O cura magnético

Notícias Magazine

A ciência do magnetismo vem nos livros e resume-se com relativa facilidade: todos os objectos e materiais possuem uma determinada força magnética, criando uma relação de interdependência e equilíbrio com todas as coisas do universo.

É uma espécie de deus prévio à própria invenção de deus pelo homem, mas não convém dizê-lo ao padre magnético. Ele não apreciaria que se baralhasse a ordem teológica das coisas. Também não é adequado recordar-lhe que a conversa sobre pêndulos e forças invisíveis parece saída de um compêndio de magia negra e outros bruxedos.

O cura magnético é um indivíduo com vasta cultura literária e científica. Não é, por isso, um vedor qualquer que vai com uma varinha pelos campos à espera de detectar água no subsolo por acção de um mistério inexplicável. Ele fá-lo de acordo com regras muito precisas e ungido pelo conhecimento das forças físicas que laboram entre os materiais: é capaz de dizer a que profundidade estão os veios e se a quantidade de água que neles corre justifica o esforço de se abrir um furo no chão.

O pároco esclarece que desde os tempos mais remotos o homem aprendeu a lidar com magnéticas, colocando-as ao seu serviço. Os primeiros locais de culto cristão, como os das crenças anteriores, foram escolhidos precisamente por se encontrarem na confluência de vectores magnéticos importantes. É por isso, explica, que se sente tanta paz no interior de uma igreja das antigas, sendo possível curar aí uma dor de cabeça ou outros achaques menores, provocados, nem mais, por descompensações magnéticas dos materiais de que é feito um homem (ou uma mulher).

O cura magnético parece-me, pois, mais bem apetrechado do que os padres normais para lidar com os males terrenos e espirituais. Num bolso carrega a palavra divina, no outro o pêndulo que detecta as mais pequenas variações dos campos magnéticos individuais e dos seus humores. Pode, deste modo, aplacar os males do corpo e cuidar dos achaques do espírito – e fá-lo tão eficazmente que espanta que ainda não tenha chegado a bispo ou assim.

Conheci-o quando foi ver se havia água suficiente num quintal para lá se poder construir uma piscina. Não havia. Mas, por sorte, não nos faltou o vinho. Ficámos com o magnetismo impecável.