Não, isto não é sobre o Sporting (até porque eu não percebo nada de futebol)

Notícias Magazine

Não percebo nem quero perceber. A última vez que vi bola foi a final do Euro 2016. As defesas do Rui Patrício, o golo do Eder, a paixão pura do Cristiano Ronaldo, e o meu amor, que não sei de onde vem, por este país a encherem-me de nervos e a fazerem-me saltar e gritar e chorar de alegria, que disparate. Ah, e a borboleta. Aquela borboleta. Que disparate, não, não foi disparate nenhum.

De resto, nada. Não tenho clube. De cada vez que vejo alguém falar de futebol na televisão, mudo de canal. A minha única relação com a bola vem do meu filho, que quer ser guarda-redes e neste ano lá me convenceu a deixá-lo ir treinar a sério. É bonito o futebol do meu filho. É desporto, jogo, camaradagem, regras, disciplina, esforço, trabalho. Faz-lhe bem. Quando vou buscá-lo, já noite, o relvado enorme, as luzes, os miúdos a correr de um lado para o outro, cheios de sonhos. É bonito. Se o futebol fosse sempre isso, talvez eu tentasse perceber de futebol.

Mas não. O futebol também é uma criatura chamada Bruno de Carvalho que apela aos sócios do clube a que preside para que deixem de ver televisão e de ler jornais, incitando implicitamente ao ódio e à violência, quer contra jornalistas quer contra adeptos, jogadores e dirigentes de clubes adversários (e, pelo que me é dado a entender, até contra os seus, quando discordam de si). Nem me dei ao trabalho de perceber porquê. Não há porquê que justifique atitude tão estúpida.

Não perderia mais do que uns minutos com o assunto, muito menos escreveria sobre este, não fosse aquilo que me parece revelar: uma permissividade e placidez preocupantes relativamente a atitudes autoritárias, antidemocráticas e atentatórias da liberdade. Se muitas vozes se levantaram contra Bruno de Carvalho, outras tantas apoiaram-no e que se saiba, pelo menos à data do fecho desta edição, o senhor ainda não deixou de ser presidente do clube nem foi irradiado do futebol português.

O caso Bruno de Carvalho é o da semana, folclórico e publicitado até à náusea pela comunicação social, que goza o pratinho (como diz o meu amigo Paulo Farinha, «oportunidade de ouro [perdida, digo eu], esta, para começar a limpar uma ínfima parte do lixo do futebol português: deixar de dar palco a Bruno de Carvalho»). Mas, 43 anos depois do 25 de Abril, quantos pequenos ditadores existirão por esse país fora, nas empresas, nas instituições, nas organizações políticas, nos clubes, etc., etc., sem que façamos nada para que deixem de existir? E o que diz isso de nós?