As mães não são todas iguais

Texto Catarina Fernandes Martins

Aos 32 anos, Lene Skibsted e o marido decidiram que estava na altura de serem pais. Para a dinamarquesa, já foi tarde. O ideal, diz, seria ter tido o primeiro filho antes de completar 30 anos. E do ponto de vista financeiro e da estabilidade profissional, isso teria sido possível, já que Lene tem o mesmo trabalho, bem pago, desde os 25, numa firma de arquitetura em Holding, no sul da Dinamarca.

Lene nunca pensou que corria o risco de perder o emprego, que prejudicaria a sua carreira por ser mãe. Sem obstáculos exteriores aparentes, a arquiteta adiou a maternidade por uma questão puramente emocional. Após o nascimento da primeira filha, em 2012, Lene escolheu tirar 35 semanas de licença.

Sobre os desafios que ainda existem relativamente à maternidade e à igualdade de género na Dinamarca, Lene confessa: «É cada vez menos difícil e por vezes esquecemo-nos de que ainda temos de lutar»

O marido, que na altura não trabalhava, não gozou a licença. Após o nascimento da segunda filha do casal, em 2016, o pai tirou cinco semanas. Lene sentiu sempre necessidade de voltar ao trabalho, não gozando de todo o tempo a que tinha direito e podendo ainda usufruir de algumas semanas até aos nove anos de cada uma das filhas. Mas apesar de querer trabalhar, Lene escolheu também reduzir o horário de trabalho para 33 horas por semana, sofrendo um corte de dez por cento no salário mensal de 2890 euros.

«Agora preciso de tempo para dormir e estar com as minhas filhas», diz. A arquiteta está absolutamente convencida de que nada disto prejudicará a sua carreira. «Trabalho numa empresa maioritariamente constituída por homens, mas somos todos sindicalizados e não noto qualquer diferença», diz. No final da conversa, lembra, sem grande preocupação, que o trabalho pago a tempo parcial fará diferença na altura da reforma.

E depois, sobre os desafios que ainda existem relativamente à maternidade e à igualdade de género na Dinamarca, Lene confessa: «É cada vez menos difícil e por vezes esquecemo-nos de que ainda temos de lutar», diz. Para que as filhas «lutem ainda menos do que a minha mãe», Lene educa-as para acreditarem que podem ser «piratas ou princesas», assegurando-lhes que podem usar «meias com o Homem-Aranha», mesmo que os colegas rapazes lhes digam que não.

Nos países nórdicos, o caminho é o de incluir cada vez mais o homem na licença de parentalidade, para incentivar a igualdade tanto ao nível do tempo que a criança passa com cada um dos progenitores como ao nível do mercado de trabalho.

Quando a Europa olha para dentro à procura de exemplos das melhores práticas de igualdade de género e de conciliação da vida profissional e familiar, olha geralmente para norte, para a Dinamarca, para a Escandinávia, onde indicadores como a licença de parentalidade e os horários de trabalho flexíveis e bem pagos facilitam uma maternidade menos penalizadora das mulheres e mais amiga do convívio da criança com ambos os progenitores, em igualdade de circunstâncias.

No Dia da Mãe, e a poucos dias de se celebrar o Dia da Europa, olhámos para a forma como a maternidade e a família são vividas no bloco comunitário, procurando identificar as vantagens e os desafios de uma mãe dinamarquesa, alemã, francesa, italiana, portuguesa e romena.

E se os investigadores e as próprias mães consideram que é necessário mudar o que resta da mentalidade associada à frase «mãe é mãe», de uma forma ou de outra ela continua a enformar as práticas de muitas famílias europeias.

As cinco semanas tiradas pelo marido de Lene podem parecer muito tempo para as famílias no resto da Europa, mas, no conjunto da Escandinávia, os pais dinamarqueses são dos que menos aproveitam a licença de parentalidade. Na Suécia, por exemplo, os casais podem tirar 480 dias, sendo que 90 deles devem ser gozados pelo pai sob prejuízo de o casal perder direito a eles.

A norte, o caminho é o de incluir cada vez mais o homem na licença de parentalidade, para incentivar a igualdade tanto ao nível do tempo que a criança passa com cada um dos progenitores como ao nível do mercado de trabalho.

