Carlos Nogueira: o equilibrista da CP

Manuel Almeida/Lusa

Texto de Alexandra Tavares-Teles

Nasceu em Macinhata do Vouga, concelho de Águeda, mas foi em Gabela (Kwanza-Sul) e Lubango (Huíla), cidades do sul de Angola, que cresceu e estudou. Filho de comerciantes e fazendeiros produtores de café, guarda da infância e adolescência, vividas sob o sol de África, “excelentes recordações”.

Chegou a Portugal depois da revolução de 1974, tinha 20 anos. Ficou a viver em Lisboa, estudante do ISCTE, onde lecionaria como convidado depois da licenciatura em gestão, mundo que o fascinava desde criança, com média final de 17 valores.

Pai de um rapaz e de uma rapariga, traça o autorretrato: “Sou uma pessoa focada, um estudioso, alguém que procura o equilíbrio, sempre do lado da solução”. Tem 64 anos, três décadas de vida profissional. “Gosto muito do que faço”, declara à NM.

Foi nomeado pelo Governo de António Costa para presidente da Comboios de Portugal em junho de 2017. Manuel Queiró, ex-deputado do CDS e antecessor na presidência, após breve contacto na passagem de testemunho, refere “a pessoa cordial e simpática, com pouca experiência no ramo ferroviário mas muito interessada em aprender”.

Sérgio Abrantes Machado, atual vogal do Conselho de Administração da CP, conhecimento igualmente recente, dá conta de um gestor “disponível e interessado”.

Carlos Gomes Nogueira é o primeiro a admitir a complexidade do cargo. “A CP é uma empresa sui generis, difícil.” Desde logo, pelo enorme peso dos sindicatos. A apresentação ao duro mundo sindical decorreu na Groundforce, empresa de “handling” de aeroportos (assistência em terra de companhias aéreas) de que foi mandatário de gestão durante cinco anos (de 2009 a 2014).

Na CP, porém, a luta dos trabalhadores tem pergaminhos históricos. Num só ano de mandato, passou por três momentos de conflito e tensão (novembro de 2017, fevereiro e junho de 2018) que redundariam em greve.

José Manuel Oliveira, coordenador da Federação Sindical dos Transportes e Comunicações (FECTRANS), está do outro lado da barricada no processo negocial. “As negociações foram sempre conduzidas pela tutela, portanto, o papel dele tem sido muito reduzido”, começa por dizer. Do que pôde ver, no entanto, “trata-se de um mau comunicador, alguém de que perde rapidamente a linha de raciocínio”.

Dito isto, “do ponto de vista pessoal”, têm “um bom relacionamento” e o que o sindicalista pode dizer é que “é um dos presidentes mais acessíveis” que conheceu. Entre ambos existe “um canal aberto”, conversas “de que podem sair perspetivas de soluções”.

Garantindo que é pouco dado a militâncias ferrenhas, nem sequer em relação ao seu Benfica, Carlos Nogueira diz-se politicamente independente. Um gestor que gostava de deixar na CP (cerca de 122 milhões de passageiros transportados em 2017) uma marca.

“Para isso, tem pouco poder, depende completamente do Governo”, contrapõe o homem do sindicato, afeto à CGTP. Exemplifica. “Não tem autonomia para admitir trabalhadores nem sequer para agilizar a aquisição de peças e materiais, de forma a garantir a operacionalidade das oficinas.”

Com uma frota envelhecida, pessoal insuficiente nas oficinas e uma muito lenta recuperação do investimento, a CP tem estado sob o fogo de sindicatos e da oposição. Cumprido um ano de mandato, Carlos Nogueira insiste, entalado entre as reivindicações dos trabalhadores e as diretivas de Mário Centeno: gostaria de deixar marca.

“Uma gestão equilibrada, empenhada, séria, que ajudasse a empresa a preparar-se para os novos desafios que aí vêm”. Muitos.