Texto de Pedro Emanuel Santos
“As pessoas sabem que estão a ser manipuladas mas continuam a seguir figuras públicas porque, cada vez mais, o seu comportamento é guiado pelo delas.”
As palavras são de João Pedro Simões, gestor de redes sociais e consultor de marketing online, e resumem bem o que são hoje espaços virtuais como o Facebook ou o Instagram, sobretudo este último: autênticas montras de publicidade pagas a peso de ouro cujos visualizadores, sem pensarem duas vezes, consomem com os olhos e o inconsciente tudo o que lhes é dado a ver.
Sobretudo quando a mensagem é passada por alguém com poder mediático suficiente que consiga moldar comportamentos. Futebolistas, por exemplo. Ou atores e atrizes, apresentadores e apresentadoras de televisão, artistas, enfim uma panóplia de gente a quem foi entretanto acrescentada uma designação comum: influenciadores sociais.
Em Portugal, como em todo o Mundo, as páginas das personalidades mais mediáticas do momento praticamente deixaram de ser meros repositórios de estados de alma, de partilha de fotografias ou de desabafos vários e transformaram-se em espaços poderosos de excelência que geram dinheiro, poder e a tal da influência cada vez mais crescente.
Os chamados famosos, os que já o eram antes da explosão das redes e os que alcançaram tal estatuto apenas através da exposição online e do número de seguidores que possuem, não dispensam publicações a um ritmo (quase) diário. Em enquadramentos tudo menos inocentes, revelam, algumas vezes de forma indireta, menções a produtos. E somam dinheiro. Muito dinheiro.
“As marcas perceberam essa nova realidade. E perceberam, também, que não se trata de um fenómeno passageiro, de uma simples tendência. É algo que veio para ficar, que irá aumentar de intensidade nos próximos anos e que fará disparar preços e subir os públicos-alvo”, descreve Vasco Marques, expert em marketing digital.
“As pessoas sabem que estão a ser manipuladas mas continuam a seguir figuras públicas porque, cada vez mais, o seu comportamento é guiado pelo delas.” (João Pedro Simões, gestor de redes sociais)
“Como não querem ser deixadas para trás, cada vez mais empresas apostam nesse tipo de ações publicitárias quando têm um produto para promover”, completa.
O círculo parece quase vicioso. Uma autêntica pescadinha de rabo na boca que prossegue imparável em renhidas competições de popularidade. Quantas mais visualizações nas redes, mais interesse do público; quanto mais interesse do público, mais atenção de possíveis anunciantes; quanto mais atenção de possíveis anunciantes, mais cachê em perspetiva; quanto mais cachê em perspetiva, mais receita garantida para o promotor de um produto.
Basta uma hashtag (termo antecedido por # utilizado nas redes sociais) certa e precisa, com o nome da marca e o lema da campanha a promover, e os resultados prometem disparar.
Um fenómeno para além dos fenómenos
Entre as celebridades nacionais, há uma que se destaca das demais e que se tornou ao longo dos anos um caso verdadeiramente à parte no que ao planeta virtual diz respeito. Chama-se, claro está, Cristiano Ronaldo, tem 33 anos e o Mundo aos seus pés graças a uma carreira construída ao longo da última década e meia no Sporting, no Manchester United, no Real Madrid e, agora, na Juventus.
Também no que a Facebook, Instagram e Twitter diz respeito, Cristiano Ronaldo está à frente do pelotão, com 337 milhões de fãs, o que, de acordo com dados do último trimestre do ano passado, o transforma na figura mundial com mais fãs entre Facebook, Instagram e Twitter.
O madeirense lidera no Instagram, com 148 milhões – dados do passado mês de dezembro -, liderando a tabela à frente de nomes sonantes do mundo artístico, como Selena Gomez e Ariana Grande, respetivamente com 144,5 e 139 milhões. Também se destaca no Facebook, com 122 milhões de “amigos”, à frente da cantora Shakira (101 milhões) e do ator Vin Diesel (98) – Messi surge logo a seguir com “apenas” 89 milhões de fãs.
Cada publicação patrocinada do craque português nesta rede social estava avaliada, em finais do ano passado, em potenciais 641 mil euros, valor apenas superado por figuras que, tendo menos seguidores, fazem parte do vasto mercado dos Estados Unidos, onde o futebol não entra com tanta facilidade e popularidade como acontece na Europa, casos de Selena Gomez (684 mil euros) e da socialite Kylie Jenner (850 mil).
No Twitter, CR7 apresenta números mais modestos. Conta com 76 milhões de seguidores e é batido pelas cantoras Katy Perry e Taylor Swift, 108 e 84 milhões, respetivamente. Justin Bieber, outra estrela dos palcos, tem 105 milhões de seguidores no Twitter, quase tantos (103) como o ex-presidente americano Barack Obama. Logo atrás surge a apresentadora Ellen Degeneres (77 milhões), para depois, então, aparecer Cristiano Ronaldo.
Realidade nacional
Outro nome português permanentemente em alta é o de Sara Sampaio. A modelo tem 7,3 milhões de fãs nas redes sociais – bem longe dos números de Cristiano Ronaldo, é verdade, mas quantidade suficiente para a cotar como das mais acompanhadas nas plataformas virtuais.
