Nascido para brilhar

Texto de Ana João Mamede

O sutiã tem muita história para contar. Os primeiros protótipos surgiram há dois mil anos, na ilha de Creta, na Grécia. As gregas começaram por usar faixas de pano à volta do peito, para o tapar e moldar. Mas a tendência acabou por desaparecer e só no fim do século XVI a ideia renasceu em forma de espartilho, proporcionando uma silhueta de ampulheta, que destacava os seios através de cordões tão apertados que, por vezes, as mulheres acabavam por desmaiar.

Mais tarde, em 1889, Herminie Cadolle, tentando criar um acessório mais confortável e prático, cortou um espartilho em dois. Batizou a parte superior de “soutien-gorge”, que, com o avançar do tempo, se tornou apenas “soutien”. No entanto, a francesa nunca registou a ideia e, em 1914, a americana Mary Phelps Jacob, cansada do desconforto provocado pelo espartilho e desejosa de usar um vestido decotado, uniu dois lenços de seda com fitas cor-de-rosa e um cordão. A ideia foi um sucesso entre as amigas e Mary decidiu patentear a peça, tornando-se a mãe oficial do sutiã.

O início da emancipação feminina sepultou o espartilho. Estávamos na década de 1920. As mulheres precisavam de roupas práticas para trabalhar nas fábricas, ao mesmo tempo que, na vida social, os sutiãs deviam reduzir a cintura e acentuar as curvas femininas, surgindo, desde logo, a necessidade de criar diversos tamanhos.

Os anos foram passando e a moda ditava uma silhueta cada vez mais valorizada. Surgem, então, nos anos 1930 e 1940, os sutiãs com enchimento e aros de metal. É inventado o náilon, a primeira fibra têxtil sintética, e os modelos ganham elasticidade e resistência, trilhando definitivamente o caminho para a produção em massa. Nas páginas de revistas e jornais, as estrelas de Hollywood prescindem do vestuário exterior, exibem as curvas ao mundo e a lingerie torna-se sinónimo de sensualidade.

Mas as mulheres exigem ser muito mais do que símbolos sexuais. Lutam pela igualdade de direitos, salários e decisão. E a disputa por essa emancipação levou a que, em 1968, cerca de 400 mulheres ativistas do movimento “Women’s Liberation Movement” metessem lenha na fogueira das reivindicações e queimassem os próprios sutiãs. Uma forma de protesto contra a eleição da “Miss America”, em Atlantic City, nos EUA. O episódio transformou a peça num símbolo de manifestação feminina.

Nos anos 1970, o movimento hippie e o feminismo travam uma guerra contra o sutiã. Ser livre e não ter restrições era lei na época. E as mulheres deixaram de o usar por o considerarem um símbolo de opressão. No romper dos anos 1990, Madonna utilizou o emblemático sutiã cónico e transformou a roupa interior num uniforme performativo.

Com os anos, sofreu novas mudanças. Há para diversas ocasiões, com inúmeros formatos, cores e tecidos. É produzido em massa e usado por mulheres de todo o mundo. Tornou-se símbolo de sensualidade e de sexualidade. Deixou de ser apenas uma peça íntima para se tornar muito mais do que um simples acessório. É protagonista em desfiles de moda. Nasceu mesmo para brilhar.