O Livro Branco – Homens e Igualdade de Género em Portugal, de 2016, revela situações em que os homens sofreram discriminação laboral e foram inclusive alvo de despedimento por reivindicarem os seus direitos relativos à licença de parentalidade.

É por isso que neste momento, prolongar o tempo de licença só para a mulher está fora do discurso político na generalidade dos países. A nível comunitário existe a proposta de uma diretiva para aprovar em toda a UE a licença de paternidade de dez dias.

«São necessárias políticas que aliciem o pai a usufruir da licença porque quando os homens estão sozinhos a tomar conta dos bebés isso tem um grande impacto na sua identidade como pais e cuidadores. É comum que eles queiram repetir a experiência num segundo filho. A forma como o homem olha para a licença pode ajudar o empregador a mudar também a forma como olha para a licença», diz a investigadora Mafalda Leitão, que num dos estudos de caso que realizou junto de uma empresa média em Portugal notou que, como consequência de os homens gozarem a licença de parentalidade, os empregadores começaram a encarar as licenças da mesma forma que encaram as escalas de férias.

Por outro lado, o Livro Branco – Homens e Igualdade de Género em Portugal, de 2016, revela situações em que os homens sofreram discriminação laboral e foram inclusive alvo de despedimento por reivindicarem os seus direitos relativos à licença de parentalidade.

No extremo oposto desse caminho estão os países do leste da Europa, como a Roménia, onde a licença de parentalidade é de dois anos pagos a 85 por cento do salário, com um mês para o «segundo progenitor». De acordo com Mafalda Leitão, de uma forma geral, licenças muito longas refletem um sistema maternocêntrico (centrado na mãe).

Para fazer uma análise desse tipo é necessário olhar além das licenças, para indicadores como a taxa de cobertura de creches, o que permite perceber sobre quem recaem as expetativas sociais quanto ao cuidado das crianças. Na Roménia a taxa de cobertura de creches [ver infografia acima] é de 12 por cento, muito abaixo das «metas de Barcelona», que definiram o objetivo europeu de ter 33 por cento das crianças até aos 3 anos em berçários e creches.

Dorothee Hasnas, uma arquiteta free­lancer de 39 anos, regressou à Roménia há seis anos, depois de ter vivido entre a Alemanha e a Suíça, tendo sido mãe há pouco tempo. A flexibilidade do seu trabalho e do trabalho do marido, também freelancer, permite-lhe não contratar uma ama e até dispensar a ajuda da mãe durante a maior parte do tempo.

Agora que tomou a decisão de educar uma criança na Roménia, Dorothee preocupa-se com a qualidade das escolas que, diz, não é muito boa, e com a instabilidade política.

Dorothee sabe que é uma exceção e diz que, com um rendimento mensal pouco superior a mil euros, contratar ajuda seria difícil. «Durante o regime comunista, as mulheres, como a minha mãe, tinham de voltar ao trabalho seis semanas ou três meses após darem à luz, existindo um grande sistema de jardins-de-infância a nível estatal. Após a queda de Ceausescu passou a ser normal esperar que uma mulher trabalhe, tome conta do bebé e da casa – sempre com a ajuda da mãe e da sogra, mas nunca dos homens da família», diz.

Agora que tomou a decisão de educar uma criança na Roménia, Dorothee preocupa-se com a qualidade das escolas que, diz, não é muito boa, e com a instabilidade política, que implica frequentemente mudança de leis – incluindo as leis das licenças de parentalidade. Mas mais do que isso, Dorothee tem alguns receios quanto ao sistema de saúde.

«O sistema [de saúde na Roménia] é negligente. Neste momento, depois da minha experiência, não penso em ter um segundo filho», diz Dorothee.

Em 2015, a Roménia teve a taxa de mortalidade infantil mais elevada da Europa, com 7,6 mortes por mil nascimentos [ver infografia abaixo]. Além disso, existe uma cultura de subornos no sistema de saúde, o que pode transformar a experiência da gravidez num pesadelo.

Dorothee desconhecia esta prática até há seis meses, quando, depois do nascimento de Luka, foi impedida de ver o recém-nascido durante três dias, por, considera agora, não ter sabido subornar enfermeiros e assistentes num hospital no centro de Bucareste. «Foi tudo tão arbitrário. O sistema é negligente. Neste momento, depois da minha experiência, não penso em ter um segundo filho», diz.

