Texto de Sara Oliveira
Aos quatro anos, já “adorava desenhar roupa”, mas é a ensinar que Fernanda Gonçalves, 65 anos, tem trilhado caminho na moda. Da avó paterna, que era modista, herdou a paixão pela costura, pelo detalhe. Cedo começou a costurar o próprio vestuário – “sempre detestei andar igual aos outros” – e chegou a experimentar o design, só que a vida trocou-lhe as voltas.
Em 1971, por querer tirar um curso superior, entrou para Arquitetura. Fez dois anos incompletos e, ainda antes do 25 de Abril, foi para Londres, onde tinha família. Na capital britânica, tentou entrar em Arquitetura, mas as propinas eram elevadas e seguiu para a Bélgica, “onde era mais barato, pois queria pagar os estudos”, recorda.
Viveu uns tempos em Lovaina, nos arredores de Bruxelas, mas as saudades trouxeram-na de volta no Natal de 1976, quando “as Artes Plásticas já eram curso superior em Portugal”. Ficou, mas sempre com vontade de fazer “muitas coisas ao mesmo tempo”. “Fiz línguas, em institutos, e acumulei Artes Gráficas até ao fim do bacharelato”, relata, recuando até ao momento em que, há precisamente 40 anos, foi convidada para dar aulas de História da Moda na Academia de Moda, no Porto.
Seguiu-se a Cooperativa Árvore, também na Invicta, onde conheceu Helena de Matos, que, em 1983, a levou para o Citex (agora Modatex), na altura em que foi estruturado o curso de Design de Moda e onde Fernanda Gonçalves continua a dar formação, a par das aulas de Educação Visual no ensino público.
Pelas mãos desta professora e artista plástica gaiense já passaram muitos alunos, alguns deles agora designers bem conhecidos, como Luís Buchinho, Nuno Baltazar, Katty Xiomara ou até mesmo Luís Onofre (neste caso, no Centro de Formação Profissional da Indústria de Calçado, em São João da Madeira).
Os tempos mudaram e Fernanda Gonçalves nota que, agora, nem todos os que saem dos cursos de moda sabem descrever as coleções que apresentam, dificultando, assim, a forma como o público as interpreta. “As pessoas têm de saber falar, têm de ser coerentes”, sublinha, lembrando que “a vida real é diferente da teoria” e que, por isso, é cada vez mais difícil vingar na passarela.
No início da carreira, Fernanda ainda pensou ser estilista. Chegou, inclusivamente, a criar e a apresentar “com sucesso” uma coleção, mas percebeu as muitas dificuldades que teria para conseguir vingar em nome próprio. Atendendo a que trabalhar como criadora de uma fábrica não ia ao encontro dos seus desejos – assume-se “um bocado antimoda”, pois gosta de “ser livre” -, acabou por se manter nesse mundo, mas longe das passarelas, ajudando, nas salas de aula, a construir o futuro da moda.