O vício das raspadinhas. Uma doença que não sossega

1718 milhões de euros foi quanto a raspadinha rendeu à SCML em 2019

A lotaria instantânea do momento, a favorita dos portugueses, a mais jogada. É fácil, é barata e está em toda a parte. Quem fica agarrado fala num bicho que come o cérebro, num íman que puxa para o jogo, numa dependência manhosa e desconcertante. Euforia e adrenalina. Dívidas, mentiras, pesadelos. Raspar, raspar, raspar. O gesto miudinho que vira a vida do avesso.

Rosa conta como era e era uma vontade incontrolável de raspar, raspar, raspar. Raspar sem parar. Num só dia, chegou a jogar 300 euros. Encostava-se ao balcão, raspava e suava, suava e raspava. Chegava a casa de rastos, como se tivesse sido atropelada por um camião, o corpo quase a sucumbir. Deitava-se no sofá, exausta, exaurida, por vezes chorava sem conseguir arrancar de dentro de si o que estrebuchava nas entranhas.

“É como beber sem ter sede, aquela euforia de que vai sair prémio e se não sai nesta sai naquela, se não sai naquela sai na outra… e não conseguir parar. É um vício poderoso, manhoso, desconcertante, é mais forte do que nós.” Deixou de pagar a luz, a água, o gás, a renda de casa. Pedia dinheiro emprestado sem explicar o destino, chegou a acumular uma dívida de três mil euros. Perdeu a autoestima, deixou de se olhar ao espelho, vestia o que lhe aparecia à frente. Sair da cama para ir trabalhar passou a ser um sacrifício. “Jogava a um ponto de não ter dinheiro para o café, como é possível?”

Rosa, que não se chama Rosa, já passou dos 60 anos, tem trabalho, mora na zona de Lisboa. Sempre foi autónoma financeiramente, nunca teve de dar satisfações a quem quer que fosse. “Casei com uma pessoa com adição do jogo, álcool, tabaco, lidei com essa situação e, por incrível que pareça, era contra o jogo e quem jogava”, lembra. Sabia dos casinos ilegais, dos jogos da candonga, mas nunca se meteu nessas aventuras.

O ano de 2013 foi doloroso, perdeu quatro pessoas da família, foi-se abaixo. “Foi uma fase muito má.” As raspadinhas apareceram-lhe no caminho, raspou, ganhou 500 euros numa das primeiras jogadas, ficou agarrada. “Foi um passo para acelerar a minha adição, fui jogando, jogando.” Entretanto, mais um prémio de mil euros. “Continuei, entrava numa casa de jogos e jogava tudo e mais alguma coisa. A porcaria da raspadinha acentuou-se na minha adição e foi um descontrolo total na minha cabeça”, confessa.

Em dezembro desse penoso 2013, ganhou dez mil euros numa raspadinha. Depositou metade, compras aqui e ali, algumas prendas de Natal, e o vício do jogo sempre presente. Dois meses depois, os dez mil euros tinham sido gastos, nem chegaram a aquecer no banco. “Derretia o dinheiro todo. Estava a ficar descontrolada, chorava, não queria comer”, adianta. Deixou de pagar contas e raspava como se não houvesse amanhã.

“A determinada altura, pensei que tinha de parar, mas como faço isso?, perguntava-me.” Os gastos nas raspadinhas já iam em milhares de euros. Até que um dia, a filha, com os seus extratos bancários na mão, disse-lhe com todas as letras que tinha um problema e que era preciso resolvê-lo. Rosa nem pestanejou, não contestou, rendeu-se à evidência, procurou ajuda para largar o vício.

“É uma doença de sentimentos e emoções. Também sei que é um problema porque ninguém aceita que é uma doença.” Rosa não joga há quase cinco anos, frequenta um grupo de autoajuda duas vezes por semana, admite que não é fácil. “A raspadinha está exposta em todos os cantos e esquinas.” Não entra em casa de jogos, evita o café perto de casa que tem raspadinhas na montra.

