Texto de Domingos Andrade, Gina Pereira e Inês Cardoso
Rui Rio tem boa memória para datas. Da janela do seu gabinete na sede do PSD no Porto vê-se o Colégio Alemão, onde entrou a 1 de outubro de 1961, quando tinha quatro anos. Esteve dez anos em Lisboa, como deputado. Regressou à Invicta há 17, para conquistar a Câmara.
Líder do maior partido de oposição, cargo para o qual foi eleito há exatamente um ano, assegura que o ruído das guerras internas não o tem desviado do objetivo de enfraquecer o Governo. O PSD pode ganhar as legislativas? “Ai pode, pode.” Resta saber se o partido deixa.
Está arrependido de se ter candidatado a presidente do PSD?
Não, arrependido não estou. Agora se perguntar: contava com dificuldades? Sim, muitas. Contava com tanta resistência interna? Não. Contava com alguma, mas não contava com tanta. Se me candidato a líder do partido, depois a primeiro-ministro, para mudar um sistema contra o qual de certa forma estou, não vou recuar perante as críticas do próprio sistema que eu quero mudar. É lógico que o sistema resista quando se pretende mudar, como é evidente.
Mas ainda acha que os que o criticam dentro do PSD deviam sair do partido ou estar calados?
Não disse isso nunca. Aquilo que eu disse foi: que quem discorda estruturalmente do partido, obviamente que deve sair. Há atualmente na sociedade portuguesa notoriamente e um pouco em crescendo um espaço à direita do PSD com uma visão muito liberal, não social-democrata. Quando é assim, já estamos num patamar ideológico.
Quando tomou posse, disse que a sua principal missão era fazer oposição ao Governo, mas tem sobretudo andado a gerir a sua própria oposição interna. Na semana passada, Teresa Morais, deputada e ex-vice-presidente, afirmou que o PSD tem um presidente que não é um líder do partido. Tem capacidade para liderar a Oposição?
Primeiro, o meu principal objetivo, por muito que custe, é o país. Eu candidatei-me a líder do PSD pelo país, porque se não fosse pelo país não estava aqui a fazer nada. Dentro daquilo que é ser líder da oposição, faz parte naturalmente apontar os erros do Governo e aquilo que entendemos que devia ser feito melhor. Se depois há ruído que abafa um bocado essa minha atividade, isso não depende de mim. Mas não tenho perdido tempo em lutas internas. Tenho feito sempre a comunicação para fora.
A preocupação de um líder também deve ser unir o partido e pô-lo a trabalhar para um objetivo comum. Está a conseguir?
Não estamos no tempo do Estado Novo, não estamos em nenhuma ditadura, em que os líderes dos partidos tenham um chicote com que batem nas pessoas quando elas se portam mal. Vivemos numa democracia. A liberdade também acarreta a responsabilidade. Essa responsabilidade é muito mais do lado de quem perturba do que de quem lidera.
Está a responsabilizar os seus críticos por um eventual mau resultado do PSD?
Não vou alimentar as questões internas porque não me compete. Bem pelo contrário: compete-me fazer oposição, compete-me mostrar um caminho para Portugal, não me compete andar a responder a essas coisas.
Como é que pensa construir a alternativa ao Governo? Que ideias pensa pôr em cima da mesa? É que os documentos estratégicos que o PSD tem estado a produzir não motivam as pessoas, incluindo o seu próprio partido.
Desde 18 de fevereiro, quando tomei posse, tivemos de montar uma série de coisas. A criação do Conselho Estratégico Nacional (CEN) dá resposta a isso. Tem 16 grupos temáticos que estão a funcionar à escala nacional e muitos também à escala distrital. Daí vão saindo ideias para o PSD ir aprimorando, até fazer o seu programa eleitoral. São documentos que visam a governação do país, não visam produzir notícias.
Mas a verdade é que os documentos são muitas vezes mal recebidos pela sua bancada parlamentar, que se queixa de ser afastada do processo e de não conhecer as propostas.
