Rins, olhos e coração em perigo. O impacto da diabetes na velhice

A diabetes na população idosa está associada a maior mortalidade, redução da capacidade funcional, aumento do risco de institucionalização. As consequências da doença na velhice têm efeitos colaterais e não há volta a dar.

Diabetes na velhice é uma situação comum e nada recomendável. A diabetes, especialmente a de tipo 2, é uma das doenças crónicas mais prevalentes na população idosa e arrasta outras patologias e complicações de saúde como obesidade, excesso de peso, hipoglicémias, hipertensão, doenças cardiovasculares, entre outras. Oito em cada dez idosos têm excesso de peso e 15% das pessoas com diabetes tipo 2 têm uma doença cardiovascular estabelecida.

Portugal tem uma população envelhecida, há três anos era o quinto país mais envelhecido da União Europeia. A longevidade aumentou, a natalidade desceu. E o fator idade é um importante risco para o desenvolvimento de diabetes tipo 2, a forma mais comum desta patologia. As causas são conhecidas: maior sedentarismo da população idosa, alta prevalência de obesidade ou pré-obesidade, perda de massa muscular que é frequente nesta faixa populacional.

“O envelhecimento da população em geral é um impulsionador significativo da epidemia de diabetes. Segundo os últimos dados do Observatório Nacional da Diabetes, 27% da população portuguesa entre os 60 e os 79 anos de idade apresentar-se-ia com diabetes mellitus (dos quais, a quase totalidade com diabetes tipo 2). Comparativamente à população diabética mais jovem, os idosos com diabetes apresentam um maior risco de desenvolver complicações tardias da doença, nomeadamente doença cardiovascular ou afeção dos rins, olhos ou sistema nervoso”, adianta à NM o endocrinologista José Silva Nunes, do serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo do Hospital de Curry Cabral, em Lisboa.

A diabetes afeta sobretudo grupos etários com mais idade: 23,8% dos doentes têm entre 65 e 74 anos

A diabetes é um aumento persistente dos níveis de açúcar no sangue e a terapêutica disponível tenta induzir uma redução desses valores para níveis o mais próximo possível daqueles que caracterizam uma pessoa sem a doença. “Caso tal não seja conseguido, ao fim de alguns anos, existe um risco acrescido de desenvolver complicações da diabetes a nível de vários vasos. Assim, entre outros, poderão ser atingidos os vasos dos rins ou da retina, com eventual evolução para insuficiência renal (podendo vir a necessitar de efetuar hemodiálise) ou para lesão dos olhos (podendo evoluir para perda da visão)”, refere o especialista do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central.

“Contudo, ao utilizar alguns medicamentos para controlar os níveis sanguíneos de glicose (açúcar) pode acontecer uma redução para níveis abaixo do normal (hipoglicemia), situação esta que pode ser potencialmente fatal. Esse risco está aumentado na pessoa idosa com diabetes, tanto mais quanto maior for o seu grau de fragilidade.” A diabetes em pessoas idosas está associada a maior mortalidade, a uma redução da sua capacidade funcional e a um aumento do risco de institucionalização.

Para controlar os níveis de glicose é imprescindível que se atue sobre os hábitos de vida das pessoas com diabetes, com atividade física e correção de erros alimentares. De forma complementar, podem ser utilizados medicamentos orais ou medicamentos tomados através de uma injeção na gordura por baixo da pele, via subcutânea, para reduzir os níveis de açúcar sanguíneo.

Uma das complicações tardias da diabetes é a nefropatia diabética, afeção dos rins induzida pela doença

“Com a panóplia de fármacos antidiabéticos que existem na atualidade, pode dizer-se que é muito mais fácil uma pessoa com diabetes ter uma vida dita ‘normal’. Mas tal não descura a necessidade imprescindível de uma pessoa com diabetes ter hábitos de vida saudável. Contudo, como há pessoas com diabetes que necessitam de fazer medicamentos que têm risco de induzir hipoglicemia, estas necessitam de controlar os níveis de açúcar através da determinação da sua concentração numa gota de sangue colhida por picada de um dedo (glicemia capilar). Mantendo níveis controlados de glicemia ao longo da vida, pode evitar-se o desenvolvimento das complicações da diabetes e, assim, permitir que essas pessoas possam ter a tal vida ‘normal’”, explica o endocrinologista.

José Silva Nunes refere ainda que um diabético quanto mais idoso for mais tempo viverá com a doença. Se o controlo glicémico for deficitário, maior é o risco de desenvolver complicações tardias da doença. Todavia, sublinha, mais do que a sua idade, nos idosos diabéticos, é preciso ter em conta o grau de fragilidade.

“Um idoso frágil é caracterizado por uma combinação de fadiga significativa, perda de peso recente, restrição severa de mobilidade e força, maior propensão a quedas e aumento do risco de institucionalização. A fragilidade é uma condição médica reconhecida e está presente em cerca de 25% das pessoas idosas com diabetes. Existe uma pequena proporção de idosos frágeis com diabetes que podem ser relativamente independentes mas, com o tempo, um maior grau de dependência acaba por se desenvolver”, sublinha.

A diabetes é uma doença crónica, ou seja, não tem cura. Mas, neste momento, a sociedade tem ao dispor armas terapêuticas, mais controladoras e que asseguram uma maior qualidade de vida dos doentes.