França é também um exemplo de um país maternocêntrico, ainda que com uma importante diferença, o que, de certa forma, foi permitindo taxas de fertilidade elevadas. Até há alguns anos, a França era o único país da União Europeia (UE) onde o número de filhos por mulher assegurava a renovação das gerações. Isso já não é assim, mas é o que continua a apresentar o índice de fertilidade mais elevado da UE, 1,88 filhos por mulher [ver infografia abaixo].

«Apesar de França não ser um país muito igualitário em termos de maternidade, o caso francês é diferente dos outros devido a um modelo histórico em que o Estado chama a si a educação das crianças», diz Vanessa Cunha, socióloga no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-UL).

Sobre ser mãe em França, Sandra começa por notar que existe uma grande diferença entre ser mãe em «Paris e fora de Paris», onde o acesso a creches é mais facilitado.

Sandra Fernandes, 40 anos, vive em Paris, onde é diretora de comunicação da Splio, uma empresa de marketing. Sandra é luso-descendente, vem a Portugal todos os anos, mas considera-se francesa. E é mãe de duas raparigas, Petra, de 4 anos, e Janis, de 2.

Sobre ser mãe em França, Sandra começa por notar que existe uma grande diferença entre ser mãe em «Paris e fora de Paris», onde o acesso a creches é mais facilitado. Sandra não conseguiu matricular filhas numa creche na capital francesa e como os pais vivem a 120 quilómetros de distância, não podendo ajudar no cuidado diário das netas, a lusodescendente encontrou a alternativa de contratar uma ama, partilhando o ordenado desta com uma outra família. O Estado francês ajuda, permitindo a dedução nos impostos.

«O meu marido só teve direito a 11 dias de licença de paternidade. Tudo o que tem a ver com a gestão das crianças sou eu que faço. Há muito a fazer em termos de igualdade de género em França.»

Não se queixando de discriminação na empresa onde trabalha, Sandra diz que o peso da maternidade cai em grande parte sobre a mulher. «O meu marido só teve direito a 11 dias de licença de paternidade e apesar de ele ajudar muito em casa, tudo o que tem a ver com a gestão das crianças sou eu que faço. Há muito a fazer em termos de igualdade de género em França. Eu tenho a sorte de ter as condições necessárias para empregar uma ama, mas nem todos têm a mesma sorte. O Estado ajuda muito, mas em termos de mentalidade há uma grande distância a percorrer para chegar ao mesmo nível que a Escandinávia», diz.

Claudia Bellante é uma jornalista free­lancer italiana de 38 anos e mãe de uma menina de 18 meses, Tina. Antes de engravidar, Claudia vivia com o marido, também jornalista freelancer, em Barcelona.

Quando soube que o agregado familiar ia crescer, o casal decidiu mudar-se para Milão, por considerar que ali teria o apoio da família, indispensável para o modo de vida que os dois escolheram e algo a que não poderiam recorrer estando em Barcelona.

Em Itália, os pais têm direito a dois dias de licença de paternidade. Além da ajuda da mãe de Claudia, a pequena Tina está também numa creche, que custa aos pais 242 euros por mês.

A ordem dos jornalistas em Itália atribuiu a Claudia uma bolsa de maternidade de seis mil euros, o equivalente aos 1100 euros que a italiana aufere em média por mês. Esse valor permitiu-lhe gozar uma espécie de licença de maternidade durante cinco meses. O marido de Claudia, Mirko, não estava inscrito na ordem e não teve direito ao gozo de licença.

Em Itália, os pais têm direito a dois dias de licença de paternidade. Além da ajuda da mãe de Claudia, a pequena Tina está também numa creche, que custa aos pais 242 euros por mês.

O modelo italiano de maternidade continua a ser considerado tradicional e muito centrado na figura da mãe. «É ainda o modelo da mãe em casa e do pai provedor, em que as mulheres tendem a dedicar-se à maternidade e a sair do mercado de trabalho», diz Mafalda Leitão.

A ideia de as italianas deixarem o trabalho para se dedicarem à maternidade já não se adequa à realidade, diz Claudia, principalmente na sua geração, mil-eurista e precária.

