Yael Adler: «Não sei se já reparou, mas toda a gente que usa cremes para as rugas tem rugas»

Entrevista Catarina Pires | Fotografia Reinaldo Rodrigues/Global Imagens

A pele é o nosso segundo cérebro?
É um grande ajudante. Um porteiro, digamos assim, que informa o cérebro sobre tudo o que se passa à sua volta. A pele contém tantas terminações nervosas que permite ao cérebro saber mais sobre o meio envolvente e comunica com quem nos rodeia – amigos, companheiros, família, colegas de trabalho.

Como?
Mudando de cor, ficando com manchas ou prurido, empalidecendo, corando, arrepiando-se… Estes sintomas são provocados pelo sistema nervoso e estão ligados às emoções. A pele existe para sentir o toque, para tocar e ser tocada. Temos 2500 recetores por centímetro quadrado nas pontas dos nossos dedos, ou seja, pode, de facto, ser recolhida informação detalhada quando tocamos. Mas não se trata só de recolher informação. Temos, por exemplo, uma hormona chamada oxitocina, conhecida como «hormona da fidelidade», que é libertada com o toque da pele e tem um papel fundamental na nossa relação com os outros – aproxima-nos, torna-nos mais apaixonados, cria intimidade, torna-nos mais pacientes, mais diplomáticos, menos agressivos e diminui os níveis de cortisol, a hormona do stress.

Hoje, com os smartphones, as redes sociais ou apps como o Tinder e afins, dá ideia que as pessoas estão ligadas a muita gente mas têm cada vez menos contacto físico. Isso é um problema? Torna mais difíceis as relações e a criação de laços?
Completamente. Descobri, por exemplo, que existe agora uma app através da qual pode acariciar-se uma vagina. Isto é muito estranho. Quando a nossa vida sexual passa por bonecas ou apps ou filmes e não por outro ser humano, as informações, não só o toque, mas também o cheiro, as hormonas libertadas, enfim, o diálogo bioquímico desaparece. Por isso, sim, a falta de toque influencia as nossas relações de uma forma negativa. A falta de contacto físico contribui para o aumento das depressões, do stress e da agressividade.

Com tantas ligações da pele ao cérebro, como é que ainda não foi inventado um creme antidepressivo?
O toque tem muito menos efeitos secundário. Porquê inventar um creme, que custaria uma fortuna, se pode ter o mesmo resultado de graça e sem efeitos secundários?

«Para mim, a pele é “o” órgão sexual. Todo o nosso erotismo está relacionado com a pele. Não há sexo sem pele ou sem toque.»

O sexo faz bem à pele. Porquê?
O sexo aumenta as hormonas femininas ou masculinas, o que faz bem à pele, e diminui o cortisol, a tal hormona do stress, que a afeta negativamente. Tenho um paciente de há muitos anos que foi ao meu consultório e eu perguntei-lhe: «Uau, esteve de férias?» Ele respondeu: «Não, estou apaixonado.» A pele dele mudou. Nas mulheres, o aumento dos níveis de estrogénio combate as borbulhas, torna a pele mais macia e fortalece o cabelo. Nos homens, a testosterona fortalece os músculos e a barba, embora faça perder cabelo. Há estudos que mostram que o sémen quando «aplicado» por via intravaginal tem efeitos antidepressivos nas mulheres (não estudaram a administração oral). E sabe-se que o sexo reduz o risco de enfarte do miocárdio e de osteoporose, assim como a intensidade das depressões. A natureza inventou o sexo para que fosse muito praticado, para garantir a continuação da espécie. E faz bem à saúde, física e mental.

A pele pode ser considerada um órgão sexual?
Claro, todo o nosso erotismo está relacionado com a pele. Não há sexo sem pele ou sem toque. E as nossas zonas erógenas, os órgãos genitais, o ânus, os mamilos, etc., todos estão cobertos de pele e é esta que contém os recetores sensoriais e terminações nervosas que proporcionam o prazer. Por isso, para mim, a pele é «o» órgão sexual.

«Em geral, uma pele saudável reflete uma alimentação saudável e uma vida feliz. O inverso também é verdadeiro.»

O que é que a pele diz sobre nós?
Se estou chocada, fico pálida, se estou irritada, fico vermelha, se estou excitada, fico com manchas, se estou emocionada, a minha pele arrepia-se, se estou em stress, suo. Isto são as reações agudas. Em geral, uma pele saudável reflete uma alimentação saudável e uma vida feliz. O inverso também é verdadeiro. Há reações crónicas da pele, relacionadas com o stress. O stress é uma boa reação, que foi inventada pela natureza para fugirmos quando se aproximava um urso. Hoje não temos o urso, mas temos impostos, contas, chefes, prazos, vizinhos, diferentes factores de stress, sobretudo em vidas profissionais aceleradas, com e-mails a caírem, todos para responder nos próximos cinco minutos. E reagimos da mesma maneira – libertando cortisol e cortisol e cortisol. Demasiado cortisol conduz ao enfraquecimento do sistema imunitário e a um enorme leque de reações como, por exemplo, herpes, fungos, eczema, acne, prurido, pele seca.

