A amiga do pé que está sempre à mão

Texto de Pedro Emanuel Santos

Quando a dificuldade aperta na hora daqueles teimosos sapatos insistirem em não encaixar no pé, é sempre chamada a atuar. Discreta, a calçadeira é presença comum em todos os lares.

Cá e por todo o Mundo, que o uso é global, resiste ao evoluir dos tempos e nunca caiu em desuso. E tem história que vem do século XIV, mais propriamente do início dos tempos da Renascença, na Europa.

Foi então – quando os nobres passaram a ver nos sapatos objetos de luxo, ostentação e estatuto – que a calçadeira entrou no quotidiano. Na altura, havia-as com o formato como hoje as conhecemos, embora ornamentadas a ouro e com desenhos feitos à mão por dedicados artesãos, precisamente para garantir ostentação aos ricos que as possuíam.

Quem, então, não era pessoa de tantas posses mas, ainda assim, conseguia juntar o suficiente para conseguir um par de sapatos que fosse, as calçadeiras eram mais modestas e tinham como base simples ossos de animais.

À medida que o uso de sapatos deixou de ser privilégio dos meios mais abastados e se tornou comum entre todas as camadas da população, a calçadeira acompanhou o ritmo e, também ela, ganhou projeção. Manteve-se, porém, a tendência de os mais ricos as personalizarem e os menos abonados financeiramente se limitarem aos mais básicos materiais.

Incluíram-se mais tarde, tanto para uns como para outros, novidades na estética que procuraram facilitar a sua utilização, como o uso de cabos que, presos ao instrumento, lhes davam mais comprimento e permitiam conforto e facilidade de uso. Essa opção tornou-se tão popular que acabou utilizada com frequência até meados do século passado, aquando da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

De então até cá, as calçadeiras retomaram a forma original. Perderam os cabos, voltaram ao seu raso papel e assim se popularizaram nos quatro cantos do mundo. O plástico tornou-se rei e senhor e ajudou a que se multiplicassem, a preços acessíveis, por tudo o que era casa em que houvesse um par de sapatos complicado de entrar no pé. Ou nas sapatarias, onde é impossível que faltem quando o momento manda escolher calçado novo.

Pelo mundo fora há quem não desista de se dedicar ao fabrico de calçadeiras seguindo processos exclusivos. Por exemplo, utilizando madeira proveniente de sequoias como base principal, tal como acontece com fabricantes de Milão (Itália), que depois exportam o produto para vários mercados de luxo por toda a Europa, em particular para a Grã-Bretanha, onde é vendido a preços que chegam a atingir as centenas de euros. Ou as que têm como componente principal corno de boi, fabricadas sobretudo nos Estados Unidos.

Luxuosas ou mais modestas, as calçadeiras continuam em alta. Os pés agradecem.