“Cresci numa família humilde com algumas dificuldades. Durante a minha vida nunca tive problemas aditivos, que me tivesse apercebido, até que comecei a jogar e não conseguia parar.” Foram dois anos pesados de um vício que, na sua opinião, “não tem cura”. “Não podemos viver no passado, mas também não podemos viver no presente sem esquecer o passado. É difícil, mas é possível, e eu tenho querer.” Rosa não aponta culpados do vício que lhe revirou a vida. “Não posso culpar ninguém, comecei a jogar casualmente, tinha a adição e não tinha descoberto, ela estava cá e acentuou-se.”

Foto: André Rolo/Global Imagens

António, outro nome fictício, tem mais de 70 anos e o vício colado à pele, joga raspadinhas praticamente todos os dias. Endividou-se, pediu empréstimos, anda a pagar dívidas, vendeu o carro há pouco tempo. Como explicar? “É tão fácil e tão difícil que não sei explicar. É como um íman que apanha um bocado de ferro”, atira como resposta. Um íman que o atrai para a rua e que o trai na vida. Como uma força magnética que vem sabe lá de onde.

“A minha vontade é ir para a rua e já sei que vou fazer asneiras”, admite. É assim, dia após dia, que lida com dois pesos. O peso do dinheiro que fica mais leve na carteira e o peso da consciência cada vez mais intenso. Como resistir? “As raspadinhas estão em todo o lado e de que maneira.”

Os ganhos são pouco significativos, o investimento andará nos milhares de euros, muitas centenas certamente. “Quem é que tem sorte com isto?”. Não faz muito tempo que gastou na ordem das centenas de euros num só dia em raspadinhas. “Já lá estão, mas, ai, quantos já lá estão. Podia ter mais e não tenho e digo mal, digo mal, mas quando vou à rua volto a cair, é como uma rede. Se levo muito fica lá, se levo pouco fica lá na mesma.”

Desde os 21 anos que António frequenta casinos e aposta nos jogos da sorte e do azar. Não esquece o dia em que as raspadinhas chegaram ao mercado, não estava em casa, na zona de Lisboa, passava férias no Algarve. “Logo no primeiro dia, fiquei com o vício no corpo”, conta. Deixou o totoloto, o totobola, ficou fascinado com os cartões coloridos. “Ainda hoje a maneira como fazem a impressão cativa tanto ou mais do que o jogo do casino”, observa.

Um cartão, dois cartões, três cartões, um após outro, e se, por acaso, encontra uma raspadinha perdida num caixote de lixo, como acontece volta e meia, cede à tentação de verificar se haverá por ali um prémio não detetado por quem o comprou, raspou, abandonou. Procurou ajuda, encontrou, sai das reuniões mais aliviado, e depois volta a jogar onde encontrar raspadinhas, na padaria, no café, na casa de jogos, onde calhar. “Só joga quem quer, eu sei, mas isto é como um bichinho no cérebro do pessoal. Quando chega a altura de controlar, já está descontrolado. É um vício, e de que maneira, é uma doença e não há comprimido para a sossegar.”

Revolta, ansiedade, agressividade

Joga todos os dias, sábados e domingos inclusive, porque todos os dias pode sair qualquer coisita, nunca se sabe. Ainda não são nove e meia da manhã e Ana (outro nome fictício), na casa dos 50 anos, já raspou 80 euros de raspadinhas numa casa de jogos na Baixa do Porto. Quarenta de uma vez, outro tanto de outra. “É um vício, é um vício, se não comprar uma raspadinha não me sinto bem”, diz. Quando vai comprar pão ao pé de casa, quando vai beber café, quando vai ao Porto. “É aquela coisa, aquela coisa, e se uma pessoa não joga não sai mesmo, não é? Às vezes dá, às vezes tem.”

No ano passado, nas férias, numa ilha espanhola, a vontade não lhe dava sossego. “Parecia que não andava bem, passei num café, comprei uma raspadinha de um euro e saíram-me 20 euros. Não gastei, deu para o passeio de barco”, recorda. Ana joga há quatro anos, nem sabe bem como tudo começou. Começou e pronto. “Estou a ficar muito viciada, não dá para passar por esta rua, não entrar e não comprar.”