O CEN é tão aberto que até permite a participação de independentes, naturalmente que se revejam estruturalmente no PSD. Os deputados, como os dirigentes nacionais e distritais, todos são livres de participar. Só não participa quem não quer.
Os deputados dizem que se reúne pouco com eles, que não vai ao Parlamento…
O que é que são “os deputados”? Em português, a partir de um, dois já são “os deputados”. Os deputados são 89… e a articulação tem sido feita, como é normal, com a direção da bancada. No princípio, houve alguma dificuldade nessa articulação. As pessoas não se conheciam bem, ainda não estávamos devidamente articulados. Mas há já muito tempo, pelo menos desde o verão, que a articulação está a funcionar.
As dificuldades internas tiraram-lhe alguma atenção do país?
Eu estou focado no país, mas obviamente que havendo ruído… Não vou ser hipócrita e dizer “nem ouço, nem leio, nem sei”. Preferia que a estrutura dirigente estivesse toda alinhada a trabalhar e sem provocar ruído, claro que preferia. Era muito mais simples. Esse ruído naturalmente só facilita a vida ao PS e ao Governo.
Que trunfos é que tem para se aproximar do PS?
São trunfos a dois níveis: um serão as nossas propostas; outro são os erros do Governo. E aquilo que vejo como o principal trunfo da Oposição é conseguir fazer ver aos portugueses que a governação do PS, apoiada pelo BE e pelo PCP, cuidou de tentar encantar os portugueses no presente e não cuidou minimamente do futuro de Portugal. Se a ambição dos portugueses é ter cada vez mais um salário melhor, não vão conseguir de certeza com esta governação. É preciso ter uma governação que olhe para o futuro, que aposte na competitividade das empresas. O que o Governo fez foi ver as folgas que tinha e distribuir em função das reivindicações do BE, do PCP e do PS. Devo ser justo: distribuiu tudo o que tinha e pouco do que não tinha, mas não apostou no futuro. Com esta conversa de dizer que acabou com a austeridade – que nem sequer é real – acaba a distribuir aquilo que deveria ser também para investimento. Se eu estivesse à frente do Governo, não teria sido assim de certeza, e se me obrigassem a ser assim por constrangimentos parlamentares, não podiam contar comigo.
Portanto só governará com maioria?
Não, pode ser com maioria ou sem maioria, mas há linhas vermelhas que não se podem ultrapassar. Para ter melhores empregos, tem de se cuidar melhor da competitividade da economia e cuidar que o crescimento económico se faça pelas exportações e fundamentalmente pelo investimento. Que fez o Governo em quatro anos pelo investimento privado? Nada! Que fez o Governo pelas empresas? Nada. Não havendo investimento privado, não melhorando a competitividade da economia, como é que amanhã vamos ter melhores salários? Não vamos de certeza. Andamos todos iludidos.
“Preferia que a estrutura dirigente estivesse toda alinhada a trabalhar e sem provocar ruído, claro que preferia”
Isso é um discurso muito virado para as empresas e menos para as pessoas.
Quando digo que tem de se estar virado para as empresas e para o investimento, estou a dizer que quero estar virado para as pessoas. Continuam a emigrar perto de 100 mil pessoas por ano, é pouco menos do que foi no tempo pesado da troika. E porque é que os jovens emigram? Porque não encontram aqui um emprego que os satisfaça no seu salário. Temos de olhar para o futuro e encontrar uma estratégia para promover o investimento. O que pode fazer o Governo? Pode lutar contra a desburocratização, pode tratar da legislação fiscal, pode tratar da carga fiscal, pode ter a justiça a funcionar, por exemplo.
Defende uma diminuição da carga fiscal para as empresas?
Eu defendo uma diminuição da carga fiscal, ponto. Dentro do possível, que se consiga baixar. Agora, o que se deve fazer é a gestão da carga fiscal. Temos de apostar no futuro e nas empresas. Se se aliviar fortemente o IRC relativamente aos lucros retidos e não distribuídos, eu estou a ter uma medida muito importante para o investimento. Não há medida nenhuma que, por si só, faça disparar o investimento, há um conjunto de medidas que o podem ajudar a fazer.