Em Itália, a taxa de participação feminina no mercado de trabalho continua a ser mais baixa. Menos de metade das mulheres em idade laboral estão a trabalhar, segundo a OCDE. A mãe de Claudia deixou de trabalhar para cuidar dela, mas a jornalista italiana parte da sua experiência e da das amigas mães que vivem em Itália para dizer que essa ideia de as italianas deixarem o trabalho para se dedicarem à maternidade já não se adequa à realidade, principalmente na sua geração, mil-eurista e precária.

Claudia diz que a experiência de maternidade numa cidade como Milão, com um dos custos de vida mais caros do país «não é maravilhosa, é menos má», mas só é possível porque os dois membros do casal trabalham.

Mas mesmo quando os dois trabalham, uma das questões de fundo em torno da maternidade e da igualdade de género está relacionada com a diferença entre «o trabalho pago e público dos homens e o trabalho invisível, como cuidadoras, que continua a ficar a cargo das mulheres», como explica Mafalda Leitão.

«A conciliação entre o trabalho público e os cuidados em casa é feita à custa das mães e das avós – o trabalho não pago é um dos pilares do Estado providência – ou de mulheres subcontratadas para fazer este serviço», no caso das famílias que podem fazer essa despesa, diz. A investigadora acrescenta que «ainda se considera que é penalizador para uma criança pequena se a sua mãe trabalhar fora de casa».

No momento da licença de parentalidade, a alemã Sarah esteve sem trabalhar durante 14 meses, recebendo 1700 euros por mês.

Como se muda esta estrutura e estas identificações de género? Como se altera a forma como as empresas lidam com a ausência e a conciliação familiar? Como se transforma o nascimento numa questão efetiva de parentalidade e não apenas de maternidade?

Sarah Maria Esther, 31 anos, foi mãe de Mattis há dois anos e meio e é a única mãe entrevistada que falou em igualdade total na parentalidade. Sarah vive com o namorado, Veit, e o filho em Nuremberga, na Alemanha.

O casal recorreu a uma doula porque preferiu ter um parto «mais privado» e porque Sarah acha que o hospital é o local onde se vai quando se está doente, não querendo associar a sua gravidez a uma doença. O seguro de saúde nacional cobriu os custos do internamento na casa de partos e o casal pagou 230 euros à doula. Sarah está novamente grávida e o casal quer repetir a experiência.

No momento da licença de parentalidade, Sarah esteve sem trabalhar durante 14 meses, recebendo 1700 euros por mês. Na Alemanha, conta Sarah, o normal é os pais alemães tirarem duas semanas. Mas o namorado teve a «sorte» de a sua empresa lhe ter permitido tirar seis meses para ficar em casa com o bebé.

«Num cenário típico na Alemanha, a mãe trabalha até seis semanas antes do parto, o marido está em casa uma semana ou duas depois. A mãe fica sozinha e depois de um ano e meio volta ao trabalho e a maternidade é um trabalho só da mãe»

«O patrão do meu namorado é um bom patrão. Se permites a um trabalhador ficar seis meses com o bebé ele vai ser mais feliz. Num cenário típico na Alemanha, a mãe trabalha até seis semanas antes do parto, o marido está em casa uma semana ou duas depois. A mãe fica sozinha e depois de um ano e meio volta ao trabalho e a maternidade é um trabalho só da mãe», diz Sarah.

Como resultado da convivência logo após o nascimento de Mattis e de uma forma algo alternativa de conceber a parentalidade, Sarah diz não sentir que o ónus do cuidado ao bebé recaia sobre ela. «Decidimos que queríamos começar a nossa nova vida juntos. Foi ótimo poder dar as boas-vindas a uma criança juntos. Fomos muito sortudos. E agora é tudo totalmente igual e dividido», diz. Sarah é assistente freelancer num jardim-de-infância, recebendo uma média de 2100 euros por mês. Veit é engenheiro.

Será que o caso de Sarah e de Veit pode ser reproduzido e tornado norma, em vez de ser encarado como uma questão de sorte? Para Mafalda Leitão isso é possível, sim, através da legislação. «A alteração desta situação é uma questão do Estado e política pública porque é uma questão de justiça e igualdade social», diz a investigadora do OFAP.

