Duarte Lima: complexo de inferioridade e vontade de vencer

Foto: Rodrigo Cabrita/Global Imagens

Texto de Alexandra Tavares-Teles

No ano de 1994, Duarte Lima estava no auge de uma carreira política. O rapaz de Peso da Régua, um de nove filhos de uma família humilíssima, órfão de pai aos 11 anos, obrigado a ajudar a mãe na venda do peixe e da fruta, bom aluno, porém considerado “o piroso” da turma de Direito da Universidade Católica, transformara-se num homem muito poderoso, um dos mais poderosos do cavaquismo.

Líder parlamentar da maioria e da distrital de Lisboa do PSD entre 1991 e 1994, bom orador e de inteligência viva, reclamava influência à altura dos cargos, e não escondia o amor desmedido ao poder. A fechar o ano, porém, anunciavam-se publicamente, no jornal “O Independente”, suspeitas que já circulavam nos bastidores do partido, à volta de uma mansão em Sintra, registada em nome de uma sobrinha e fugas fiscais.

Daqui até à prisão em 2019, por burla e branqueamento de capital, vai um quarto de século de acusações várias, entre elas a de homicídio de Rosalina Ribeiro, processo de que aguarda julgamento em Portugal. “Uma pena, porque tinha qualidades. Mas tinha a pior escola, a da política associada à corrupção”, diz um social-democrata.

Pacheco Pereira foi dos primeiros no partido a perceber que pouco batia certo nas justificações que Duarte Lima ia engendrando para as notícias que a partir de então foram saindo. Temeu que o grupo parlamentar pudesse estar a ser o centro de negociatas com empresários. “Não gosto de bater em quem está no chão”, diz hoje. Na altura, porém, conseguiu levar a bom porto a tarefa a que se propusera – afastar Duarte Lima do grupo parlamentar.

O transmontano entrou para a política em 1981, pela mão de Ângelo Correia, à época ministro da Administração Interna, com um convite para assessor. Margarida Marante, colega de Lima na Católica, fizera as apresentações. O engenheiro admite ter ficado “impressionado” com os atributos “intelectuais e políticos”, mas também com “a formação religiosa e moral” de Duarte Lima.

Daí a surpresa: “A pessoa que conheci em 80 pouco tinha a ver com a que depois veio a revelar-se”. A partir de 1990 poucas vezes o viu. Numa delas, uma visita no IPO, quando Duarte Lima tratava a leucemia diagnosticada em 1998, encontrou-o “cheio de força de vontade e determinação”. Carlos Horta e Costa, antigo secretário-geral do PSD, partilhou com Lima a doença.

O vice-presidente da Associação Portuguesa Contra a Leucemia recorda-se de ver o amigo “de auscultadores, a tocar no órgão que pedira para ter no quarto do hospital” – estudante do Instituto Gregoriano de Lisboa, frequentador assíduo do festival de Estrasburgo, a música foi sempre uma paixão – e do papel impulsionador que teve na associação.

Inteligentemente, aproveitou a doença para ensaiar o regresso à política. Organizou galas de recolha de fundos com a presença de Aníbal e Maria Cavaco Silva, entre outros ilustres, mas nada seria mais o mesmo.

Quem mais cedo o conheceu foi José Lamego. O recém-licenciado estagiou no seu escritório. Lembra “um jovem muito inteligente e muito dinâmico”. Acabariam desentendidos, “devido a estilos de trabalho incompatíveis”.

Duarte Lima tem os defeitos das suas virtudes, dizem. A inteligência aguçou a astúcia, a determinação potenciou a ambição desmedida. Uma associação perigosa entre o complexo de inferioridade e a vontade de vencer, uma personalidade complicada que hoje muitos recusam comentar.

Alguns deles convidados dos jantares de luxo de que foi anfitrião e nos quais pontificavam dinheiro, poder e influência. Foi lá que Ricardo Salgado e José Sócrates se conheceram, por exemplo.

Cargos: Advogado e político português
Nascimento: 20/11/1955 (63 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Peso da Régua)