Acha que a classe média, que vive sobrecarregada de impostos, iria compreender que essa fosse a sua opção?
Se quiser um líder popular, não vão simpatizar muito com a minha política. Eu não preciso de aumentar o IRS ou o IVA para baixar o IRC, porque o próprio crescimento económico dá folga suficiente. A gestão da carga fiscal será sempre feita olhando para o futuro e não para o imediato. Para o imediato colhe mais simpatias, mas é pior para o país. Se conseguirmos ter mais crescimento económico, pelas exportações e não pelo consumo, na volta seguinte as pessoas começam a usufruir desses benefícios. Porque o consumo não é o motor, é o objetivo. O que nós queremos não é que a economia cresça pelo consumo, ele deve crescer porque produzimos mais e temos mais riqueza. Este Governo fez ao contrário.
Disse há pouco que tem linhas vermelhas. Se não tivesse maioria absoluta iria coligar-se com quem? Com o CDS?
Naturalmente a ligação mais natural que há ao PSD é o CDS. Esse é o aliado natural do PSD.
Assunção Cristas tem a ambição de liderar o bloco de 116 deputados de Direita…
Pronto, fica-lhe bem. (Risos)
Mas receia que o CDS possa crescer e ocupar o lugar da Direita nestas eleições?
Não estou preocupado com o que está à direita do PSD. Entendo que o PSD deve crescer ao centro. Para que é que vou desgastar-me a tentar segurar 1 ou 2% à direita quando temos ao centro muitos, muitos milhares de votos para conquistar? São pessoas que, tradicionalmente até podendo votar no PS, estão desagradadas com uma governação encostada ao BE e ao PCP. Mas o grosso são os abstencionistas, pessoas que estão completamente desiludidas e desagradadas com a política. A minha função é captar as pessoas para dentro do sistema eleitoral. Assim o partido como um todo também o queira.
Estando ao centro, equaciona um cenário de voltar a haver uma aproximação ao PS?
Relativamente ao PS, disse sempre a mesma coisa: se temos o regime político num estado brutal de desgaste, a democracia a desvalorizar-se e a afastar-se cada vez mais dos cidadãos, temos de ser capazes em Portugal de fazer um conjunto alargado de reformas estruturais. Algumas delas só são possíveis se os partidos, todos, aceitarem dialogar, designadamente os dois maiores. Não tem nada a ver com Bloco Central. Tem a ver com ter o sentido de Estado necessário para encontrar os pontos de confluência naquilo que é absolutamente vital, como são as reformas da segurança social e da justiça. É esta a minha disposição por Portugal. Eu não sou um pivô de campanhas eleitorais e de espetáculos mediáticos. O meu estilo não é esse.
“Olhando ao descontentamento que existe, o PSD tem a obrigação de criar uma alternativa ao PS. Não depende só de mim”
A reforma da descentralização é uma das que não correu bem? Está a ser rejeitada inclusive por autarcas do seu partido.
Não… Porque é que não se fazem reformas em Portugal? Porque trazem sempre resistências e impopularidades. Uma grande reforma é comprar uma série de guerras com interesses instalados. Reconheço que o Governo não a tem gerido bem, mas o objetivo é tão alto e tão importante que temos é de o ajudar a fazer bem, não matar as coisas. Esta reforma não é para concluir em 2019. Até às próximas eleições autárquicas entra só quem quer. A partir daí, o quadro fica fechado e quem se candidata sabe que aquele é o envelope financeiro.
É uma descentralização a caminho da regionalização?
