Sexta-feira 13: é supersticioso?

Texto de Cláudia Pinto

Há pessoas que chegam a desenvolver uma fobia associada à sexta-feira 13 por a relacionarem a tragédias ou a maldições, ao qual se dá o nome de parascavedecatriafobia. Já a triscaidecafobia traduz o medo associado ao número 13. Só os nomes são um verdadeiro “susto”.

Algumas teorias associam as sextas-feiras 13 ao azar. Uma delas é religiosa: acredita-se que Jesus Cristo terá sido crucificado a este dia da semana. Por outro lado, na Última Ceia estavam 11 apóstolos com Jesus e o 13.º a chegar à mesa foi Judas, que o traiu. No mundo ocidental, este dia não tem boa fama e esse facto foi inspirador para os filmes de terror da saga “Sexta-Feira, 13”, por exemplo.

“Claro que evito passar debaixo de escadas de mão porque elas podem cair e não por superstição. Mas espelhos partidos, gatos pretos e sextas-feiras 13 não me incomodam mesmo nada”, confessa Carlos Fiolhais, professor de Física da Universidade de Coimbra. E ainda brinca com a ideia dos espelhos partidos: “Nesse caso, é uma chatice porque tenho de apanhar os cacos”.

O também diretor do Rómulo – Centro Ciência Física da Universidade de Coimbra nunca repara se entra num local com o pé esquerdo ou direito. “Não faz qualquer diferença”, assegura, contextualizando as teorias que originaram tanto receio associado a esta espécie de efeméride. “Há quem refira o dia 13 de outubro de 1307, quando o rei francês mandou prender muitos templários. E há quem fale no ataque aéreo a Londres pelos nazis a 13 de setembro de 1940. Mas não há evidência estatística que indique que estes dias são piores do que os outros.”

Apesar de este ser um dia alegadamente azarento, “não está minimamente provado que assim seja”, defende, indicando que até pode ser um dia de sorte. “Existe muita gente supersticiosa neste vasto mundo que andará mais precavida nesse dia.”

É difícil encontrar estudos científicos ligados a esta data ou às superstições em geral. A explicação é partilhada por Carlos Fiolhais, que considera que “o método científico é o melhor antídoto contra a superstição”. E justifica: “Esta área está mais imune às crenças injustificadas. A ciência parte de convicções – as hipóteses – mas tenta encontrar erros, através da observação, da experiência e do raciocínio lógico. Não quer isto dizer que os cientistas não sejam humanos e que alguns deles não manifestem práticas de superstição e, muitas vezes, rituais inócuos”.

O que escondem os números

Do ponto de vista da religião, o 13 está associado a datas importantes, como o dia das aparições de Nossa Senhora de Fátima e o dia de Santo António. “Em Itália, que é um país cristão, o dia de azar não é o 13 mas sim o 17. Os italianos dizem que o número 13 dá sorte”, prossegue Carlos Fiolhais. É que ao contrário do que se possa pensar, a ligação do número 13 ao azar não é explicada pela numerologia.

“Esta apenas deriva da interpretação e conotação que se tem dado aos conceitos que este número representa. Por outro lado, o 13 simboliza tudo o que na vida identificamos como processos de ‘renascimento’, ou seja, situações que nos levam a mudar a forma de estar, crenças, paradigmas e hábitos que nos impedem de viver melhor. Por vezes, essas situações podem ser mais ou menos dolorosas, mas sempre que associadas a um 13 representam a destruição de estruturas de vida obsoletas e que precisam de ser reestruturadas, desde um emprego, uma união ou até mesmo a ligação a uma casa”, salienta Ana Sequeira, especialista em numerologia.

Na forma como utiliza a numerologia na sua vida profissional, prefere enfatizar que os números não ditam nem a sorte nem o azar mas sim “o nosso percurso de evolução e todas as possibilidades que a vida tem para nós. É o nosso foco, a nossa escolha e a nossa postura que vão ditar a forma como fazemos esse caminho”, defende.

Ana Sequeira costuma explicar aos seus alunos que todos os números têm um ponto de equilíbrio e o oposto. “Para combater o lado menos positivo de qualquer número é fundamental entender o que ele nos pede para fazer – a melhor forma de pensar e agir – e seguir essa linha.” A numerologia surge como um sistema milenar baseado na interpretação da simbologia da data de nascimento e do nome, “permitindo-nos ter na mão a bússola da nossa vida”.

“La Última Cena”, de Juan de Juanes (1555-1562). Da coleção do Museo Nacional del Prado, Madrid.

As superstições acabam por resultar de crenças “sem significado nem eficácia”, sublinha Carlos Fiolhais. Relativamente às expressões “boas energias” ou “bons espíritos”, o professor sugere que são utilizadas atualmente por “muitas atividades pseudocientíficas que servem para enganar quem se deixa enganar. O azar, sorte, ou o que lhe quiserem chamar – os físicos chamam-lhe acaso – existe mesmo”.

E os acasos da vida remetem para a noção de controlo, aquilo que é tão desejado por uns mas tão difícil na imprevisibilidade dos dias. “Ora, em muitos rituais de superstição há uma suposição, ainda que escondida, que se pode ter controlo”, defende o professor, denotando contudo que alguns rituais podem ter bons resultados.

