Pergunta para o leitor: trocava a sua profissão pela minha? Espero que a resposta seja negativa para a maioria, desejo que as vossas vidas sejam interessantes, mas tenho a certeza de que muitos trocavam já. Parece bazófia. E é. Mas tenho desculpa: sou jornalista. Sabem, a melhor profissão do mundo. Não temos especialidade a não ser o mundo. Nem local de trabalho a não ser o mundo. Não temos horário a não ser as horas todas do dia. Temos o mundo para explicar, as suas histórias para contar. E estamos lá, no centro do mundo, onde ele muda e avança. Sempre.
Se dúvidas houvesse sobre este meu ponto, os tempos mais recentes vieram demonstrá-lo. A crise tirou do negócio do jornalismo muitas das receitas que cá vinham parar por sermos os únicos lugares onde a comunicação era mesmo social, (e, aproveitando aquilo sobre o que os leitores queriam informar-se, vinham os anunciantes). Mas, apesar das dificuldades laborais que isso acarretou, os jornalistas continuam a chegar à profissão e a gostar sempre muito de fazer o que fazem.
Quando se é jornalista é porque se quer ser jornalista – é uma profissão dura, em vários planos. É uma profissão de confronto. Com o mundo, os que não querem que contemos as histórias que os põem em causa. Depois, com os nossos pares. Mas também connosco próprios, com as nossas convicções, aquilo em que acreditamos. Há uma experiência sempre ímpar: olhar nos olhos de alguém que julgávamos ser sumariamente culpado e sermos inspirados por um sentimento para o qual não estávamos preparados, a compaixão, por exemplo.
Se tivermos abertura de espírito suficiente, estar assim, exposto ao mundo e a tudo o que de estranho nele acontece, dá-nos o calo que é a coisa mais importante que tem esta profissão e o que a torna imprescindível numa sociedade que se pretende informada. Esse olhar treinado para analisar, essa pena a explicar, esse foco de câmara que sabe onde está o ponto que conta toda uma história. Sermos mediadores, curadores, explicadores, isso é o que sempre distinguiu os jornalistas – e continuará a distinguir, qualquer que seja o formato em que o façamos.
Tudo isto é-nos passado pelos anos e anos da tarimba dos que andam nisto desde antes de nós. Com eles aprendemos, às vezes apenas por estar junto a eles, a ouvi-los ao telefone com uma fonte, num soslaio para o bloco de notas ou, então, em conversas entusiasmadas de redação ou de café e perguntas diretas. Porque os jornalistas são, também dos mais entusiásticos profissionais do mundo, e em qualquer discussão, são dos que mais bem preparados estão para argumentar sobre qualquer assunto.
Talvez por isso, pelas acérrimas discussões suscitadas pelo recente congresso que reuniu os jornalistas portugueses, o leitor tivesse ficado com uma ideia errada, de queixas e lamúrias. Mesmo que não pareça, nós gostamos muito do que fazemos. E fazemo-lo de corpo, alma e paixão, com a convicção de que esta é mesmo a melhor profissão do mundo. Por isso, não, caro leitor, não trocava a minha profissão pela sua.