A guerra dos sexos: afinal, quem sente mais desejo sexual?

É uma ideia que prevalece no senso comum: os homens, esses seres repletos de testosterona, estão sempre prontos para a ação, apresentando, por regra, níveis de desejo sexual bem superiores aos das mulheres. Será?

“Não é correto assumir que há um maior desejo sexual nos homens”, alerta Ana Carvalheira, psicóloga, sexóloga e investigadora no Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA).

A especialista aponta antes para diferenças significativas no ADN do desejo de uns e outros. “O desejo sexual dos homens é mais sólido e mais constante, o das mulheres mais frágil e mais flutuante. Flutua em função do ciclo menstrual e hormonal, flutua de acordo com os estados emocionais. É um desejo mais frágil porque é facilmente inibido por situações de stress, conflitos emocionais, emoções negativas, fatores contextuais, falta de atenção do parceiro”, enumera.

Depois, há outras questões, como a socialização sexual. “Por razões socioculturais, as mulheres não perseguem o prazer sexual da mesma maneira que os homens. A socialização sexual delas é mais repressiva. É certo que é cada vez menos assim, porque no tempo das nossas mães e das nossas avós era muitíssimo pior. De qualquer forma, penso que ainda persiste. São mensagens que a sociedade nos passa, às vezes muito subliminares”, sublinha Ana Carvalheira, concretizando: “Por exemplo, nem os pais nem a sociedade passam a mensagem de que o prazer sexual é uma parte importante da vida. Mesmo a masturbação é um comportamento mais aceitável nos rapazes do que nas raparigas. Os pais são muito mais permissivos no caso dos rapazes”.

O que não quer dizer que se possa assumir que o desejo sexual masculino supera o feminino. “As generalizações são sempre arriscadas. Há diferenças no desejo masculino como no feminino e não podemos falar dele como estando apenas baseado em variáveis biológicas [o exemplo mais citado é a testosterona]. As vertentes sociais e psicológicas também são de enorme importância”, começa por frisar Júlio Machado Vaz.

Sexólogo há décadas, tem assistido, na primeira pessoa, ao “matizar das chavetas mais clássicas”, “com homens sofrendo – ou não… – por apresentarem baixo desejo sexual e mulheres queixando-se de insatisfação por os seus parceiros preferirem uma frequência sexual mais baixa do que elas”. “É verdade que continuo a ouvir mais homens para quem o sexo puro e duro constitui uma vertente fundamental nas suas vidas, mas o número de mulheres com a mesma opinião vem aumentando”, refere, acrescentando que entende a sexualidade feminina como “mais rica em nuances do que a masculina, mais mecânica”.

De resto, Júlio Machado Vaz chama ainda a atenção para uma outra questão, que se prende com o facto de não se poder falar de desejo sexual como se “estivéssemos parados num determinado tempo das nossas vidas”. E especifica: “As diversas faixas etárias valorizam e constroem o desejo de modos diversos”.

O mesmo se aplica às múltiplas fases das relações, com a longevidade a ter repercussões óbvias na oscilação dos níveis da libido. “O desejo sexual das mulheres é mais afetado pela duração das relações. Ou seja, quanto mais longa é a relação mais o desejo diminui. Nos homens não acontece tanto isso. Isto é o que mostram os estudos”, salienta Ana Carvalheira.

A este propósito, a investigadora do ISPA sublinha a importância de distinguir entre desejo responsivo e espontâneo: “O desejo espontâneo está mais presente no início das relações, alimentado pela paixão. E o desejo responsivo está mais presente nas relações longas. O que é importante dizer é que as mulheres não devem estar à espera do desejo sexual espontâneo numa relação de dez anos, de um desejo igual ao que sentiam no início da relação. O erotismo já não é como dantes. Falta a novidade, o mistério, a surpresa, faltam componentes eróticas que estavam presentes no início e deixam de estar”.