“Existem superstições úteis apesar de ser difícil alcançar objetividade neste assunto. Se olharmos para o rendimento de atletas de alta competição vemos que há flutuações aberrantes, que se devem, por vezes, a ansiedade, stress excessivo, falta de foco, deficiência de autocontrolo, etc. Certos rituais, praticados por atletas quando entram em jogo, têm precisamente o propósito de diminuir a ansiedade e o stress e aumentar o foco e o autocontrolo. E é verdade que a ciência tem vindo a interessar-se por estes fenómenos.”

Do normal ao patológico

Também a psicologia cognitiva e a sociologia têm vindo a estudar este assunto. “Ter medo ou sentir alguma apreensão pela sexta-feira 13 inclui-se no tipo de comportamentos supersticiosos e faz parte do repertório de algumas culturas. No entanto, algumas pessoas lidam de modo disfuncional relativamente a este dia”, afirma a psicóloga clínica Catarina Chaves Baptista, do Espaço Neutro e do Grupo Joaquim Chaves. O medo desta data é enquadrado, em intervenção psicológica, no campo geral das superstições, sendo o principal enfoque “a gestão da ansiedade e o trabalho cognitivo sobre as crenças do indivíduo”.

E será que podemos falar de coincidências relativamente às superstições? Carlos Fiolhais defende que as coincidências existem mesmo que nos recusemos a aceitá-lo. “Tentamos tornar humano o que não é humano, imaginando ligações. Julgamos que coisas naturais têm uma origem com traços humanos. Como disse o filósofo escocês David Hume: ‘Temos caras na Lua e exércitos nas nuvens’. Julgo que Hume tem razão, todos nós temos esse lado de ‘propensão para a magia’. A ciência é o mais bem sucedido empreendimento do espírito humano, pois permitiu-nos viver mais e melhor. O pensamento racional tem um método que permite ir para além das aparências e do senso comum.”

Do ponto de vista da psicologia, “relacionar acontecimentos independentes é típico do comportamento humano, porque somos sensíveis às coincidências. Elas tendem a explicar comportamentos para os quais não temos outra explicação e podemos associar uma consequência positiva ou negativa a um comportamento específico”, destaca Catarina Chaves Baptista.

É possível que os supersticiosos que temem esta data tenham passado por um acontecimento negativo ocorrido nesse dia. O comportamento supersticioso pode ser visto como natural e não é considerado um problema a menos que comece a depender de certos amuletos e objetos diariamente, e nos sentirmos inseguros na sua ausência ao ponto de evitar realizar determinadas atividades.

“Quando deixamos de fazer algo e alteramos as rotinas com medo que aconteça algo negativo por ser sexta-feira 13, isso já se enquadra num quadro psicológico disfuncional. Pensamentos supersticiosos todos temos, mas a forma como nos relacionamos com eles é que distingue o normal do patológico”, reforça a psicóloga.

Crenças que ultrapassam gerações

Em terapia ao nível da psicologia, se os pacientes apresentam uma relação disfuncional com os pensamentos supersticiosos, é trabalhada a aceitação dos mesmos como naturais à vida e às pessoas, para ajudar a gerir melhor a ansiedade. “Na base do pensamento supersticioso estão crenças irreais, mas carregadas de simbolismo passadas de geração em geração, que invalidam a desconstrução de algumas crenças. O psicólogo Gustav Jahoda denominou-as, em 1969, de ‘socially shared superstition’ (superstições aprendidas culturalmente)”, elabora Catarina Chaves Baptista.

Os pensamentos surgem então como “acontecimentos da mente” e não como ações propriamente ditas. E da mesma forma que não conseguimos ter o controlo sobre o presente ou o futuro, também não temos o poder de fazer algo acontecer apenas por pensarmos muito nisso, “mesmo que o façamos com muita convicção e força”. Algumas pessoas aprenderam, no entanto, a gerir a sua ansiedade através de rituais e comportamentos.

“A superstição funciona como uma estratégia para lidar com a ansiedade que certos pensamentos nos provocam. Alguns estudos psicológicos referem que as superstições ocorrem mais quando nos sentimos ansiosos devido à incerteza e à sensação de falta de controlo sobre a situação”, assinala a psicóloga clínica. Surgem assim como uma forma de nos manter agarrados à ilusão de controlo perante situações que são objetivamente incontroláveis e sujeitas à incerteza.

“Apesar de ilusória, essa sensação permite reduzir a sensação de insegurança, medo e níveis de ansiedade.” Quando não se consegue encontrar explicações objetivas para situações imprevistas, é habitual que o ser humano se agarre a superstições.

Ana Sequeira defende que é possível usar “a sabedoria da numerologia a nosso favor, transformando medos em forças e dificuldades em oportunidades”. Carlos Fiolhais adianta que “a ciência é a melhor maneira de não nos enganarmos nem sermos enganados. E, nos tempos de hoje da Internet, anda mais de meio mundo a enganar menos de meio”.

Se depois de ler este artigo, e apesar das explicações, mantiver as suas superstições, descanse: este ano haverá apenas mais uma sexta-feira 13. Em dezembro.