António Marto, perfil do novo príncipe da Igreja

Rui Miguel Pedrosa/Lusa

Texto de Alexandra Tavares-Teles

Nunca lhe passou pela cabeça ser bispo – e muito menos de Fátima – e nunca imaginou que pudesse ser elevado a príncipe da Igreja. Pois bem: António Marta, bispo de Leiria-Fátima, acaba de ser criado cardeal, juntando-se assim aos “romanos” José Saraiva Martins e Manuel Monteiro de Castro, e a Manuel Clemente, o único em território português.

A escolha papal não é inocente. Ao contrário do patriarca de Lisboa, pouco aderente, por vezes reticente, às reformas do Papa, António Marto, que escolheu como lema para bispo “servidor da vossa alegria”, é claramente um “franciscano”. E afirma-o: “A reforma é necessária e é para levar para a frente.”

O padre e teólogo Anselmo Borges, em declarações à “Notícias Magazine”, considera a escolha como “o reconhecimento, por parte do Papa, da importância de Fátima”. Mas que visa, também, “equilibrar, num sentido mais ‘franciscano’, a igreja portuguesa, bastante paralisada e com pouco vigor”. Amigo e antigo colega na Pontifícia Universidade Gregoriana (PUG), Borges reconhece que o escolhido “perdeu alguma da capacidade crítica que tinha”, mas sem comprometer o essencial: “É um cristão convicto, no sentido de acreditar convictamente no Deus de Jesus.”

António Marto nasce em Tronco, Chaves, estuda Humanidades e Teologia no Seminário de Vila Real e no Seminário Maior do Porto. Aguarda a ordenação (licencia-se aos 22, dois anos antes da idade mínima obrigatória) a trabalhar na metalurgia. Aprende a fazer peças para motores de automóveis e de aviões, conhece os problemas do operariado. A ordenação chega a 7 de novembro de 1971, já em Roma, aluno da PUG. Aí conhece Joseph Ratzinger, que o acompanha na preparação para o doutoramento (1977). De regresso a Portugal, dá aulas até ser nomeado, em 2000, bispo auxiliar da Arquidiocese de Braga. Quatro anos depois é nomeado bispo de Viseu e, em 2006, de Leiria-Fátima. Uma surpresa.

Cético em relação a Fátima e descrente da religiosidade popular, converte-se em 1997, ‘profundamente impressionado’ com o livro “Memórias da Irmã Lúcia”. Crente na “seriedade da mensagem” é o bispo do Centenário das Aparições e anfitrião de dois Papas. A notícia da subida ao patamar purpurado deixa António Marto “com vontade de chorar”. E mexe com a Igreja Católica portuguesa: agora não basta dizer “o cardeal disse ou fez”, é preciso esclarecer de qual deles – António Marto ou Manuel Clemente – se está a falar. O que pode vir a fazer toda a diferença.