox (“Tshuma”), mas desta vez são exceções no alinhamento.

Também há surpresas, como a frescura ambiental de “7648” de Niagara, ou peças de difícil descrição, como “Load” de DJ CiroFox, com pulsação sombria e espaçada e um alarme que não se desliga. Mas tanto as surpresas como os novos rumos preservam as raízes minimais associadas à etiqueta. No fecho, “Dark hope”, que empresta o nome à coletânea, revela DJ Danifox a mexer com piano, voz e um ar de morna. Em plena turbulência, este é o disco mais diurno, acessível (e langoroso, já agora), lançado pela Príncipe.lm