No que ao Instagram diz respeito, Sara Sampaio tem como principais rivais no mundo feminino Dolores Aveiro (1,7 milhões de seguidores), a atriz Rita Pereira (1,1 milhões), a apresentadora Cristina Ferreira (936 mil) e Kátia Aveiro (900 mil). Números mais modestos quando comparados com os Cristiano Ronaldo e de Sara Sampaio, sim, mas considerados elevados para a realidade de um país com pouco mais do que 10 milhões de habitantes. Ainda assim, futebolistas como Pepe, Ricardo Quaresma ou Renato Sanches têm mais adeptos seguidores.
Todas estas figuras já viveram experiências em que, mais ou menos inocentemente, surgiram com um produto associado nas fotos que publicam. “As personalidades são quem consegue influenciar tendências, modas, produtos. O marketing social e digital sabe disso mesmo e a interligação entre publicidade e figuras públicas de relevo acaba por se tornar perfeitamente natural”, considera João Pedro Simões.
No fundo, as redes sociais vieram ocupar um espaço que, antes da sua explosão, era ocupado, quase em exclusivo, pela televisão. E os anunciantes seguiram o mesmo caminho, uma quase despercebida mudança de rumo que foi alterando as regras do mercado e os métodos para lidar com a nova realidade.
“Dantes, tal como hoje acontece, as empresas também procuravam famosos para melhor promoverem os respetivos produtos. A estratégia não mudou, o meio é que outro, muito mais abrangente”, explica Jean Martin Rabot, investigador da Universidade do Minho nas áreas da sociologia do quotidiano e das novas tecnologias. “Ainda por cima, e esse é o fator mais determinante na realidade atual, as redes permitem alcançar um número muito superior de destinatários, logo de potenciais futuros compradores”, acrescenta.
O novo rei das redes
Depois de anos a fio em que concentrou atenções em posição dominante, o Facebook tem hoje uma curva ascendente mais lenta enquanto rede social privilegiada. O Instagram – fruto de ser uma rede social mais recente – ganhou terreno no campeonato da exposição pública, sobretudo daquela que traz consigo lucro associado em troca de publicações e visualizações.
Fundado em 2010 pelo americano Kevin Systrom e pelo brasileiro Mike Krieger, o Instagram não demorou a conquistar seguidores mundo fora. Dois anos depois, a Facebook, de Mark Zuckerberg, percebeu o filão e comprou o aplicativo por… 1 bilião de dólares (880 mil milhões de euros).
A progressão no mercado por parte do Instagram foi rápida e sem sentido de regressão. Depois de anos de domínio absoluto do Facebook, criado em 2004, o Instagram galgou posições de popularidade e tem conquistado cada vez mais fãs a nível mundial. Portugal não foge à regra e assiste a um campeonato que continua liderado pelo Facebook, embora com vantagem cada vez mais renhida para o Instagram, que tem ganho adeptos de forma consistente, sobretudo junto do público abaixo dos 30 anos.
Segundo dados de um estudo realizado pela Marktest, em 2018, a aplicação triplicou valores de notoriedade em relação ao ano anterior. Dos 5,3 milhões de portugueses com conta em pelo menos uma rede social, 60% usam o Instagram, 91% deles jovens. O Facebook, esse, é escolha de 95% do total de utilizadores.
A grande montra virtual
Não é, por isso, de espantar que o Instagram concentre grande parte das campanhas publicitárias protagonizadas por personalidades mediáticas que o público identifica com facilidade assinalável e cujos perfis visita com regularidade. “O Instagram permite outro tipo de conteúdos que o Facebook não permite. É mais direto e apelativo, com um público-alvo muito específico”, sustenta João Pedro Simões. “É muito fácil que uma publicação de uma figura pública atinja pelo menos cem mil pessoas”, exemplifica.
Perante tamanho auditório virtual, as marcas inverteram critérios e passaram a apostar no tabuleiro das redes como forma principal de promoção dos respetivos produtos. Porque sabem que podem chegar a muito mais pessoas e que podem contar com maior interação, ainda por cima a qualquer hora e em todas as zonas do país. E do planeta.
“Temos assistido nos últimos anos a uma verdadeira revolução. O marketing de influência, porque é disso que se trata, cresceu significativamente em Portugal nos últimos dois ou três anos, à semelhança do que acontece nos principais países da Europa e, também, nos Estados Unidos”, aponta Vasco Marques.
Os nomes mais fortes em termos mediáticos são os mais requisitados, embora outros não tão sonantes sejam também chamados a ser corpo e cara de várias campanhas. Estes últimos com um cachê não tão elevado, muitas vezes em troca, apenas, dos bens (ou parte deles) que promovem. “A notoriedade, ou a falta dela, conta e dita regras no meio”, sublinha João Pedro Simões.
Tal realidade levou a que as próprias ações de publicidade fossem alteradas e que as empresas mudassem agulhas na hora de delinear ações de campanha. “Para além do orçamento para as promoções habituais, passaram a destinar parte desse mesmo orçamento a ações específicas nas redes sociais associadas a pessoas com quem o público facilmente se identifica”, analisa. Uma realidade que mudou quase sem que se desse por isso. Bastaram milhões de cliques nas fotos de quem idolatramos.