Certezas, fantasias e teorias da conspiração: os mitos do cancro

Circulam à vista de todos. Na internet, nas redes sociais, em emails reencaminhados em catadupa. São ideias feitas sobre tudo o que pode levar-nos a desenvolver um tumor. Algumas verdadeiras, boa parte delas absurdas. Passámos todos os rumores pelo crivo de especialistas.

Antes de começar a ler este texto, experimente escrever num motor de busca da internet a expressão “mitos sobre o cancro”. Já está? Encontrou, certamente, mais de um milhão de links com artigos sobre o assunto. E não terá tido dificuldade em deparar-se com mensagens escritas num tom aterrador sobre coisas que deve deixar imediatamente de fazer sob pena de, daqui a uns anos, ser o infeliz contemplado com um diagnóstico de cancro.

Mas não acredite em tudo que lê. Ou em quase tudo. A grande maioria dos mitos sobre o cancro é isso mesmo: um mito. As mentiras em redor das origens da doença são facilmente desmontáveis. Como a de que a doença pode ser provocada pelo uso excessivo do telemóvel. Nada mais falso.

“É verdade que os casos de tumores no cérebro aumentaram bastante nos últimos tempos. Mas daí até tal estar associado à utilização frequente do telemóvel vai uma distância enorme. Não há nada que o comprove, qualquer ligação direta associada.”

A garantia é de Carla Oliveira, investigadora com anos largos de experiência na área da oncologia no i3S, Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto.

Este é apenas um exemplo das dezenas e dezenas de mitos sobre as causas de cancro que podem ser desmentidos com uma simples explicação científica. O problema é que esses mitos foram de tal forma repetidos – e as redes sociais muito contribuíram para o fenómeno – que há mentiras difíceis de desmontar, tal o cimento com que foram transformadas em factos incontornáveis. Uma espécie de escolho com que os médicos se deparam quase diariamente hoje em dia, modificando a sua relação com os pacientes.

Pacientes são médicos à maneira deles

“Dantes, as pessoas acreditavam piamente em tudo o que ouviam dos médicos. Hoje, saem dos consultórios e vão para casa pesquisar na internet a verdade que querem construir e que mais lhes convém. Porque lá podem encontrar todos os argumentos que pretendem, adequados à realidade que querem para si”, alerta Nuno Teixeira Marcos, bioquímico que trabalha em prevenção do cancro.

Nuno recorda outro mito que ainda circula pela infinita internet, o de que o uso pelas mulheres de certos desodorizantes e antitranspirantes potencia o aparecimento de nódulos nas axilas e tumores nos seios: “Nada de mais falso. Tal ideia não tem qualquer fundamento, mas o certo é que tive várias pacientes que me confrontaram com isso. E ainda há quem pense que é verdade.”

Não é só na dita medicina convencional que o desbobinar de ideias feitas sobre o cancro assusta, de tanta asneira veiculada. Lisa Joanes é homeopata e também fica surpreendida com a profusão de conceitos errados e com a facilidade com que os engodos são assimilados, mormente por quem se encontra num estado de desequilíbrio emocional momentâneo. “Se alguém estiver mais sensível do que o habitual, se o corpo estiver fragilizado, acaba por ser normal que possam ser abertas portas para que a pessoa acredite em informação cuja fonte não é fidedigna”, frisa.

A homeopata diz que o melhor é “não acreditar em tudo o que por aí se lê”, ouvir opiniões “de especialistas na matéria” e, sobretudo, “não tomar como certezas informações muitas vezes difundidas por fontes que não merecem qualquer credibilidade”.

Porém, como é óbvio, nem tudo o que circula pela net é boato. Há “mitos” que deve levar bem a sério, verdades que a ciência comprova sem pestanejar. Como o que associa o tabaco à maioria dos casos de cancro do pulmão, o que liga a exposição solar desprotegida a cancros da pele, ou o que alerta para a relação entre o consumo exagerado de álcool e o surgimento de tumores no fígado.

MENTIRA

Telemóveis
Não provocam cancro do cérebro

MENTIRA

Farmacêuticas
Não há provas sólidas de que escondam medicamentos

MENTIRA

Pão ultra-torrado
Não provoca cancro do estômago

MENTIRA

Cancro mata mais do que é curável
Não existem evidências científicas que comprovem esta tese. Os casos de sucesso são cada vez mais elevado

MENTIRA

Desodorizantes e antitranspirantes
Não provocam cancro da mama

MENTIRA


Comida guardada em embalagens de plástico

Prática não está associada a qualquer tipo de cancro

VERDADE

Álcool
Risco de cancro do fígado

VERDADE

Tabaco
Risco de cancro do pulmão

VERDADE

Excesso de exposição solar
Risco de cancro da pele

MEIA VERDADE

Poluição ambiental
Pode provocar cancros do pulmão, mas não é a causa principal para esse tipo de tumor

MEIA VERDADE

Pesticidas usados nos legumes e frutas
Podem provocar cancros no sistema digestivo, mas não são o maior fator potenciador destes tumores