A angústia de perder um bicho de estimação

Quando se fala de perda, mais vale prevenir do que remediar (Foto: Rui Oliveira/Global Imagens)

Há três anos, Lótus escapou por uma janela entreaberta. Desapareceu num dia de verão, em agosto de 2017, em Valadares, Vila Nova de Gaia. Até ao reencontro, as noites de Paula Baía foram passadas dentro do carro, estacionado à porta do prédio. A angústia dominou os dias. Foram horas a fio à procura do gato da família, à época com oito anos.

“O Lótus foi encontrado com os irmãos num caixote do lixo. Eram recém-nascidos e fiquei a cuidar da ninhada. Dava-lhes biberão de três em três horas”, recorda Paula, apelidando o felino de “gato-cão” por ter “muita necessidade de companhia humana”.

De pelo branco e personalidade dócil, Lótus cresceu lado a lado com o filho mais novo de Paula. Além de uma amizade, partilham o quarto. Aliás, foi ao deitar o filho que se apercebeu do desaparecimento do felino. “Entrei completamente em pânico e fui à rua. Cruzei-me com um vizinho que me disse que o tinha visto à porta do prédio.” Nessa noite, Paula já não dormiu em casa. “Andei a pé pelas redondezas. Sabia que após desaparecerem, os gatos não andam quilómetros. Permanecem na zona que lhes é familiar.”

“Lidei melhor com a morte de animais que tive do que com o desaparecimento. É uma incógnita”
Paula Baía

A busca incessante fez-se até ao aparecimento de Lótus. Paula Baía nunca duvidou do reencontro. Gastou mais de 200 euros em cartazes a cores, alertou as clínicas veterinárias e colocou a caixa de areia do felino à porta do prédio. “Lidei melhor com a morte de animais que tive do que com o desaparecimento. É uma incógnita.”

A história teve um desfecho feliz ao 13.º dia. Desesperada e equacionando a possibilidade de ter sido capturado, a chefe de cozinha decidiu procurar Lótus na Feira da Vandoma, no Porto. No entanto, um telefonema alterou o rumo da viagem. “O meu vizinho disse-me que tinha encontrado um gato na garagem. Comecei logo a tremer porque soube que era ele. Estava pele e osso, completamente cinzento. Agarrei-me a ele e chorei. Foi uma das melhores sensações que já tive.”

Anúncios, alertas, folhetos

À Midas, em Matosinhos, recorrem vários donos à procura do animal de estimação, passando os portões da associação crentes num reencontro. Sónia Rodrigues, voluntária há seis anos, recebe-os e guia-lhes os passos. Em caso de fuga, há locais de passagem obrigatória. “Orientamos as pessoas para o Centro de Recolha Oficial de Animais de Matosinhos e depois aconselhamos a colocar um anúncio no site ‘Encontra-me’, a alertar as clínicas e hospitais veterinários da zona, a conversar com pessoas que alimentam animais na rua e a imprimir folhetos.”

A par das ferramentas tradicionais, as redes sociais apresentam-se como um meio complementar na procura. E há ainda o Sistema de Informação de Animais de Companhia, uma plataforma online onde é possível comunicar a perda do bicho e, posteriormente, informar do seu resgate.

Paula Baía encontrou o gato Lótus ao fim de 13 dias de desaparecimento
(Foto: Rui Oliveira/Global Imagens)

Em épocas de cio e nos meses em que o fogo de artifício reina nas festas populares ou na passagem de ano, aumentam as fugas. Nestes casos, há que prevenir, garantindo a estabilidade emocional do animal e evitando que fique sozinho. “Quando se sentem ameaçados, os cães tentam furar por tudo quanto é sítio. Se sabemos de antemão que têm pânico de foguetes, devemos providencia um espaço interior onde possam estar mais sossegados e sofrer menos com o barulho”, alerta Sónia Rodrigues.