Em Portugal, temos uma expressão para explicar quando adoramos ou detestamos alguém intuitivamente: «É uma questão de pele.» Isto faz sentido?
Faz, claro. Na Alemanha, não dizemos que é só uma questão de pele, mas também de olfato. E isto é importante porque a pele não só tem o seu próprio cheiro, que varia de pessoa para pessoa, como tem olfato. O cheiro da pele de cada um é criado pelas glândulas de odor, influenciadas pelas hormonas, que são diferentes em cada pessoa, e pelas bactérias que vivem na nossa pele e comem o nosso suor e partículas da nossa pele, as digerem e libertam com diferentes odores, que atraem ou repelem. O cheiro transporta informação: por exemplo, quando as mulheres estão a ovular libertam essa informação através do cheiro da pele, daí que a pílula contracetiva altere o odor corporal e o olfato da mulher; da mesma forma, o cheiro evita a atração sexual entre pessoas com grandes semelhanças genéticas, prevenindo o incesto (não a cem por cento, mas em grande medida); outra informação transportada pela pele diz respeito aos nossos grupos sanguíneos, informação que os mosquitos agradecem muitíssimo.

«Os mosquitos adoram o grupo sanguíneo 0, adoram mulheres grávidas, adoram suor, adoram alguns perfumes e adoram o CO2 da respiração.»

Essa era uma das perguntas que tinha para lhe fazer. Porque é que algumas pessoas são massacradas por estes insetos e outras passam incólumes?
Os mosquitos adoram o grupo sanguíneo 0, adoram mulheres grávidas, adoram suor, adoram alguns perfumes e adoram o CO2 da respiração. Se for uma mulher grávida a fazer desporto numa floresta, com grupo sanguíneo 0 suando e usando determinados perfumes será a vítima perfeita.

No seu livro diz que não precisamos de cosméticos: cremes, sabonetes, champôs, etc. O que devemos então fazer para cuidar da pele e mantê-la saudável?
Devemos lembrar-nos sempre de que o nosso corpo e a nossa pele ainda vivem na idade da pedra. Desde então, não houve grandes alterações em termos genéticos ou das barreiras de proteção. Por isso, a barreira natural que faz a pele proteger-nos de ataques como os alergénios ou o sol ou a desidratação ou bactérias ou germes ou viroses ou químicos é a mesma que não deixa entrar as substâncias antienvelhecimento contidas nos cremes contra as rugas. Estas substâncias nunca chegarão ao segundo nível da pele (a derme), onde seriam necessárias e fariam efeito. E aí a melhor forma de chegar é por dentro, através da alimentação [ver caixa]. Não sei se já reparou, mas toda a gente que usa cremes para as rugas tem rugas.

«Para perceber o que o sol faz à pele, ponha-se em frente ao espelho e compare a pele da cara com a pele do rabo, que está sempre protegida do sol. A diferença é óbvia.»

Afirma então que não há creme que proteja a pele?
Os cremes que não entopem os poros, que não contêm óleos minerais, mas sim lípidos semelhantes aos da pele, assim como os fabricados segundo o princípio DMS (Derma Membrane Structure), uma imitação dos lípidos da epiderme, que os aproxima à barreira protetora natural da pele, são bons. Mas os únicos cremes que podem melhorar a proteção da pele são os protetores solares. Passamos, hoje, mais tempo ao sol e a nossa pele não está preparada para nos proteger deste. Em termos evolutivos, aquilo que nos poderia proteger naturalmente – a produção de melanina e o fortalecimento da superfície da pele – não aconteceu porque andamos vestidos e passamos muito tempo dentro de casa ou do escritório. Daí que os raios ultravioleta entrem na pele e causem danos. Para perceber o que o sol faz à pele, ponha-se em frente ao espelho e compare a pele da cara com a pele do rabo, que está sempre protegida do sol, e perceberá a diferença. O rabo tem a pele lisa enquanto a cara tem vasos e sinais e sardas e borbulhas e rugas – isso tem que ver com a exposição ao sol.

O protetor solar, segundo os especialistas, é o recurso menos eficaz contra o cancro de pele, que tem vindo a aumentar. O que fazer para prevenir?
O mais importante é criar conhecimento, dar informação. As crianças estão em maior risco, porque a sua pele tem menos defesas. Deve evitar-se a exposição ao sol nas horas em que este incide mais diretamente sobre a Terra, e usar roupa, chapéus de aba larga, óculos de sol e protetor solar. A cara é a parte do corpo que está sempre exposta, a vida toda, e é essencial protegê-la com protetor solar. A vitamina D também é muito importante. O corpo produz vitamina D, que nos protege dos UVB, principais responsáveis pelas queimaduras solares e cancro de pele, por isso devemos perceber se os nossos níveis de vitamina D são os necessários para desempenhar esse papel. Se não forem, devemos tomar suplementos desta vitamina. Finalmente, é importante estar atento aos sinais na pele e à sua evolução e verificar periodicamente. Se um sinal é assimétrico, tem contornos irregulares, várias cores e está a crescer deve ser visto por um médico.