Trabalha por conta própria, não tem dívidas de jogo. Presume que, neste ano, contas feitas por alto, já tenha gasto mais de dois mil euros em raspadinhas. “Mas não tiro à boca para jogar”, assegura. De quando em quando, as raspadelas dão prémio, não muitas vezes, não tantas quanto queria. Os cartões voltam à máquina, menos de dez euros ganhos são habitualmente reinvestidos no jogo. Nessa manhã, o prémio foi de 20 euros. Guardou-os na carteira e com um pé fora da casa de jogos lá disse: “Vou fazer umas compras, se calhar vou comprar umas calças”.

Manuel está quase a chegar aos 70. Tem um longo historial de jogo, mais de 40 anos. Quando começou a frequentar as salas de bingos e os casinos, era uma loucura. Ia de táxi para chegar mais depressa e corria pela salas para ser dos primeiros a sentar-se, a jogar. “Quando casei já estava casado com o jogo. Às vezes, pergunto-me como me deixei iludir, o vício do jogo é uma doença que não tem cura”, desabafa.

Foto: André Rolo/Global Imagens

Faltava dinheiro em casa, pedia a amigos e familiares sem dizer para o que era, mentiras atrás de mentiras, empréstimos ao banco. Um dia, as raspadinhas atravessaram-se no seu caminho. Hoje, contas feitas, e uma dívida de quase cinco mil euros às costas, acha que gastou meio milhão de euros no jogo. Jogador compulsivo, jogava tudo o que ganhava.

No início, ganhou 500 euros numa raspadinha. “Arrasei os 500 euros num instante, comecei a jogar compulsivamente, um descontrolo total, empréstimos ao banco, estava no fundo do poço, não podia ter dinheiro.”

Raspadinha atrás de raspadinha, raspava 20 e se nada saía, continuava, se saía, continuava, sempre assim. “Aquela adrenalina de raspar e ver se havia ou não prémio, ficar com aquela agonia que não saiu, e jogar outra vez e não conseguir parar.”

“As raspadinhas podem levar ao fundo do poço. Não se consegue parar, é como as outras adições, é como o álcool.” Manuel sentiu a vida a fugir-lhe dos pés, a desarrumar-se, a cabeça a rebentar, os pesadelos, o não querer acordar. A revolta, a ansiedade, a agressividade, os gritos em casa. “Só queria desaparecer, só pedia para não acordar mais, as dívidas. O jogo era um monstro, era o que era, um monstro.” O vício entranhado, o desassossego permanente.

Manuel começou a sentir-se angustiado, procurou ajuda especializada, anda em consultas, pediu a autoexclusão dos casinos há coisa de dois anos. “Não queria aceitar que era uma doença, mas tive de aceitar, tive de aceitar.” Anda afastado das raspadinhas há dois anos e meio. Admite que é preciso muita força de vontade, reconhece também que o vício não se vai embora, agora tem ferramentas para o controlar. “Nunca posso dizer que não vou jogar amanhã. Vivo um dia de cada vez. Hoje não joguei, amanhã não sei.”

Um mundo colorido de cartões

Em março de 2010, a lotaria instantânea assumiu uma nova identidade com a marca comercial raspadinha. Hoje, sozinha, a raspadinha representa mais de metade dos jogos da Santa Casa, 51% do total das receitas no ano passado, 1,594 mil milhões de euros arrecadados numa curva que tem subido nos últimos anos – 1,359 mil milhões de euros em 2016 e 1,487 mil milhões em 2017.

Em segundo lugar, a uma distância significativa, está o Euromilhões e o M1lhão, com 805 milhões de euros em 2018. A lotaria clássica e a lotaria popular ficam a anos-luz com, respetivamente, 46 milhões de euros e 23 milhões de euros, angariados no ano passado.

“É o jogo que está mais em alta. É um jogo atrativo e viciante”, confirma José Fernandes, que vende raspadinhas desde que elas surgiram numa das lojas de jogos Campião, na Baixa do Porto. “É um jogo com grande impacto em termos de gasto”, acrescenta.

