Luís Sequeira: «Até ser nomeado para este Óscar era um perfeito desconhecido dos portugueses»

Texto Catarina Vasques Rito

Toronto, no Canadá, foi a cidade que viu nascer Luís Sequeira, o país que a mãe escolheu para viver e trabalhar. «A minha mãe é uma mulher de armas e, pode parecer um cliché, mas aprendi com ela a não desistir.» Foi também com a mãe que ganhou o gosto por moda, vendo-a trabalhar na sua «velha máquina de costura», brincando com alguns dos utensílios que a mãe usava. «Às vezes, atrapalhava mais do que facilitava», brinca Luís Sequeira.

Portugal e os portugueses espalhados pelos quatro cantos do mundo descobriram o talento deste homem devido à nomeação para os Óscares na categoria de Melhor Guarda-Roupa, no filme A Forma da Água, estando também nomeado para o BAFTA e tendo já conquistado um Guild Award.

«Se ganho ou não é irrelevante, porque a sensação que tenho é que já ganhei todos os prémios possíveis devido à reação das pessoas que estão nesta indústria. Estou a viver o presente e a tirar o melhor proveito dele. Espero que todo este frenesim acabe por se transformar em convites e oportunidades de trabalho que continuem a exigir de mim o meu melhor», diz.

«Todo o trabalho que antecede a escolha criteriosa de um guarda-roupa é essencial. Não só serviu como referência para a equipa que trabalha comigo, mas também facultou ferramentas aos restantes departamentos sobre o estilo daquele período.»

Na pesquisa que realizou para o guarda-roupa do filme teve em conta o contexto da ação, a Guerra Fria, procurando em fotografias, filmes, artigos e outros materiais que dessem a conhecer aquela época, contactou profissionais, analisou a moda da altura e teve acesso a imagens de arquivos privados.

«Todo o trabalho que antecede a escolha criteriosa de um guarda-roupa é essencial. Não só serviu como referência para a equipa que trabalha comigo, mas também facultou ferramentas aos restantes departamentos sobre o estilo daquele período. Por fim, houve uma seleção de sugestões, de outras décadas, que considerei contextualizantes e que queria integrar de alguma forma no filme», explica Luís Sequeira, ressalvando a importância dos factos históricos, que se reflete nas peças usadas nas personagens, que não incluem «ves­tuário adaptado».

«A pesquisa considerou os tecidos e as técnicas de fabrico da altura em questão, um dado que ficou claro desde o início entre mim e o Guillermo del Toro [realizador do filme].»

O luso-canadiano Luís Sequeira estudou moda e trabalhou na indústria até perceber que o figurinismo cinematográfico e televisivo era a sua paixão.

Cada personagem tinha de se vestir contextualizando a sua profissão, estatuto e ambiente social e o tempo da história em si. «Com isto não estou a dizer que desvalorizo o facto de estar nomeado para importantes prémios, o que quero dizer é que estou a viver o momento, a absorver as oportunidades», salienta o luso-canadiano, que tem recebido com alguma surpresa o apoio de ilustres estranhos.

«Até ser nomeado para este Óscar era um perfeito desconhecido dos portugueses e até certo ponto de muitos profissionais que trabalham nesta indústria. Agora, todos os dias recebo uma palavra, uma frase de apoio e força. É surpreendente!»

Nunca viveu em Portugal, mas desde criança que vem nas férias visitar familiares e descansar. A sua formação académica foi feita em Toronto, na Galasso School of Design, onde aprendeu técnicas e padronagem para alta-costura. Mais tarde teve formação superior em Design de Moda.

«Se ganho ou não [O ÓSCAR DE MELHOR GUARDA-ROUPA] é irrelevante, porque a sensação que tenho é que já ganhei todos os prémios possíveis devido à reação das pessoas que estão nesta indústria», DIZ LUÍS SEQUEIRA.

Confesso apaixonado por moda, área em que trabalhou cerca de seis anos, acabou por perceber que o lado «fascinante da profissão é menor do que se imagina». A dedicação e a solidão acabaram por ditar a mudança para o figurinismo cinematográfico e televisivo. «Sou um designer de fantasias que continua associado à moda, numa perspetiva diferente, igualmente fascinante.»

Para Luís Sequeira a arte do figurinismo reside em convencer o público de que esta ou aquela personagem estão enquadradas no contexto de uma determinada história: «É da nossa responsabilidade criar credibilidade.»

Apesar de se ter distanciado do design de moda, continua atento ao que se passa nesta área, admitindo que gostaria de ter um dia um projeto que envolvesse o know-how português.

Credibilidade essa que parte de fatores confluentes que «se não estiverem alinhados criam ruído e podem destruir uma personagem ou uma história. Trabalhar o guarda-roupa de um filme ou de uma série exige que tenhamos todo o conhecimento sobre o guião, perceber o que se passa na cabeça do argumentista, do realizador, dos atores, dos cenógrafos, etc.!»

Apesar de se ter distanciado do design de moda, continua atento ao que se passa nesta área, admitindo que gostaria de ter um dia um projeto que envolvesse o know-how português quer do ponto de vista da indústria quer do design. Internacionalmente, é um fiel «espetador das coleções de Dries van Noten, Maison Margiela, John Varvatos, Paul Smith, Balmain e Balenciaga».

«Trabalhar o guarda-roupa de um filme ou de uma série exige que tenhamos todo o conhecimento sobre o guião, perceber o que
se passa na cabeça do argumentista, do realizador, dos atores, dos cenógrafos.»

O dia-a-dia profissional de Luís Sequeira tem regras bem estabelecidas: começar cedo a verificar mails e a organizar a agenda. Entre reuniões com a equipa de atores, produtores, diretores, maquilhadores e cabeleireiros tem de ter tempo para fazer compras de materiais para facultar às costureiras e aos alfaiates, organizar provas de roupa e alterar ideias que vão surgindo ao longo da implementação do projeto.

«Sou exigente e muito focado. Evito distrações para rentabilizar a inspiração. Cada projeto tem um ritmo próprio e nesta indústria temos de mostrar que somos bons diariamente. A concorrência é grande», frisa o figurinista, que quando não está a trabalhar gosta de estar com quem mais ama e, se está em Portugal, aproveita «para fazer jardinagem e para relaxar. Confesso que Portugal é o meu barómetro calmante. Adoro que assim o seja”.

Leia a entrevista ao designer em www.delas.pt/luis-sequeira.

Estudos para um guarda-roupa

  • GILES
    Algumas imagens que inspiraram a roupa de Giles, pintor, vizinho e amigo de Elisa.

  • STRICKLAND
    Assim foi criado o guarda-roupa do vilão.

  • ELISA
    A heroína do filme é empregada de limpeza e isso foi importante para criar as suas roupas.