Ajudar nas tarefas de casa deixa os homens menos agressivos

Texto de Filomena Abreu

No Ruanda, em África, a cultura ainda diz que os homens mandam nas mulheres. Aliás, elas servem apenas para ter filhos e cuidar das casas. Mas um novo projeto está a mudar mentalidades. Graças a ele, Muhoza Jean Pierre e Musabyimana Delphine vivem finalmente em paz, ao fim de dez anos de casamento.

Muhoza, de 32 anos, casou com a mulher apenas para ela lhe dar filhos e cuidar deles. Era frequente bater-lhe e claro que as tarefas domésticas eram trabalho de Delphine. O jovem apenas seguia a tradição. Tinha sido assim com o seu pai e com os homens que conhecida.

Assim, contou ele à BBC: “Se eu chegasse em casa e visse que alguma coisa estava por fazer, eu batia-lhe. Chamava-a de preguiçosa, dizia-lhe que era inútil e que deveria voltar para a casa dos pais”. Delphine apanhava e calava-se. Contudo, algo veio quebrar essa rotina de martírio. Um programa de intervenção na comunidade onde o casal vive, em Mwulire, no leste do país, está a incentivar os homens a participarem nas tarefas domésticas e inclusivamente a cuidar das crianças.

O projeto chama-se Bandebereho na língua local, o Kinyarwanda. Em português pode ser traduzido para “Exemplo” e está a mudar comportamentos abusivos, como era o caso de Muhoza. Depois de aprender a limpar a casa, a cozinhar e a cuidar dos filhos, deixou de bater em Delphine e, como assume que agora tem uma vida mais feliz, está a incentivar outros homens da comunidade a seguirem-lhes os passos.

Porém, não foi um percurso fácil. Muhoza teve de lidar com a pressão dos amigos que o tentavam desviar do caminho que ele estava empenhado em seguir. Diziam-lhe coisas como: “Homens a sério não cozinham”. E a família até achava que Delphine devia estar a drogá-lo e que as tarefas que ele fazia enfraqueciam o papel dele enquanto homem.

No entanto ele não se deixou abalar porque viu os benefícios que a mudança de atitude estava a trazer para dentro da sua casa. Os filhos e a mulher estavam cada vez mais próximos dele. E o facto de Delphine poder ter tempo para sair e ir vender no mercado, além de trazer mais dinheiro para casa, melhorou o bem-estar dela, uma vez que o medo do marido desapareceu e se sentiu mais livre.

O receio de Delphine apanhar do marido todos os dias foi transformado em carinho e respeito. “Ela tratava-me mal porque eu também a maltratava, mas agora conversamos e fazemos acordos. Eu libertei-a. Agora, ela trabalha e eu também. Antes, eu acreditava que ela tinha de ficar em casa e estar disponível sempre que eu precisasse dela”, disse satisfeito Muhoza à BBC.

Delphine sai de casa, todos os dias, às cinco da manhã para vender fruta no mercado, enquanto o marido fica em casa a cuida dos quatro filhos pequenos do casal. E quando chega a casa tem a comida pronta.

Este projeto foi desenvolvido originalmente na América Latina pela campanha MenCare, que defende que a equidade só será atingida quando os homens dividirem igualmente o trabalho doméstico e o cuidado das crianças.

Um estudo que analisou os casais participantes do projeto descobriu que dois anos depois de terem aulas sobre como cuidar das crianças no Ruanda, os homens tornaram-se menos propensos a usar violência contra as suas companheiras do que os homens que não participaram nas aulas. Mas o mesmo estudo identificou também que uma em cada três mulheres cujos parceiros participaram do programa ainda sofriam de violência doméstica.

O Centro de Recursos para Homens de Ruanda, que está na génese
da implementação deste projeto no país, quer que a iniciativa Bandebereho seja amplamente adotada pelas comunidades e pelo Governo.