A Casa da Sorte da Rua Sampaio Bruno, no Porto, funciona das oito da manhã às sete da tarde. José Neves, chefe da secção da loja, vê cada vez mais gente a jogar raspadinhas à medida que os anos passam. “Há muitos jogadores, é um jogo instantâneo, não se está à espera para receber”, salienta. A Santa Casa da Misericórdia dá indicações aos vendedores de raspadinhas para que estejam atentos a indícios de vício. De olho nos jogadores para que possam alertar em caso de jogo compulsivo. O que não é fácil.

Não há sorteio, não há escrutínio, os prémios são atribuídos de forma imediata. Basta raspar e já está. As raspadinhas estão em todo o lado, em qualquer parte, e são um mundo colorido de cartões garridos e de símbolos escondidos – montanhas, cão, mochila, golfinho, vulcão, ilha, onda, estrela, arco-íris, ferradura, pata, e muitos outros. Há para todos os gostos. Raspadinha do amor, pé-de-meia, mega pé-de-meia, mini pé-de-meia, VIP, tesouro pirata, baú de pérolas, aranha da sorte, euros de verão, tripla sorte. Dois euros podem dar 20 mil euros, na VIP é possível ganhar até 100 mil euros. O mega pé-de-meia promete mais de três mil euros por mês durante 14 anos, dois mil durante sete anos, ou mil durante três anos.

Custam um, dois, três, cinco e dez euros. Têm o nome do jogo, preço, área para raspar e instruções na frente do cartão. No verso, o número, emissão, plano de prémios, extrato do regulamento do jogo, a probabilidade média de ser um dos felizes contemplados. “A probabilidade de ganhar um qualquer prémio é de 1 em 4,40 bilhetes face à totalidade dos bilhetes emitidos”, lê-se no verso da raspadinha euros de verão.

Pedro Hubert, psicólogo e coordenador do Instituto de Apoio ao Jogador, tem vindo a defender o jogo responsável, mais e melhor prevenção, mais cuidado com a publicidade e com a legislação, e o sistema de autoexclusão na raspadinha. O vício do jogo é um problema comportamental que altera de forma significativa os comportamentos. Trocam-se prioridades, há uma grande dificuldade em parar.

O importante, em seu entender, é perceber para que é que o jogo existe. “Dar uma consciência às pessoas de que o jogo é algo recreativo e não algo para ganhar dinheiro”, assinala, acrescentando que há “uma tendência” para “diabolizar o problema do jogo”. Mas o foco não deve estar aí e a sensibilização sobre estas questões deve incidir nas famílias, nas escolas, nos locais de jogo, na sociedade como um todo. “É importante trabalhar padrões de comportamento, o que dispara a vontade de jogar, e os mecanismos que existem à disposição. Há uma cultura, uma certa ideia de que o jogo dá muito dinheiro, mas as probabilidades não são para ganhar”, sublinha.

Foto: André Rolo/Global Imagens

Não se sabe quantos viciados em raspadinhas existem em concreto em Portugal e a procura de ajuda é ainda muito ténue, recente, envergonhada até. De qualquer forma, os telefonemas para a Linha de Apoio da Santa Casa, operada pelo Instituto de Apoio ao Jogador, estão a aumentar. Em 2018, registaram-se 262 chamadas que resultaram em 135 contactos para apoio psicológico. Em 2017, contaram-se 227 chamadas e 117 contactos alvo de ajuda psicológica, mais do que os 189 telefonemas e os 76 apoios psicológicos do ano anterior. Alguns serão relativos ao jogo da raspadinha.

O inquérito nacional ao consumo de substâncias psicoativas na população, dos 15 aos 74 anos, relativo aos anos de 2016 e 2017, revela que 48,1% dos portugueses costumam jogar a dinheiro – 51,1% são homens e a faixa etária com maior prevalência situa-se entre os 45 e os 54 anos, seguida da franja dos 35 aos 44 anos e dos 55 aos 64. Os dados são do SICAD – Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências.