O que se pretende é que, em julho deste ano, acabada a legislatura, a comissão para a descentralização nomeada pelo Parlamento faça uma proposta. A encomenda é completamente aberta. Compete-lhe estudar como se passa nos outros países, olhar para a realidade nacional e ver o que é melhor. Com esse acordo que fizemos, pela primeira vez em Portugal existe uma estratégia para a descentralização: do Estado para as autarquias; do Estado para o setor subnacional. Será a comissão de “sábios” indicada por todos os partidos a apresentar uma proposta para o país. Logo veremos o que é que vai aparecer.
Acredita que o PSD pode ganhar estas eleições?
Sim, sim. Neste momento, olhando à governação e ao descontentamento que existe face ao Governo, o PSD tem a obrigação de criar uma alternativa ao PS. Não depende só de mim, depende em primeiro lugar de mim, e nós temos obrigação de o conseguir. Há cinco meses, não achava que o descontentamento com o Governo iria ser tão grande como é. Ele é natural, porque a política conduz a isso, só que está a aparecer mais cedo do que eu pensava. Greves por todo o lado existem porquê? São de contentamento? Quando temos este descontentamento todo no país, o PSD pode ganhar as eleições. Ai pode, pode. As eleições começam por se perder e só depois é que se ganham. Primeiro é preciso que quem lá está perca. E a Oposição também tem um papel aí, apontando os erros. Neste momento essa parte está praticamente conseguida: o PS está em condições de perder, vamos nós pôr-nos em condições de ganhar.
A sua liderança sobrevive se não vencer as eleições? Ainda esta semana houve notícias de movimentos de distritais que querem convocar um Conselho Nacional para o destituir.
Não tenho nenhuma preocupação particular em estar agora a fazer contas, se fico, se saio. A única preocupação que tenho é de ter o melhor resultado possível, preferencialmente ganhar. Mas num quadro de seriedade intelectual e política. Não é ganhar a todo o custo, começar a fazer propostas e promessas absolutamente loucas só para colher a simpatia. Não quero ganhar assim. Quero ganhar em condições de chegar lá com a liberdade necessária para fazer o que o país precisa, é muito mais difícil ganhar com uma política destas.
Ganhar com a liberdade necessária é ter maioria absoluta?
Não é só, não. É ganhar com o discurso correto e acertado e não com o discurso vocacionado apenas para o ato eleitoral e captar simpatias.
Nas europeias teremos de novo Paulo Rangel como cabeça de lista?
Estamos a começar a tratar da escolha de pessoas. Nomeámos o secretário-geral como pivô para o arranque das europeias, a constituição da equipa que vai trabalhar na logística, diretor financeiro, o financiamento da campanha. E ao mesmo tempo vamos começar a desenhar a lista, será anunciada antes do fim de fevereiro.
Mas já tem uma ideia para o cabeça de lista. É de continuidade?
Logo veremos, tenho algumas ideias. Mas é preciso fazer o equilíbrio de diversos fatores, da competência, do perfil das pessoas, enfim. Para o Parlamento Europeu são muito poucos lugares, 21 deputados, neste momento o PSD tem seis. São pouco lugares, é preciso ser muito criterioso na escolha, para termos uma equipa boa.
A escolha também é feita com base em percursos. Está contente com o papel desempenhado por Paulo Rangel?
Não estou descontente com nenhum dos deputados. É impossível a lista ser totalmente reconduzida, o que não significa que eu esteja desagradado com a atuação daquele que possa não ser reconduzido.
Já pensou se gostava de desafiar Miguel Macedo para o regresso a algum cargo na vida política do PSD?
Conheço Miguel Macedo há muitos anos e não tive qualquer problema em ser sua testemunha abonatória e dizer que não o vejo capaz de usar um cargo político em benefício próprio. Felizmente que não me enganei. Se quiser voltar à política acho que é um ativo que o PSD deve aproveitar. Tem muita experiência política e uma conduta correta. Está apto àquilo que ele entender.
Apresentou-se prometendo um banho de ética na política, mas perdeu o seu primeiro secretário-geral por falhas na informação que fez constar no currículo. E a sua segunda escolha foi também apanhada em falsas presenças. Por uma questão de coerência, não devia ter sido mais firme a condenar estes comportamentos?
