Anabela Baldaque: “Temos o cheiro dos tecidos no sangue”

Foto: Leonel de Castro/Global Imagens

Anabela Baldaque é o Benjamin Button da moda portuguesa. Tem 55 anos, mais de 30 de carreira, e quanto mais o tempo passa, mais a criadora e o seu ato criativo rejuvenescem. Nesta estação, lançou a primeira coleção de calças e substituiu os vestidos por camisas. Apaixonou-se por casacos estruturados e apostou em linhas soltas. Atirou-se aos tecidos de alta-costura e transformou-os em peças para o dia. Desafiou-se, descontextualizou, inovou.

Em comum, “o mimo e o tempo” que dedica a cada peça. E a confeção assinada pelas suas costureiras, “à mão, à moda antiga, com cuidado e uma quantidade infindável de detalhes”. E em tecidos cuja escolha constitui a parte mais demorada do processo. “Perco-me com tecidos, porque é aí que tudo começa.”

Formada, nos anos 1980, em Estilismo e Modelismo na Escola de Moda Gudi, estagiou com Emilio Pucci, um dos estilistas preferidos de Marilyn Monroe, em Florença. Anabela Baldaque faz parte da primeira geração de criadores do Porto, num tempo em que quase não havia informação nem materiais – ela pintava tecidos com cera para se aproximar do expressionismo abstrato de Pollock –, e não tem dúvidas de que há uma identidade que distingue os designers do Norte. “Temos o cheiro dos tecidos no sangue.”

A loja da Foz, no número 1080 da Rua do Padre Luís Cabral, era, até agora, a única morada da sua coleção. Mas, no início deste ano, a criadora abriu um segundo espaço, conceito alternativo, no número 59 da Rua Adolfo Casais Monteiro, no quarteirão de arte da Miguel Bombarda. Chama-se Bela Balda, e pretende “desmistificar aquele conceito de que as peças de criador são muito caras, ou muito estilizadas, ou para ocasiões especialíssimas”.

Não são, mas são para durar a vida inteira. “Comovo-me quando alguém diz que a minha roupa não é roupa, é legado para as filhas e para as netas.” Ou quando aparece alguém com uma peça com 20 anos. “Não guardei nada e fico babada, tenho vontade de comprar o que me compraram.” Quem tem Anabela Baldaque no guarda-roupa?

Neste espaço, Anabela Baldaque inaugurou o Pano para Mangas, projeto em que desafia um artista plástico a intervir sobre uma peça de pano-cru por ela desenhada. A primeira desafiada foi a pintora Ana Vidigal. O mais recente foi Albuquerque Mendes, que chamou “Luar” a um corpete que bebeu inspiração em Agustina Bessa-Luís. Os desafios são para continuar. As peças serão expostas no MUDE – Museu do Design e da Moda e o valor da venda doado a uma instituição.