Os Jogadores Anónimos têm dois grupos de autoajuda, um funciona no Centro Comunitário de Carcavelos, outro no Centro Social e Paroquial do Campo Grande, em Lisboa. Todos garantem o anonimato nas reuniões, há partilha de histórias, mas não há diálogos, não há perguntas. O princípio é que “os jogadores compulsivos são pessoas realmente doentes, que podem recuperar se derem o melhor de si.” Seguem um programa de recuperação de 12 passos construído por dois americanos viciados no álcool e no jogo. Admite-se a impotência perante o jogo, que o vício torna as vidas ingovernáveis, e tenta-se lutar contra a maré.

Depressão, solidão, desespero

A dependência do jogo é uma “dependência invisível” e a adição é uma doença progressiva. Pode começar de forma recreativa e evoluir para o vício. “As causas que levam à adição ao jogo são diversas, é uma patologia multifatorial. Desde fatores genéticos, educacionais e até determinados traços da personalidade podem levar ao jogo patológico”, considera o psiquiatra Rui Correia, um dos fundadores da Associação Portuguesa de Medicina da Adição. Traços de dependência e a obsessão ajudam a desenhar o perfil psicológico de quem joga compulsivamente.

O jogo tem o poder de dominar pensamentos e atitudes. “O jogo dito saudável aparece de forma ocasional e tem caráter recreativo. O jogo patológico torna-se uma obsessão e uma prioridade para a vida do adito. Muitas vezes, descura o trabalho, a família e os amigos, mesmo causando danos graves, nomeadamente a nível financeiro”, sublinha. Há sintomas de ansiedade e de depressão e sofrimento. “Os doentes não admitem o problema devido a mecanismos psicológicos que são a negação, a minimização e a racionalização”, define Rui Correia.

A forma como se começa e como se acaba é, portanto, uma variável com múltiplas equações: personalidade, contexto sociocultural, ambiente familiar, herança genética, rede de amigos, entre outras. O jogo pode tornar-se um escape, uma fuga à realidade, uma fonte de prazer imediato, uma forma de fugir a um sofrimento psicológico. “A maior parte das vezes, o ato de jogar é escondido das pessoas mais próximas, logo vai provocando um afastamento familiar, alimentando o seu isolamento para poder ‘consumir’, iniciando-se um ciclo vicioso. Quanto mais se desconecta da ligação aos outros, mais se liga ao objeto aditivo e mais se desconecta de si e da sua própria essência e humanidade”, adianta a psicóloga clínica Joana Fonseca, do Centro de Tratamento Creta, em Lisboa.

E a dor de quem joga aumenta. “A frustração sentida é cada vez maior porque vai perdendo cada vez mais dinheiro, na ilusão de poder sempre ganhar mais. Mas este ganho nunca será suficiente. Consequentemente, instala-se de forma progressiva a depressão, levando ao desespero e à solidão.”

A vida fica virada de pernas para o ar, desgoverna-se, perdem-se amigos e familiares, os princípios e valores esvaziam-se de sentido, a parte financeira não se endireita. Os sintomas físicos não são visíveis a olho nu e gerir sentimentos e emoções torna-se uma missão quase impossível para um jogador compulsivo. “A família pode começar a notar e a questionar a irritação do familiar, os baixos níveis de tolerância à frustração quando confrontado com a realidade.”

É como uma pescadinha de rabo na boca. Jogar para fugir à realidade, para aliviar sofrimento. “A depressão, o isolamento e a solidão são, muitas vezes, a consequência e não a causa da dependência do jogo ou de qualquer outra adição, não querendo com isto dizer que a nível psicopatológico não existam já essas fragilidades. De facto, qualquer comportamento aditivo vai agravar o quadro psicopatológico já existente”, conclui Joana Fonseca.

O vício do jogo não desaparece com um estalar de dedos. A obsessão é um bicho difícil de dominar, traz ansiedade, inquietação, alterações de humor, cansaço, exaustão. É um ciclo vicioso que se repete. Raspar, raspar, raspar. Até que a alma doa. Até tentar tirar o vício do corpo.