Devemos ser justos e corretos nessas apreciações. É muito simples para quem está na política quando vê alguém no chão e a ser arrasado mediaticamente pôr o pé em cima e armar-se em herói. Eu não tenho esse perfil. Relativamente ao Parlamento, haver deputados que indicam uma morada mas vivem noutra, ou que marcam presença em nome de outros, a primeira coisa que devo dizer é que é muito estranho que pelos vistos só haja deputados do PSD que fazem isso. Se condeno que se marque uma presença sem lá estar, para ganhar ajudas de custo, obviamente que condeno. Mas não foi o que aconteceu com o José Silvano.
“Os professores ganharam qualquer coisa nesta batalha, mas espero que não estraguem, não fechando a sua posição nas negociações que vão ter”
José Silvano teve uma falsa presença, validada por uma colega da bancada.
Não recebeu nem ganhou nada por isso. O José Silvano teve reuniões no Parlamento nessa manhã, numa delas até presidiu a uma reunião da primeira comissão, automaticamente teve uma presença, logo não ganhou a ajuda de custo por causa disso. E também tinha justificação da falta, porque estava em trabalho político, comigo em Vila Real. A única questão foi que partilhou a password, o que me dizem que não é incomum.
Que propostas tem o PSD no grupo de trabalho criado para aumentar a transparência?
Eu não sou deputado… Está no quadro do grupo parlamentar e eles estão a ver. Não sei em que estado está.
Como vê a boa relação entre o Presidente da República e o Governo? Também é dos que acha que o Presidente tem andado com o Governo ao colo?
A função de um Presidente da República não é fazer guerra ou oposição a um governo. É ser colaborante com o governo e com a oposição.
Tem tido uma gestão equilibrada?
Tem tido uma gestão equilibrada. Não quer dizer que eu esteja de acordo com todas as questões pontuais. É da vida.
O Presidente tem pedido uma posição mais ativa da sua parte, ao pedir uma Oposição forte?
As conversas com o Presidente da República nunca são nesses termos. Não faz apreciações, nem mesmo a dois, sobre o que devo ou não fazer. Não é assim que nos relacionamos e nós temos uma boa relação. Aliás, fui secretário-geral dele no partido há 20 e tal anos.
Um dos dossiês polémicos que está em aberto é a negociação com os professores. Diz que têm direito a recuperar o tempo de serviço, mas o Governo fala nos custos e na falta de condições para a reposição integral. Qual é a proposta concreta do PSD?
Quem tem de gerir, com propostas concretas, é o Governo, que tem de se sentar à mesa das negociações. Faz sentido que um partido de oposição desenhe as grandes linhas que levaria para a negociação.
E quais são as grandes linhas?
Primeiro, a contagem integral do tempo de serviço. A solução, contudo, não pode ir para lá do que é a sustentabilidade das contas públicas. Para isso é também muito importante saber de quanto estamos a falar. O Governo diz 600 milhões, o sindicato com quem reuni refere 200 e tal. É preciso ver, no eixo do tempo, a sustentabilidade das contas públicas e fazer um “mix”, por exemplo, com a idade de reforma, que me parece uma ideia a explorar. Nós temos hoje um corpo docente demasiado envelhecido e talvez parte da compensação possa ser dada nalguma antecipação da reforma, permitindo a entrada de professores mais jovens no sistema.
Mexer no estatuto da carreira docente também poderia fazer parte desta negociação? Uma das críticas recorrentemente apontadas é a rapidez da progressão dos professores quando comparada com outros setores da Função Pública.
Penso que também se deveria pôr isso em cima da mesa. Fazer um pacote global. Tem de haver disposição e abertura do Governo e dos professores, como é óbvio. Os professores ganharam qualquer coisa nesta batalha, mas espero que não estraguem, não fechando a sua posição nas negociações que vão ter. Os professores são muito relevantes para o futuro do país e a função tem sido proletarizada. Temos de dar mais dignidade à função.
