Economia circular. Do fóssil ao renovável. Da exclusão à partilha

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Texto de Sara Dias Oliveira

Tudo se recicla, tudo se aproveita. Do desperdício à valorização. Da reciclagem à reutilização. Do global ao local. Da teoria à ação. E assim se constrói a economia circular que promove o uso eficiente das matérias-primas e a produtividade dos recursos, bem como processos e modelos de negócio assentes na reutilização, a reciclagem e recuperação de materiais. A bem do ambiente e da economia. A Circular Economy Portugal existe para tudo isso. Tem projetos, recorre a estratégias de desperdício zero, incentiva a ação colaborativa e não esquece a inovação social.

“A economia circular é um sistema regenerativo inspirado na natureza”, refere à NM Lindsey Wuisan, fundadora da Circular Economy Portugal, organização sem fins lucrativos. É como um círculo que se fecha e em que os produtos são mantidos em uso o maior tempo possível. “Há modelos de negócios inovadores (sistemas de produtos e serviços) que desempenham um papel importante para desmaterializar a nossa economia. Desta forma, menos recursos naturais são utilizados, desperdícios e poluição são evitados e mais valor é criado para a sociedade”, afirma.

Lutar por uma sociedade sem desperdícios é uma batalha que se faz de várias formas. A Circular Economy Portugal tem vários projetos. O Repair Café, que se concretiza em eventos públicos e gratuitos para reparar peças e objetos estragados – como pequenos eletrodomésticos, brinquedos, roupas, peças de mobiliário -, com a ajuda de voluntários experientes. A compostagem comunitária numa escala local e um bazar circular para dar novas vidas a materiais descartados por museus, escolas, empresas, autarquias, artistas. A reciclagem artesanal de resíduos de plásticos em novos produtos e a costura para dar uma segunda oportunidade a roupa sem uso.

“Através dos nossos projetos, pretendemos implementar princípios circulares, mas também envolver as comunidades locais e estimular a inovação social”, explica Lindsey Wuisan

O bem-estar da Terra merece atenção máxima e a sociedade tem de perceber que o passado e o presente interferem no futuro. Para Lindsey Wuisan, o respeito pelo Ambiente é um conceito delicado que começa na educação ambiental, mas que também precisa de estímulos positivos do meio social e institucional. “Pessoas de todas as camadas da sociedade devem entender que o desenvolvimento económico e o bem-estar humano não precisam de depender do crescimento contínuo – vender mais, vender mais rápido – e da extração de recursos naturais. Mas precisamos preservar o nosso capital natural para as futuras gerações”, avisa a holandesa, mestre em Ciências Ambientais, que trabalhou como legisladora no Ministério do Ambiente da Holanda, e que há dias participou na conferência internacional sobre Economia Circular, na Gulbenkian, organizada pela Sociedade Ponto Verde.

A fundadora da Circular Economy Portugal, que trocou a Holanda pelo nosso país em 2016, refere que ambições vagas não ajudam, incentivos fiscais sim, nomeadamente taxas mais suaves por serviços ecológicos e mais impostos no consumo de recursos naturais. Um controlo mais rigoroso sobre a poluição ambiental seria bem-vindo.

Há ainda a mudança de comportamentos. No mundo da reciclagem e do bem-estar ambiental, será que os jovens são mais sensíveis, que os adultos assim-assim, e os idosos não percebem nada disso? Este retrato faz algum sentido? “Toda a mudança comportamental é difícil de alcançar porque depende de valores pessoais, normas sociais e contexto institucional. Na verdade, é melhor começar o mais cedo possível, enquanto as crianças ainda estão recetivas. A nova geração parece estar mais atenta às questões ambientais do que os pais, que tendem a ficar presos ao que é mais habitual, embora haja, claro, muitas exceções”, responde.

“A geração mais velha, com 65 anos ou mais, pode não estar familiarizada com o conceito de economia circular, mas pode exibir um comportamento mais sustentável do que outras. Por exemplo, quando se trata da prevenção de desperdício de alimentos e reutilização de peças como roupas ou móveis. Em geral, o consumo excessivo – não apenas em termos de materialismo, mas também o consumo de energia e o consumo de carne – ocorre em todas as gerações”, sublinha.

“A população portuguesa precisa de um maior impulso para adotar estilos de vida sustentáveis”, refere a fundadora da Circular Economy Portugal

Em 2017, foi dado um passo importante com o plano de ação para uma economia circular em Portugal e entretanto o país passou a fazer parte do Roteiro para um Carbono Neutro 2050. “No entanto, a produtividade dos recursos e as taxas de reciclagem ainda são bastante baixas. A economia depende muito da extração e importação de recursos naturais (incluindo a água), enquanto os resíduos vão sendo produzidos em excesso, sem serem reutilizados, especialmente na área de construção”, refere.

Há muito por fazer. Segundo Lindsey Wuisan, na área das energias renováveis e na inovação sustentável em vários setores, Portugal ainda não está a fazer uso suficiente das oportunidades. “Mais importante ainda – muito pouco é feito para a regeneração ecológica, mesmo que o reflorestamento (e o fortalecimento da biodiversidade) seja essencial para combater a desertificação”. “Em suma, ainda há muito a ser feito para a transição de uma economia linear para uma economia circular, o que provavelmente levará gerações”, conclui.