Lembra-se do Vitinho? Vai voltar

Texto de Cláudia Pinto

«Está na hora da caminha, vamos lá dormir, que lá fora, as estrelas dormem a sorrir. E amanhã cedinho, bem cedinho tu vais ver, acordas mais forte e mais esperto, isso é crescer. Boa noite, sonhos lindos. Adeus e até amanhã

A letra da canção ficou na memória dos portugueses e acompanhou mais do que uma geração no final da década de 1980: a dos que iam para a cama quando o simpático boneco aparecia na RTP 1; a dos que já eram «muito crescidos» para se deitarem com o Vitinho mas tinham irmãos mais novos; e a dos pais e avós que ainda hoje sabem de cor aqueles versos.

Durante dez anos, era o Vitinho que dava o mote para as crianças se irem deitar. Às nove da noite em ponto, pais e filhos sabiam que estava na hora de ir para a cama. O Vitinho tornou-se uma espécie de sinal horário.

A 16 de outubro passaram 31 anos da estreia da rubrica Boa Noite na televisão nacional. O que muitos não sabem, ou não se recordam, é que o Vitinho tinha nascido dois anos antes, numa proposta da agência de publicidade EPG para a campanha da linha de cereais Miluvit, da Milupa. «O primeiro esboço, em papel vegetal, é de 1984», explica José Maria Pimentel, o «pai» do Vitinho. «Pretendia-se criar uma personagem que enternecesse os compradores (os pais) mas que tivesse credibilidade e carisma suficiente para atrair também os miúdos, consumidores do produto», explica o criativo, professor e designer, hoje com 61 anos. Tinha 31 quando criou aquele menino de cerca de 4 anos, sorridente, com um chapéu de palha e jardineiras com monograma no peito, que andava descalço no meio da natureza.

Às nove da noite em ponto, na RTP, pais e filhos sabiam que estava na hora de ir para a cama. o vitinho tornou-se uma espécie de sinal horário.

O que se seguiu foi totalmente inesperado. O boneco a bocejar e a ir para a cama ao som da canção Boa Noite, Vitinho (com música de António Calvário e letra de João Mendes Martins, na altura diretor-geral da Milupa) começou a entrar em casa das famílias portuguesas e a ganhar a admiração de miúdos econsumi graúdos. Muitos produtos de merchandising foram criados e surgiam aos poucos como ofertas dentro das embalagens de cereais (autocolantes, brinquedos, livros de colorir, réguas, jogos e passatempos, agendas, livros de banda desenhada, etc.). Mais tarde, já com a associação à rubrica Boa Noite, da RTP, foi lançada uma linha de almofadas.

Três décadas depois, o Vitinho está de volta. E novamente pela mão de José Maria Pimentel. Desta vez não vai à televisão, vem em forma livros — para já são três, mas a coleção de vinte já está acordada com a editora Dom Quixote (Leya) para os próximos cinco anos. O primeiro é O Grande Livro do Vitinho, uma homenagem a todos os que tornaram possível esta história, espécie de legado para os pais, com todas as informações sobre o personagem e os bastidores da sua criação. Os outros dois (É a Dormir que se Cresce e Um Dia eu vou Ser Grande) serão lançados a 9 de novembro (apesar de já estarem à venda nas livrarias desde 24 de outubro) e pretendem conquistar as novas gerações.

A coleção de vinte livros, com textos e ilustrações de Pimentel, terá um caráter educativo, com histórias associadas a mensagens temáticas relacionadas com o crescimento saudável. «Nutrição, desporto, prevenção de acidentes domésticos, entre outros, são os temas a abordar. Vamos seguir um rumo pedagógico», diz o autor.

Recuperar o Vitinho e dar-lhe nova vida era uma ideia antiga de José Maria Pimentel. O sucesso do personagem há trinta anos é um bom estímulo. «Julgo que não há criativo algum que espere que o seu trabalho tenha este tipo de impacto», diz o designer. «O trabalho dos criativos é sempre emocional, envolvente e esforçado, mas acaba assim que se pousa a caneta e se inicia outro projeto.» Até porque este está longe de ser o melhor trabalho da carreira, acredita o criador. «Os meus melhores projetos caíram porventura totalmente no esquecimento e não tiveram o mesmo alcance.»

Quando criou o Vitinho, Pimentel inspirou-se numa das filhas, Ágata, à época com 2 anos, para alguns traços fisionómicos do boneco. O facto de andar descalço vinha da ideia de natureza, em ambiente rural, e simbolizava alguma liberdade. Vitinho começou por se chamar «Vita», porque se associava a vida, vitalidade, vitamina, e caminhou depois para «Vitinha» até chegar à designação final.

O lançamento de O Grande Livro do Vitinho, É a Dormir que se Cresce e Um Dia eu vou Ser Grande terá lugar no dia 9 de novembro, às 18h30, na Livraria Buchholz, em Lisboa [Rua Duque de Palmela, 4]. A apresentação estará a cargo de João Mendes Martins, autor da letra da canção.