«A barreira natural que faz a pele proteger-nos de alergénios, sol, desidratação, etc. é a mesma que não deixa entrar as substâncias antienvelhecimento dos cremes contra as rugas.»

Voltando aos cosméticos, não devía­mos tomar banho todos os dias, pelo menos?
Na verdade, não é necessário. Não é preciso tomar banho todos os dias para ter uma pele saudável. Há estudos que provam que não o fazendo não só não desenvolve bactérias nocivas na pele como até desenvolve novas bactérias protetoras, que são eliminadas com o banho. Claro que hoje temos uma relação diferente com o cheiro natural da pele e não queremos tê-lo, mas o mau cheiro é devido sobretudo às roupas que usamos. As fibras sintéticas são mais propícias a criá-lo do que as fibras naturais.

Mas podemos tomar banho todos os dias ou não?
Pode tomar duche todos os dias, desde que o faça sobretudo com água. A água tem um pH neutro e não torna a pele tão seca como os sabonetes, que são alcalinos e destroem a barreira protetora natural da pele. O pH da pele é de 5 e o do sabonete é de 7, 8, 9, o que destrói o pH da pele, abrindo a porta a bactérias nocivas. Se não conseguir deixar de usar sabonete ou gel de banho e champô, deve acautelar que tenham pH ácido e não tenham perfume, corantes e conservantes/parabenos.

«Sou muito taxativa na recusa de perfumes, solários e tatuagens, mas quanto ao botox não sou tanto.»

Não podemos usar sabonete, mas podemos usar botox?
Sou muito taxativa na recusa de perfumes, solários e tatuagens, mas quanto ao botox não sou tanto. Apesar de ser uma toxina forte, é altamente diluída e usada como medicamento desde os anos 1970 para tratar, entre outros problemas, o estrabismo, o espasmo hemifacial ou o torcicolo, uma vez que diminui a contração muscular. De repente, no final dos anos oitenta descobriu-se que o botox podia corrigir rugas e foi importado da área médica para a área cosmética. É rapidamente absorvido pelo corpo, não fica a destruí-lo e quase não tem efeitos secundários. Na verdade, o pior efeito secundário, quando é usado em cosmética, é que a paralisia afeta a expressão facial e isso pode reduzir a empatia por parte das outras pessoas, que não conseguem perceber na cara o estado de espírito.

Não lhe é estranho isso?
Não, se for bem feito. Mas atenção: eu não acho que as rugas devam ser tratadas. Simplesmente, porque não as acho feias. Nós mudamos e as rugas fazem parte do processo natural de envelhecimento. Devemos dar graças por tê-las, significa que estamos vivos. Uma pessoa com um rosto expressivo é sempre bonita, para mim. Adoro ler as expressões na cara das pessoas. Ter uma cara paralisada é absurdo. E cria distância.

«Se injetar cores de tatuagem, cheias de substâncias tóxicas estas entram na derme, daí seguem para os canais linfáticos e para os órgãos e não há forma de as absorver. É uma bomba relógio.»

E a sua recusa absoluta das tatuagens deve-se a quê?
As cores usadas nas tatuagens são tóxicas. Umas são mais tóxicas do que outras, mas não existe controlo científico, como existe com os medicamentos. Se injetar um medicamento, sabe quais serão os efeitos secundários nos vários órgãos. Se injetar cores de tatuagem, cheias de substâncias tóxicas como alumínio, arsénico, cádmio, corantes e conservantes, que são cancerígenos, estas entram na segunda camada da pele (a derme), daí seguem para os canais linfáticos e para os órgãos e não há forma de as absorver. É uma bomba relógio dentro do corpo. Já para não falar nas possíveis inflamações ou infeções que podem ser transmitidas pelas agulhas que os profissionais das tatuagens utilizam. Esta não é uma profissão médica e os tatuadores muitas vezes não conhecem os cuidados a ter para prevenir as infeções.

Não quer ter rugas? Coma molho de tomate e beba sumo de cenoura

No livro O Fascinante Mundo da Pele, a dermatologista alemã Yael Adler dedica a Parte IV, cerca de 20 páginas, à importância que a alimentação tem na manutenção de uma pele saudável, passando a pente fino macronutrientes, micronutrientes, os alimentos que fazem bem e os que fazem mal e as doenças cutâneas relacionadas com o que comemos.

A especialista garante que a melhor proteção da pele e a melhor fórmula antien­ve­lhecimento partem do interior do corpo e conseguem aquilo que nenhum creme consegue: chegar à derme, a segunda camada da pele, onde as substâncias antirrugas podem de facto atuar com resultados.

Comer alimentos com muitas cores, como frutas e vegetais, tão presentes na nossa dieta mediterrânica, é uma das melhores formas de proteção. «No que diz respeito à nossa pele, substâncias como o betacaroteno e o licopeno possuem uma espécie de superpoder», diz Yael Adler.

«O molho ou sumo de tomate, que tem licopeno, um antioxidante reparador essencial, é mais eficaz para a pele do que qualquer creme caro. E um copo de sumo de cenoura por dia – que torna a pele um pouco mais alaranjada – aumenta em duas ou três vezes o tempo que a pele aguenta de exposição solar.»