«Ao nível das leis, tanto Portugal como os países escandinavos têm o objetivo de promover a igualdade de género e permitir que homens e mulheres tenham uma harmonização das suas responsabilidades familiares e parentais», explica a investigadora Vanessa Cunha

A forma mais fácil e imediata de legislar nesse sentido é agindo sobre as licenças de parentalidade, como já foi referido. E nesse aspeto, Portugal pertence, no conjunto dos países europeus, a uma categoria própria, uma vez que não encaixa no modelo seguido pelos outros países do sul da Europa, apresentando uma legislação que se aproxima dos países nórdicos.

«Ao nível da legislação, tanto Portugal como os países escandinavos expressam o objetivo de promover a igualdade de género e permitir que homens e mulheres tenham uma harmonização das suas responsabilidades familiares e parentais», diz Vanessa Cunha.

A diferença entre Portugal e a Dinamarca ou a Suécia, continua a investigadora, é «não ter dinheiro para pôr em prática» tudo o que pretende em termos de Estado social. Mesmo ao nível da taxa de cobertura de creches, Portugal está acima das metas de Barcelona, apresentando uma das médias mais altas da Europa.

Em Portugal, mesmo as mães modernas, com estudos superiores e consciência da necessidade da igualdade de género, replicam o modelo de que a mãe é o centro da vida do bebé.

Apesar de tudo isto, continuamos a alimentar a imagem de Portugal como um país conservador e desigual do ponto de vista da igualdade de género. Porquê? «Porque coexistem na sociedade portuguesa gerações que fizeram transições para a vida adulta em contextos radicalmente opostos. Aqueles que viveram sob vigência do Estado Novo têm um modelo de subserviência na vida em casal. As gerações mais recentes são mais escolarizadas e por isso mais modernas nas suas práticas e atitudes», diz Vanessa Cunha.

Mas mesmo as mães modernas, com estudos superiores e consciência da necessidade da igualdade de género, replicam o modelo de que a mãe é o centro da vida do bebé.

Rita Braga, 42 anos, é bancária e vive em Lisboa. Há três anos teve uma filha, Joana. Dentro de semanas dará à luz a segunda filha, que se chamará Carolina. Rita e o companheiro, Nuno, trabalham para a mesma entidade bancária, que, segundo Rita, tem sido «impecável» e coloca a família como prioridade.

Rita acha que esta situação é uma exceção e conta a história de uma amiga que enfrentou um processo de despedimento devido à gravidez. Após o nascimento de Joana, Rita tirou quatro meses e Nuno tirou um mês. Por mês, Rita ganha cerca de 2600 euros, o que permite também pagar uma creche privada em Lisboa no valor de 580 euros por mês. O casal quer que a filha mais nova frequente a mesma creche. Mas antes disso, há a licença para gozar.

Desta vez, Nuno vai tirar um mês em comum com a mãe, que depois fica quatro meses sozinha em casa. Quanto ao último mês do pai, o casal vai procurar alguma flexibilidade junto da entidade patronal, para que a mãe possa gozar alguns dias.

«Muitas vezes a responsabilidade não é dos chefes nem das leis, mas nossa e da cultura da mãe-galinha.»

Rita não acha que a questão da igualdade na parentalidade esteja dependente das licenças. «Acho que é muito importante que ele passe tempo com elas, mas não penso que tenha de ser na licença em si. Até porque vejo os bebés pequeninos muito agarrados à mãe», diz.

E é neste ponto que Rita acaba por confessar que, apesar de se sentir uma sortuda, identifica também que a parentalidade lhe pesa mais. «Quando ela está bem é igual estar comigo ou com o pai. Ele escolhe as roupas, dá refeições, faz tudo. Mas quando ela está doente, sou eu que avanço e acho que nesta fase é indiferente ir eu ou ele ao hospital. E se eu me puser mesmo a pensar também sei que se alguém tiver de ficar para trás serei eu. Se houver uma reunião fora de Lisboa e alguém avançar, será o Nuno a avançar», diz Rita.

Ao dizer tudo isto em voz alta, Rita pensa um pouco melhor sobre o assunto e olha para dentro. «Acho que isto é culpa nossa, é um hábito de família. Eu acabo por ficar embriagada neste papel de mãe e muitas vezes a responsabilidade não é dos chefes, mas da cultura da mãe-galinha. Algumas coisas já serão difíceis de mudar com a mais velha. Mas agora vou tentar algo diferente com a mais nova.»