Ana Milhazes: a socióloga que simplifica a vida

Texto de Sara Dias Oliveira

Tem um kit que leva para todo o lado. Um guardanapo de pano, uma palhinha de aço inoxidável, dois paus de bambu, uma colher de sopa, um garfo e uma faca embrulhados num pedaço de tecido.

Na mala, uma garrafa de metal para água da torneira que enche em qualquer lado e um copo que encolhe e estica. O lixo que produziu desde junho do ano passado cabe num frasco de vidro: cerdas de escovas de dentes, autocolantes de frutas e legumes, etiquetas de roupa, lentes de contacto. O que sobrou da compostagem. O resto seguiu para a reciclagem. “Temos de cuidar do planeta que está aqui para nós. Deixamos a nossa pegada e se estamos aqui temos de fazer a diferença”, comenta.

Ana Milhazes, socióloga, 33 anos, vive no Porto, é professora de ioga e de meditação e é o rosto do Lixo Zero Portugal. Quer tornar o mundo um lugar melhor. Anda pelo país, por escolas, empresas, associações, a falar de hábitos saudáveis e sustentáveis e a partilhar as suas rotinas.

Usa pasta de dentes de carvão vegetal, escova de dentes de bambu, esfregões de fibras naturais, copo menstrual, pensos de pano, discos desmaquilhantes de tecido para substituir o algodão, e óleo de coco para cozinhar, limpar a casa e hidratar a pele. Não aceita sacos de plástico, reutiliza frascos de vidro, compra o que pode a granel, participa em apanhas de lixo nas praias.

“Se usarmos versões sólidas, não precisamos de embalagens”, diz. É vegetariana há 16 anos. Acaba de se envolver num projeto de sensibilização para evitar o uso de descartáveis, porque melhor do que limpar é não desperdiçar ou sujar, com a associação Cultura Curto Espaço, na praia da Aguda, em Vila Nova de Gaia.

“Estou na fase mais feliz da minha vida. Sei que é difícil lutar contra a corrente. Mas sinto-me muito mais feliz e realizada”, conta. E já não lhe chamam maluca quando abre o seu kit no restaurante.

Começou a mudar de vida em 2011 com pesquisas sobre o estilo minimalista. A lista para comprar caixotes para guardar o que não usava foi para a reciclagem. Deu ou vendeu o que não utilizava, afastou-se das pessoas que lhe sugavam energia. “E aprendi a dizer a palavra não.” Decidiu viver melhor com menos. “Ter o mínimo necessário.”

Em 2012, criou o blogue Ana Go Slowly. Em 2016, criou a primeira comunidade de desperdício zero em Portugal. Em novembro do ano passado, despediu-se do emprego de gestora de projetos na área das tecnologias de informação, depois de um apagão na ponte da Arrábida em que, por segundos, viu tudo escuro ao volante do carro.

O diagnóstico de burnout e a depressão não tardaram. Sentiu que tinha de abrandar. Gostava do emprego e dos colegas, mas o ritmo de trabalho e os projetos paralelos tornavam os dias pesados. Hoje vive mais devagar. “Tenho uma vida mais simples. Se reduzimos o consumo, reduzimos o lixo.”