O laser está cada vez mais unissexo

Pormenor do processo com o laser activo. (Foto: Fernando Fontes/Global Imagens)

Na Grécia Antiga fazia-se para dar uma espécie de expressão corpórea à noção de civilização. Os sacerdotes do Antigo Egito procuravam-na como forma de purificação. E até os homens mais influentes da Roma Antiga adotavam esta prática. Mas durante incontáveis séculos a depilação permaneceu como apanágio quase exclusivo do sexo feminino. O panorama haveria de mudar com o tempo, ainda assim. Hoje, são muitos os homens que querem ver-se livres dos pelos. E uma parte considerável opta por soluções que assegurem efeitos de longo prazo.

“Temos tido maior procura, ano após ano. Diria que de 2010 para a frente houve um aumento significativo. Acima de tudo por modelos, atletas de alta competição e desportistas no geral, mas também há quem recorra ao laser simplesmente por razões estéticas. Ou mesmo por indicação médica”, realça Andreia Mendes, diretora técnica das clínicas D’epiderme.

Foi o caso de Nuno Rodrigues, cabeleireiro gaiense de 43 anos. Depois de vários pelos encravados no cóccix, que inclusive o obrigaram a ser submetido a cirurgia por duas vezes, optou por recorrer à depilação a laser. Como gostou do resultado (“além de eficaz, é muito mais higiénico, sobretudo para mim, que frequento o ginásio e transpiro muito”) resolveu alargar a depilação a laser a outras zonas. Primeiro as pernas, depois as axilas. “De resto não tenho grandes pelos. Mas costumo dizer que se fosse mulher não queria outra coisa”, diz, em jeito de brincadeira.

A nível global, é a partir dos anos 1980 que a depilação do sexo masculino “começa a banalizar-se”, explica António Carvalho, investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Porquê? O sociólogo cita a autora Sarah Hildebrandt, que defendia existirem dois fatores responsáveis por esta transformação inicial do padrão estético das masculinidades. “A obsessão com o fitness e o culturismo e a disseminação de representações não-binárias dos corpos masculinos [com o surgimento de identidades de género que não sejam integral e exclusivamente homem ou mulher].”

António Carvalho refere ainda a importância do programa americano “Queer Eye for the Straight Guy”, que se estreou em 2003 e depressa se fez famoso. “[O programa] popularizou a noção de ‘manscaping’, a junção de homem e ‘landscape’ [paisagem], remetendo para a construção de uma paisagem masculina ideal, que habitualmente exigia a depilação total do corpo para aprimorar a estética masculina.”

O investigador entende ainda que a massificação da depilação no sexo masculino se enquadra “numa tendência mais geral, associada à construção das masculinidades – e subjetividades – contemporâneas, registando-se uma crescente preocupação com o cuidado de si, o exercício, a saúde, a autorregulação e o investimento estético”.

Uma mão-cheia de métodos

Paralelamente, a técnica foi evoluindo, refinando-se. Hoje, quem procura uma solução de depilação mais definitiva (os especialistas evitam o termo definitivo visto que, mesmo depois de várias sessões, qualquer tipo de depilação deste género obriga a uma espécie de manutenção anual) tem um leque de soluções à escolha. Dentro da fotodepilação, por exemplo, pode optar-se pelo sistema de luz pulsada ou pelo laser. E dentro do laser, há o alexandrite, o neodimio-Yag, o rubi e o diodo, entre outros.

Importante, alerta a dermatologista Leonor Girão, é que o processo seja sempre supervisionado por um médico, que possa definir os parâmetros a serem utilizados em cada caso. “Todos os métodos são seguros desde que os equipamentos sejam utilizados corretamente. Se não forem, naturalmente há riscos. Estamos a falar de uma fonte de energia, que pode provocar queimaduras”, defende. O problema, sublinha, é que a supervisão na área é diminuta.

Homens preocupam-se essencialmente em depilar ombros, costas e axilas, mas também há quem o faça noutras zonas, dos braços aos órgãos genitais

“Hoje, qualquer pessoa que se diga esteticista pode comprar uma máquina, ter uma formação de meia hora para aprender a mexer nos botões e fazer depilação a laser. Há aqui um limbo. Penso que deveria haver uma legislação mais apertada”, advoga a dermatologista, que já recebeu no consultório uns quantos pacientes com sequelas derivadas de depilações mal feitas. “Atendendo ao número de pessoas que faz este tipo de depilação a percentagem não será assim tão alta, mas já me chegaram vários doentes com queimaduras que deixam cicatrizes ou pigmentações.”

Costas, ombros, cara, genitais

E afinal, quais são as zonas que os homens mais depilam? Andreia Mendes, das clínicas D’epiderme – onde o método utilizado é o laser alexandrite e os tratamentos são supervisionados por uma equipa que inclui uma dermatologista e uma médica de medicina estética -, esclarece. “Para grande parte dos homens que aqui vêm, a prioridade é eliminar os pelos nas costas, nos ombros e nas axilas.” Segue-se a arcada zigomática – ou seja, as maçãs do rosto para definição da linha da barba -, a zona do pescoço e da nuca, bem como a área do tórax e do abdómen. Mas também há quem faça depilação a laser nos órgãos genitais, nas pernas, nos braços e até no rosto, para eliminar a barba.

Andreia Mendes partilha ainda os principais medos dos homens que optam por este tipo de depilação. Por um lado a questão da dor – a diretora técnica realça que o laser alexandrite tem associado um sistema de refrigeração “que causa alguma analgesia na área a tratar”. Por outro, a possibilidade de a depilação nas zonas genitais provocar esterilidade. “É uma dúvida pertinente, mas não passa disso mesmo. O laser alexandrite não provoca esterilidade, podendo ser aplicado na bolsa escrotal, na região peniana e na zona púbica.”