Outro setor que tem estado agitado é o da saúde. A proposta de lei de bases que o PSD apresentou esta semana defende incentivos à criação de unidades privadas. Em que sentido?
O Governo diz que terminou a austeridade porque terminou com o corte das reformas e dos salários, mas depois a austeridade está em muitos outros sítios, a começar pela saúde. Nós temos a maior carga fiscal de sempre e os piores serviços públicos dos últimos anos. E isso vê-se na ferrovia, em muitos outros setores, e particularmente na saúde. Nós temos uma lei de bases com 28 anos. Mas a saúde está mal não por causa da lei de bases. O Governo propõe-se alterar para parecer, na opinião pública, que o mal estava na lei de bases. Não está e a lei que estava servia. A nossa lógica é de fazer pequenos ajustamentos que são sempre necessários ao fim de 28 anos, não é nenhuma revolução. O que está estava bem.
Em última análise não precisava de se mexer?
Não. Mas pronto, pusemos lá os cuidadores informais, pusemos mais algumas coisas… Eu revejo-me no que está, mas com uma qualidade de gestão muito acima dos indicadores que temos. Para isso tenho de dar aos hospitais condições que por exemplo os privados têm. Tenho de dar às administrações mais autonomia para as poder responsabilizar, até no sentido positivo, também premiar os que têm melhor resultado, e não permitir este desgaste de estarem à espera de uma decisão do ministro da Saúde, e muitas vezes do ministro das Finanças, até para a gestão diária. E depois não excluo naturalmente a possibilidade de haver concessões a privados para a gestão de hospitais, como já temos quatro no país.
Compromete-se a aumentar o investimento na Saúde se ganhar as eleições?
Há falta de investimento, de manutenção, de recursos humanos, todo este conjunto que se tem vindo a degradar. Um outro governo, seja ele qual for, não pode dizer “eu chego lá e em três meses está tudo um brinquinho”, porque isso é desonesto, mas pode é chegar lá e olhar para todos estes elementos de uma forma completamente diferente daquilo que este Governo tem feito. Claro que quando este Governo chegou, há três anos, já havia problemas, mas estava melhor. Com este Governo piorou bastante, disso não há dúvida nenhuma. E agora que estamos em cima das eleições já há mais enfermeiros, já há isto e aquilo. Nestes últimos dias tem sido uma coisa fantástica: é para a ferrovia, é para o SNS, e ainda estamos a dez meses das eleições, quando chegarmos a agosto devem ser milhões a chover por todo o lado a ver se enganam o eleitorado.
Se tiver de escolher entre manter o défice controlado ou investir mais em serviços públicos, qual será a sua escolha?
Tem de se manter sempre o défice controlado. Agora, depois das contas controladas, é uma questão de decisão política onde é que se investe mais e onde é que se investe menos. Mas as contas públicas têm de estar controladas e a dívida pública tem de baixar. Vamos lá ter sentido de responsabilidade: com este Governo, a dívida pública em fins de 2019 vai ser cerca de 20 mil milhões mais alta do que era em 2015.
Disse que o Governo falhou ao criar dois salários mínimos nacionais, 600 euros no privado e 635 no público. Tínhamos condições para ir mais longe no privado?
Não, mas temos condições… Eu não sou comunista e não defendo salário igual, porque há méritos, empenho, preparação técnica, muita coisa que faz variar o salário, mas nós não estamos a falar nisso. Estamos a falar no SMN e para mim o SMN nacional é injusto. Qualquer pessoa, em qualquer função, que a cumpra de forma satisfatória, merece mais do que o SMN. Só não pagamos mais porque a economia não o permite e a distribuição de riqueza que está feita não é justa.
Então onde é que o Governo falhou?
Se estamos a falar deste patamar cá em baixo, aí não podemos discriminar portugueses. Temos de tratá-los todos por igual, sejam do setor público ou privado.
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