Dar sangue. Nesta dádiva, não há fraquezas

Foto: Fábio Poço/Global Imagens

Texto de Sara Dias Oliveira

É preciso ter mais de 18 anos, até 60 se for a primeira dádiva, 50 quilos ou mais de peso, hábitos de vida saudáveis. Um dador de sangue tem de formalizar o seu consentimento por escrito e não corre risco de contrair doenças nessa dádiva. Todo o material utilizado é esterilizado, descartável e utilizado uma única vez. Quem dá sangue tem direito à salvaguarda da sua integridade física e mental, a toda a informação sobre o assunto e à confidencialidade dos seus dados.

“Só pode realmente ser dador quem quer dar sangue. Parece uma verdade de La Palice, mas é um facto. A dádiva de sangue é um gesto voluntário, a pessoa não deve ser condicionada a dar e não deve haver qualquer tipo de remuneração associado ao ato”, refere à NM Luís Negrão, médico de Saúde Pública no Instituto Português do Sangue, responsável pela promoção da dádiva, especialmente junto dos jovens.

“A dádiva é um dever, não é um direito e, por isso, só pode dar sangue quem for efetivamente saudável”, acrescenta o responsável. Mesmo assim, nem todos podem dar sangue para segurança do dador e do recetor, para que a transfusão seja um processo seguro. Por isso, a triagem clínica é da máxima importância. O profissional de saúde faz a avaliação dos critérios que têm de ser analisados ao milímetro dos milímetros. Caso a dádiva não seja aprovada é porque é preciso proteger a saúde de quem quer dar e de quem precisa receber.

Um dador de sangue está isento de taxas moderadoras no acesso à prestação de cuidados de saúde do Serviço Nacional de Saúde (SNS)

Os desmaios são um dos mitos que convêm desmistificar à volta de dar sangue. “É comum associar-se a dádiva de sangue a um estado de fraqueza depois da doação, assim como é comum admitir-se que o tipo de sangue de cada um é muito frequente e que, por isso, não é necessário doar.” Nada disso. As doações são sempre bem-vindas. Todos os que querem podem ajudar, é certo, mas há diferenças entre ser dador mulher e ser dador homem. “A mulher pode doar sangue até três vezes por ano, enquanto os homens podem dar até quatro vezes por ano. Os níveis mínimos de hemoglobina para dar sangue nas mulheres é de 12,5 mg/dL, enquanto nos homens esse valor mínimo é de 13,5 mg/dL”, sublinha o especialista. A hemoglobina, a substância que transporta o oxigénio e que existe no interior dos glóbulos vermelhos, é importante neste processo. Se está num nível mais baixo, pode causar anemia.

O perfil do dador não muda com o avançar da idade, muda sim com a experiência de vida e com os ensinamentos que se vão absorvendo. “O dador é o mesmo, mas a experiência de vida torna-o mais consciente, mais responsável e mais ‘social’, daí que o seu compromisso para com a dádiva mude à medida que a vida avança. Com o passar dos anos, vamos percebendo que não somos imortais, que vivemos em sociedade e que necessitamos uns dos outros.” “O maior benefício é o de nos sentirmos bem com nós próprios”, sublinha Luís Negrão. Uma missão de viver, de viver com os outros, de ajudar os outros.

Os jovens portugueses, dos 18 aos 24 anos, não chegam a 15% do total de dadores

Portugal vai tendo sangue suficiente para fazer face às necessidades. Mesmo assim, Luís Negrão deixa um apelo. É necessário aumentar a frequência dos dadores nos locais de colheita e haver mais jovens ligados a esta causa “em quantidade suficiente para repor os que, por limite de idade e por doença, vão estando impossibilitados de doar”. “É também necessário fidelizar os mais jovens.”

A população envelhece e as dádivas de sangue alteram-se. Em 2017, registou-se uma diminuição de dadores e de dádivas de sangue e a proporção de dadores de primeira vez atingiu o seu valor mais baixo desde 2012. Os dadores regulares representam quase 88% do total. Nota-se um aumento de dadores no grupo etário dos 18 aos 24 anos, mas, mesmo assim, a percentagem de jovens portugueses que dão sangue não chega aos 15%.

Nos últimos 12 anos, tem havido variações nas dádivas de sangue. Na região Norte, o Centro de Sangue e Transplantação do Porto contribui com 41,6% das dádivas nacionais. A Madeira é a região com menor número de recolhas de sangue. E as recolhas feitas no Centro de Saúde da Grande Lisboa têm vindo a diminuir ao longo dos anos.

As colheitas prosseguem um pouco por todo o lado. Há várias instituições que, juntamente com o Instituto Português do Sangue e Transplantação, organizam anualmente sessões de colheita. Neste momento, são mais de 200 associações e grupos de dadores de sangue em todo o país, como, por exemplo, o Grupo de Dadores de Sangue da Caixa Geral de Depósitos que celebra 36 anos de existência a 27 de março, dia em que apresentará a atividade dos serviços de recolha de sangue de todo o país.