Quando a sensualidade se alia ao desporto

Aula de dança do varão na escola Studio UP!, no Porto. (Foto: Rui Oliveira/Global Imagens)

Quando Simone Prieto, de 48 anos, decidiu emigrar do Brasil para Portugal com o marido, há ano e meio, só tinha uma condição: “Tinha de ter pole dance (dança do varão)”. Ambos tomaram a decisão de deixar a terra carioca (são do Rio de Janeiro) por razões políticas e económicas. “O meu marido quis emigrar e eu quis vir curtir este Mundo velho pela experiência.” Estão só os dois, Simone e o marido. “É o amor e Portugal.”

Mas vamos ao que interessa: dança do varão. Tornou-se “paixão” o que começou por “brincadeira”. “Estava uma vez num hotel com o meu marido, havia um varão e eu experimentei. Nem sabia mexer-me naquilo. Achei piada. Fui procurar e pensei que só tinha coisas de boate mas não, havia academias para aprender pole dance”, conta à “Notícias Magazine”. Inscreveu-se numa academia há mais de três anos. A partir daqui rompeu barreiras, desinibiu o corpo e a mente, ganhou força muscular. “Descobri-me. Fui-me encantando, extasiando em cada aula”.

Na opinião de Simone Prieto, qualquer pessoa pode treinar dança do varão. “Como em qualquer dança, o professor vai ensinando passo a passo.” E que caia o pano do preconceito: “Não é uma dança só para sensualizar. Tem uma parte de muito fitness, muita força nos braços, nas pernas e sem limitação de idade”. Simone espera vir a ser uma “daquelas ‘coroas’, uma vovózinha no pole”. Mas também há sensualidade: “A gente sente-se bonita”. E, depois, a parte mental também é muito importante. Como em qualquer desporto, fica a sensação de “eu posso, eu consigo”.

Todavia, se para Simone não existe preconceito em praticar dança do varão, apenas curiosidade, já Miguel Areias, de 36 anos, cozinheiro de profissão – e apaixonado pela dança de varão desde 2015, quando a experimentou pela primeira vez na Dragon Fly Pole Dancers Copilco, no México -, sente que a intolerância é a maior barreira nesta prática que lhe transmite uma “força imensa”.

O afifense reconhece esta dança como “um constante desafio à gravidade, uma sensação de voar”. É quase um “milagre” quando consegue treinar duas vezes por semana. Foi na dança de varão que Miguel conheceu a sua melhor versão. “Cada vez que subo na barra sou feliz.” Para treinar, “acima de tudo, é preciso força de vontade, o resto vem por acréscimo. É preciso muita força abdominal, controlo e coordenação motora. A força e a flexibilidade vão-se trabalhando, é uma evolução constante”.

Já para Helena Ferreira, a dança de varão é sensual na medida em que nos ensina “a ter amor-próprio e a gostarmos dos nossos corpos”. Conseguiu alcançar a confiança e a segurança nas relações interpessoais e até apelida esta dança como um “desporto de empoderamento”. Helena pratica o varão no Studio UP!, escola de dança no Porto. Marta Stein, russa naturalizada portuguesa, dirige a escola e avança que a modalidade está a ganhar cada vez mais adeptos.

“Há 15 anos era difícil encontrar um estúdio para fazer pole. Ninguém reconhecia a dança de varão como disciplina.” Hoje, segundo Marta, há a vertente desportiva com o apoio da IPSF (International Pole Sport Federation) e da POSA (Pole Sports & Arts World Federation), que apoia a dança na vertente de coreografia. Em Portugal existe a APVD, Associação Portuguesa de Varão Desportivo, nascida há pouco mais de um ano, com o objetivo de divulgar a atividade.

A APVD conta com 268 sócios, entre escolas e atletas de dança do varão. Nasceu da constatação de “muitos portugueses desconhecerem o varão como desporto”, justifica à NM Andreia Patrícia Pinto, responsável da Associação. O trabalho da APVD já culminou na organização de duas edições do Festival Internacional de Dança do Varão, uma em Lisboa e outra em Braga, desde 2016.

Este ano, o evento realiza-se em Santa Maria da Feira, ainda sem data marcada. No próximo ano, a APDV planeia a sua primeira competição 100% nacional. “Será um torneio oficial da federação internacional, de apuramento para o maior campeonato mundial de pole que existe atualmente e o único que possui visibilidade perante a Global Association of Global Sports Federations e o Comité Olímpico Internacional”, adianta Andreia.

Os movimentos do quadril

Anitta, Kevinho e MC Kekel são artistas que impulsionam o funk, uma das danças que, na voz de Bruno Mourato, proprietário da escola de dança Dance4U, também na cidade Invicta, “está na moda”, sendo a mais popular entre os jovens nas turmas da escola, entre os 18 e os 30 anos. “É uma dança sensual devido aos constantes movimentos do quadril”, diz, sem rodeios, o empresário. Jazz funk e high heels também fazem parte do cardápio de formação de danças na escola com “vertente de coreografia e de show”. E precisa: “Todos estes estilos de dança são muito direcionados para o sexo feminino”.

O jazz funk tem uma forte influência das técnicas de dança jazz, porém adaptado a um repertório mais comercial. É dançada em saltos altos, ao estilo das Pussycat Dolls, uma girl band americana da década passada que tinha um lado burlesco acentuado. Os benefícios destas danças são enumerados por Bruno: “As grandes vantagens de quem pratica estes estilos são a possibilidade de se libertar mais, de ser uma pessoa diferente em cima do palco, de trabalhar a autoestima, a capacidade de memorização, concentração e equilíbrio, e ainda trabalhar a parte cardiotorácica, a flexibilidade e a força”.

E convém não esquecer o kizomba. Nesta modalidade é Bárbara Gonçalves, de 31 anos, natural de Valongo, quem levanta o dedo. “No kizomba libertei-me. Ficamos mais à vontade a um nível social.” Bárbara sai da rotina ao praticar esta dança originária de Angola. Treina juntamente com o namorado. “Quando vamos a uma discoteca, ou mesmo em casa, aplicamos os passos que aprendemos nas aulas. Soltamo-nos.”

O tango entra na lista de danças sensuais coreografadas. Oscar Zalazar conduz a escola portuense Esquina de Tango, juntamente com a mulher, o filho e a nora. São argentinos e, por isso, trouxeram o tango mais puro para o Porto. Chegaram em 2000 e passado um ano fundaram a escola, que acolheu já mais de dois mil alunos. Todos os sábados promovem o encontro Milonga. Há mais de 30 anos que Oscar dedica a vida ao tango.

“A proximidade de dois corpos abraçados movendo-se sob uma música tão especial faz com que o tango seja umas das danças mais sensuais do Mundo”, salienta. E defende: “Na Argentina e em outras partes do Mundo, o tango é utilizado para melhorar as condições de vida e de saúde de pessoas com doenças cardíacas e com Alzheimer”. Uma dança que vale a pena: “Viver esta loucura do tango não é fácil, mas é maravilhosa”.