
Texto de Alexandra Tavares-teles
Jorge Fonseca. Ainda que desconhecido da maioria dos portugueses até há uma semana, ninguém ligado à modalidade ignorava o talento do judoca nascido num país de coral – São Tomé e Príncipe – há 26 anos, um dos raros portugueses campeões do Mundo – o único, no judo. De facto, desde 2013, dera mostra do quanto valia ao conquistar, primeiro, o título caseiro de sub-23 e, logo depois, facto nacional inédito, o de campeão da Europa no mesmo escalão.
O que tem faltado ao atleta, porém, é um caminho suave. Vida dura e difícil, de tal maneira que os pares reconhecem nele, a par com o talento, a determinação sem medida. Garra que levou de vencida o cancro, duro, doloroso, quantas vezes fatal, tinha 23 anos e um filho de seis, já, baluarte nas horas difíceis: cansaço, medo, enjoo permanente, que o deixavam com a “cara trancada”. Só a criança valia o sorriso e a esperança. E o judo, que nunca abandonou.
Na primeira competição após a doença, apresentou-se na Golden League 2015, na Áustria, como se nada fora, merecendo definitivamente o reconhecimento dos pares.
Chegado a Portugal com 11 anos, como muitos meninos vindos de África agarrou-se ao desporto. À bola. Nas ruelas pobres da Damaia, o miúdo gordinho percebeu que o futebol não era para ele. Paciência – através da janela da escola de artes marciais da freguesia, por onde costumava espreitar, descobriria o judo, Pedro Soares, o treinador que ainda hoje o acompanha, e um rumo. Pediu à mãe que o deixasse inscrever. Ao fim das primeiras aulas, foi começando a gostar. A escola e o sonho de ser polícia ficariam adiados. Talvez um dia volte a pensar no assunto, tem dito.
As horas de treino foram transformando o rapazinho gordinho no atleta de elite, combinação certa de natureza indomada, potência, criatividade e perfeição técnica, que é hoje. E que estará nos Jogos Olímpicos de Tóquio em 2020 – de novo na pátria da modalidade, país onde já foi detido duas vezes, uma por atravessar a rua fora da passadeira, a outra por correr na rua de tronco nu -, determinado a vencer. “Tenho de acreditar que vou conseguir.”
A síndrome dos grandes palcos, pesadelo de atletas de elite, não está na sua natureza. Quem o conhece garante que Jorge Fonseca não teme a pressão. Pelo contrário, que a usa em seu favor. Que quanto melhor e difícil é o adversário mais brilha.
Os amigos relevam a simpatia. A capacidade de quebrar o gelo, de fazer amizade em todos os continentes. A vivacidade.
Jorge Fonseca, King ou Black Pearl, vive alegremente. E sabe dançar.
Cargo: Judoca do Sporting Clube de Portugal
Nascimento: 30/10/1992 (26 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (São Tomé e Príncipe)