No caso de Pedro Rodrigues, um susto provocado por um cão foi determinante para perder a Josefa, uma cadela “com muitos medos” adotada pela mãe em outubro de 2018. Tem pelo castanho e branco, cerca de 21 quilos e olhos castanhos “muito grandes”. Passado quase um mês desde o desaparecimento, na zona de Custóias, Matosinhos, o paradeiro permanece uma incógnita. No dia da fuga, Pedro Rodrigues pernoitou dentro do carro na tentativa de a avistar. Desde então, as buscas são diárias, com a distribuição de comida por alguns pontos estratégicos. Nos primeiros dois dias percorreu 30 quilómetros. Como companhia, o jovem de 28 anos conta com Gaspar, o seu cão. “Até agora, consegui encontrar 23 cães diferentes”, diz. Nenhum era a Josefa.

Ciente das dificuldades em encontrar a cadela, Pedro Rodrigues não poupa esforços. Distribuiu cartazes, colocou um anúncio no site “Encontra-me” e criou uma página no Facebook, intitulada “Vamos Encontrar a Josefa”. “Acredito que esteja integrada numa matilha, ande de um lado para o outro e seja muito difícil apanhá-la.”

“Até agora, consegui encontrar 23 cães diferentes. Nenhum era a Josefa”
Pedro Rodrigues

Tanto a Josefa como o Lótus têm microchip, um elemento facilitador no processo de devolução do animal ao lar, caso este seja avistado e transportado a uma clínica ou um hospital veterinário para realizar a sua leitura. A colocação é rápida, praticamente indolor e não interfere com a saúde do animal.

“A intervenção é semelhante à de uma vacina. Em vez de um líquido introduz-se o microchip com um tamanho de um grão de arroz”, explica Rui Pinto, veterinário na Clínica de Santa Rita, em Ermesinde, Valongo, onde diariamente se registam pedidos de ajuda para encontrar animais de estimação.

“Antigamente não havia muitas pessoas a ir a uma clínica perguntar se viram o animal. Se desaparecia, arranjavam outro. Hoje em dia, os animais são elementos da família. São uma companhia e a evidência de que há cada vez mais solidão nas pessoas”, considera o profissional com 21 anos de experiência.

Pedro Rodrigues procura a sua cadela Josefa, que não vê desde 7 de fevereiro
(Foto: Rui Oliveira/Global Imagens)

Quando se fala de perda, mais vale prevenir do que remediar. E por isso Sónia Rodrigues, da Midas, deixa dois conselhos: “Os gatos são muito curiosos por natureza. É preciso ter muito cuidado com portas e janelas porque a ocasião pode potenciar a fuga indesejada. No caso do cão, defendemos o uso de coleira com chapa de identificação. Não resolve o problema, mas quando vemos o animal desorientado no meio da rua sabemos de antemão que tem dono”.

Manual para uma busca eficaz

Cartazes
Depositar folhetos em caixas de correio e distribuir cartazes junto ao local da fuga são técnicas clássicas. Os cartazes devem incluir uma descrição do animal, fotografia, informações sobre o desaparecimento e contactos dos donos. Devem ser verificados regularmente e substituídos caso seja necessário.

Internet
É aconselhado reportar a fuga na plataforma “Encontra-me”. O site é bastante consultado em situações de desaparecimento e aparecimento de animais de estimação. A divulgação nas redes sociais, nomeadamente em grupos focados no encontro de animais perdidos, permite chegar a mais gente. Após o reencontro deverão ser recolhidos os cartazes, atualizados os anúncios e informado quem auxiliou nas buscas.

Notificar
O bicho também deve ser procurado em associações, canis e centros de recolha animal. Devem ainda ser notificados as clínicas e os hospitais veterinários das redondezas, bem como as pessoas que alimentam animais nas imediações.

Em épocas de cio e nos meses em que o fogo de artifício reina nas festas populares ou na passagem de ano, aumentam as fugas (Foto: Rui Oliveira/Global Imagens)

Rondas
Percorrer o local do desaparecimento a pé, distribuindo comida em pontos estratégicos, é um truque a considerar. Durante as rondas, poderá chamá-lo pelo nome ou utilizar outros animais nos quais ele confia.

Microchip
Se o animal tiver circuito eletrónico, o desaparecimento deve ser reportado no site do Sistema de Informação de Animais de Companhia, onde é possível comunicar a fuga e, depois, informar do seu resgate. Quem encontrar um animal perdido deve deslocar-se a clínicas ou hospitais veterinários para verificar se possui microchip.