O português que põe na estrada os carros mais luxuosos do mundo

Texto Alexandre Soares, em Nova Jérsia

No segundo dia de aulas do curso de alemão, quando já estava na faculdade a estudar engenharia eletrónica, Pedro Manuel Mota fez uma série de perguntas à professora. Como se diz «pistão»? E «bielas»? E «velas de ignição»? «Tinha decidido estudar alemão por causa da paixão por carros. Adorava carros alemães e queria poder ler tudo sobre eles», diz, quase trinta anos depois. «Mas a professora não sabia. Ficou confusa com aquelas perguntas.»

Pedro, de 50 anos, diz que se apaixonou por automóveis ainda antes de saber falar. E a sua primeira palavra, garante, foi muito provavelmente «carro». «Era aquela criança que conhecia as marcas todas, todos os modelos. Automóveis foram sempre uma paixão. Adoro a beleza do design, a emoção de conduzir e a complexidade do negócio.» Alguns anos depois de acabar o curso no Instituto Superior Técnico partiria mesmo para a Alemanha.
Foi com a Siemens que saiu de Portugal, em 1990, para trabalhar em sistemas de comboio e metro.

«Em Portugal, as oportunidades de trabalhar na indústria dos carros de luxo são limitadas.»

«Em Portugal, as oportunidades de trabalhar nesta indústria são limitadas.» Depois de completar um mestrado em gestão no INSEAD, em França, candidatou-se a trabalhos na Mercedes, na BMW e na Audi, mas acabou por conseguir trabalho na Opel, uma empresa americana [detida na sua maioria pela General Motors, entre 1931 e 2017]. «Gostei dessa mistura de culturas, de estar a trabalhar na Alemanha mas numa empresa americana.»

Quatro anos depois partiu para a GM (casa das marcas Buick, Cadillac e Chevrolet), na Suíça, e depois para o departamento de aquisição e fusões dedicado às empresas automóveis no banco Lehman Brothers, a partir de Londres.

Mudou-se para os EUA em 2005, para trabalhar na Porsche. «Foram a minha primeira grande paixão, por isso foi muito especial trabalhar para esta empresa.» Viveu primeiro em Atlanta (Geórgia), depois em Newport (Califórnia), e foi subindo na hierarquia da empresa até chegar a vicepresidente para a costa oeste dos EUA, supervisionando mais de 45 revendedores.

Apesar da crise, a empresa multiplicou os resultados na última década: em 2005 vendiam cerca de 800 carros; em 2016 venderam 4011.

Uma década depois, o presidente e diretor executivo da empresa ligou-lhe com uma proposta. Peter Schwarzenbauer, que também é membro do conselho de administração da BMW (dona da Rolls-Royce), disse-lhe que a empresa procurava um líder para a América do Norte. «A perceção que tinha da marca era incrível, por isso fiquei logo interessado. Estava a trabalhar no mercado do luxo e não há nada mais luxuoso do que estes carros.»

A Rolls-Royce foi fundada em 1904, na Inglaterra, quando o engenheiro mecânico Henry Royce e o empresário Charles Ross decidiram construir o melhor carro que conseguissem. A marca produziu os primeiros automóveis de dois cilindros e continuou a inovar. Em 1907 lançaram o Silver Ghost, que completou uma viagem de 23 mil quilómetros sem parar, batendo um recorde mundial. Nascia assim a lenda do melhor carro do mundo.

«Os nossos clientes são muito diferentes. São os melhores, mas também podem ser os piores. São muito bem-sucedidos e têm acesso ao melhor que o dinheiro pode comprar.»

Pedro é casado, tem duas filhas, vive no Connecticut. Quando não está a viajar, conduz todos os dias até aos escritórios da marca em Woodcliff Lake, Nova Jérsia, a partir de onde lidera uma equipa de 35 pessoas e controla 43 revendedores nas Américas, do Chile ao Canadá. Apesar da crise, a empresa multiplicou os resultados na última década: em 2005 vendiam cerca de 800 carros; em 2016 venderam 4011.

Além de ter o maior volume de vendas, os EUA são o principal mercado para personalização dos veículos. «Os nossos clientes são muito coloridos. São os melhores, mas também podem ser os piores. São muito bem-sucedidos e têm acesso ao melhor que o dinheiro pode comprar.»

O preço de entrada para o modelo mais barato da Rolls-Royce, o Ghost, são cerca de 225 mil euros, e o mais caro, o Phantom, começa nos 420 mil euros. Personalizar um carro aumenta o preço entre cinquenta a cem por cento sobre o preço-base, o que faz que cheguem rapidamente à marca de um milhão de dólares. A empresa tem na sua história carros que custaram vários milhões.

«Quando os nossos clientes compram um carro, é um momento de celebração. Fazem-no não por necessidade, mas para festejar o sucesso. É bom fazer parte disso.»

O engenheiro trabalha com algumas das pessoas mais ricas e famosas do planeta, mas a empresa tem um protocolo de sigilo que só pode ser quebrado a pedido dos clientes. Um dos americanos que permite a divulgação do seu nome é Michael Fux, o milionário empresário do negócio das camas e colchões, que tem uma coleção de 160 automóveis de luxo e compra um Rolls-Royce personalizado todos os anos. No ano passado, a empresa criou um novo tom de azul, batizado com o seu nome, Azul Fux, para pintar o novo descapotável Dawn Drophead.

Outro cliente de Pedro é David Lee, dono da joalharia Hing Wa Lee. O pai de David nadou cerca de sessenta quilómetros de Macau até Hong Kong quando tinha 13 anos à procura de uma vida melhor. Na cidade chinesa ficou deslumbrado com os Rolls-Royce à frente do Hotel Península e os automóveis tornaram-se, para ele, um símbolo de riqueza e sucesso.

Acabou por imigrar para os EUA, tornou-se rico, mas foi sempre cauteloso com dinheiro. Foi o filho quem acabou por lhe comprar um Rolls-Royce, décadas mais tarde. O empresário já morreu, mas o filho mantém o carro e continua a homenagear a vida do pai comprando novos modelos.

«É por causa de histórias destas que gosto do meu trabalho. Quando os nossos clientes compram um carro, é um momento de celebração. Fazem-no não porque precisam, mas porque querem festejar o trabalho árduo e o sucesso obtido», diz o gestor. «É bom fazer parte disso.»

O PRIMEIRO ROLLS-ROYCE ELÉTRICO

Sabemos que o mundo dos automóveis está a mudar quando uma marca como a Rolls-Royce anuncia planos para lançar o seu modelo de bandeira, o Phantom, com motor elétrico. O exclusivo e luxuoso fabricante de automóveis e motores de avião do Grupo BMW está determinado em abraçar a mobilidade elétrica e abandonar os tradicionais motores V12 a gasolina que fazem parte da sua assinatura de marca.

Para isso, a Rolls desvendou recentemente um Phantom elétrico, ainda na fase de protótipo, mas que num futuro próximo poderá passar a ser uma opção de compra para os seus clientes. A Rolls Royce vai assim curtocircuitar a etapa dos híbridos (combinação de motores elétricos com motores de combustão interna) para passar diretamente à nova era dos motores elétricos que na próxima década se vai generalizar na oferta automóvel.

Torsten Müller-Ötvös, presidente executivo da marca, diz que a decisão não é motivada por uma exigência dos clientes, mas por mudanças legislativas em todo o mundo, sobretudo na Ásia, um mercado importante para a Rolls Royce: «Se o objetivo são emissões zero, então, é emissões zero que vamos oferecer». Não se sabe ainda quanto vai custar. Mas não será barato.
Por Rui Pelejão/MOTOR24