Os rins expelem o que não interessa. E o que acontece quando falham?

Mais de 20 mil portugueses sofrem de Doença Renal Crónica em fase avançada, necessitando de algum tipo de tratamento de diálise

Por ano, cerca de 2 500 portugueses entram em falência renal e cerca de 12 000 estão em tratamento de substituição da função renal, 25% dos quais têm mais de 80 anos. 14 de março é o Dia Mundial do Rim.

É um órgão em forma de feijão, um em cada lado do corpo, com cerca de 11 centímetros de comprimento, cinco de largura e três de espessura. Filtra e expele, através da urina, o que o corpo não precisa. “Os rins são fundamentais para o funcionamento do organismo. Têm basicamente duas funções: a exócrina e a endócrina”, refere à NM Ana Vila Lobos, diretora do serviço de Nefrologia do Centro Hospitalar do Médio Tejo (CHMT), que integra os hospitais distritais de Abrantes, de Tomar e de Torres Novas.

Os rins eliminam os produtos que resultam do metabolismo proteico, incluindo a sobrecarga de ácidos como a ureia, a creatinina, ácido úrico, bem como os fluidos e iões em excesso, como água, sódio, potássio. Desintoxica o corpo, portanto. Além disso, cuida da produção renal, fundamental ao controlo da anemia, e está de olho no controlo da doença óssea renal.

Portugal tem cerca de 800 mil doentes renais. “Saúde Renal para Todos em Qualquer Lugar” é o mote do Dia Mundial do Rim deste ano

Não é muito fácil perceber que os rins não estão a funcionar como deviam. A Doença Renal Crónica (DRC), não tendo outras patologias associadas, manifesta-se de mansinho e a evolução é lenta. “Na maioria dos casos, os sintomas mais relevantes prendem-se com a existência de anemia: fadiga, adinamia, sonolência, anorexia que, normalmente, se torna mais evidente a partir do estádio 4 da DRC”, adianta a médica. “Felizmente, se o doente estiver em seguimento nefrológico, a anemia da doença renal é facilmente corrigida com recurso a medicamentos estimuladores da eritropoiese”, acrescenta.

O diagnóstico acontece normalmente em análises de rotina. Detetam-se valores elevados de ureia e creatinina e, a partir desse momento, os doentes são encaminhados para uma consulta de nefrologia. Quando os sintomas são poucos específicos, Ana Vila Lobos aconselha consulta no médico assistente para que seja feita uma avaliação analítica. Caso contrário, se os sintomas foram exuberantes, é necessário recorrer a uma urgência hospitalar, pois poderá ser necessária diálise urgente.

A gestão da insuficiência renal crónica implica consultas regulares e deslocações frequentes do doente ao hospital, com encargos elevados. Em tempo, comodidade, disponibilidade, custos

É possível viver sem os dois rins nativos desde que se faça diálise ou haja um transplante. “Os doentes renais em diálise raramente são anéfricos (ausência dos dois rins), o que se passa é que os seus rins nativos não funcionam nem em termos de função exócrina, nem endócrina”, explica a especialista. Antes de chegar à fase terminal, ou seja, quando os rins já funcionam muito pouco, o doente tem à disposição o tratamento dos sintomas, nomeadamente, o tratamento da anemia e da doença mineral óssea. Na fase terminal da DRC, o doente pode optar por diálise peritoneal, hemodiálise, tratamento médico conservador. A transplantação renal em doentes mais jovens, com dador renal vivo, é uma possibilidade.

O tratamento domiciliário, a telemonitorização, é uma boa notícia. Em Portugal, cerca de 200 doentes já fazem diálise em casa com recurso à telemonitorização, através de um sistema inovador que lhes permite a ligação remota ao médico que acompanha o tratamento no hospital. Desta forma, o doente pode manter a rotina diária. No nosso país, a telemedicina em diálise peritoneal está atualmente implementada em 15 hospitais, estando previsto o seu alargamento a outras unidades.

“De facto, um tratamento dialítico levado a cabo no domicílio é sempre um ganho em termos de qualidade de vida face a outro que se desenrole em centro de diálise ou hospital. A telemonitorização garante uma vigilância quase permanente do tratamento pelo pessoal de saúde responsável (enfermeira de diálise peritoneal e nefrologista) com adaptações imediatas do mesmo às necessidades clínicas e mesmo sócio familiares do utente, tornando o tratamento mais eficaz em múltiplos aspetos da sua vida”, sustenta a diretora do serviço de Nefrologia do CHMT.