Afinal, as asneiras são ou não são censuradas no YouTube?

Texto de João Tomé

Em fevereiro de 2005 – dois anos antes de o iPhone surgir no mundo e, assim, revolucionar a visualização de vídeos no telemóvel –, um grupo de três ex-funcionários da PayPal criaram na Califórnia o serviço de partilha de vídeos YouTube. O crescimento foi rápido ao ponto de, em novembro de 2006, terem sido comprados pela Google por uns incríveis 1,65 mil milhões de dólares.

História da internet e milhões à parte, pouco mais de 10 anos depois, o YouTube é não só uma plataforma global na qual se carregam mais de 400 horas de conteúdo (muito dele original) por minuto, como nele são vistos mil milhões de minutos por dia, que têm uma influência esmagadora nas novas gerações, ao nível da que a televisão teve nos anos 1970 e 80. Com um senão: este meio é bem menos controlado do que era a televisão.

Os jovens youtubers usam uma linguagem entusiástica, são frequentes os gritos e as asneiras, mesmo quando do outro lado está uma audiência na sua maioria com menos de 15 anos.

Neste mundo de domínio audiovisual daquele que é o segundo site mais popular no mundo, os vídeos infanto-juvenis são uma galinha dos ovos de ouro para muitos. É lá que nascem com facilidade novos heróis, dos chamados youtubers (criadores que mostram as suas vidas, contam as suas histórias, fazem tutoriais sobre os mais variados assuntos, desde jogos a maquilhagem) às personagens que já figuram nos canais tradicionais como o Panda, a porquinha Peppa, o Ruca ou em discos como os do Avô Cantigas. O YouTube permite ver os vídeos que queremos, quando queremos e tem ainda uma opção chamada Autoplay, que permite continuar a ver vídeos sobre o mesmo tema.

É aí que entra a preocupação de muitos pais. Os jovens youtubers usam uma linguagem entusiástica, são frequentes os gritos e as asneiras, mesmo quando do outro lado está uma audiência na sua maioria com menos de 15 anos. O lado constantemente entusiasmado e sempre em busca de novidade é uma técnica que permite chegar aos mais novos e mantê-los viciados em busca do novo vídeo, da nova aventura.

A plataforma que permitiu a vários jovens artistas darem o primeiro passo para o estrelato na música (de Justin Bieber a Shawn Mendes, passando por Ed Sheeran), serve também para outros contarem o seu dia a dia em vlogs que se tornam novelas viciantes para os mais novos e, com isso, ganharem milhares de euros por mês graças à publicidade nos seus vídeos.

Markl contra as asneiras e os gritos

O YouTube anunciou, a nível mundial, em agosto do ano passado que ia remover a opção de rentabilização nos vídeos em que fossem ditas asneiras. Através do uso de filtros foi assim possível fazer que os youtubers internacionais fossem obrigados a tapar ou dizer menos asneiras, com o objetivo de não habituar os mais novos sedentos por novos conteúdos dos seus novos heróis a usar esse tipo de linguagem.

A plataforma não explica quais são as palavras proibidas até porque, segundo um responsável da Google explicou à Notícias Magazine, «é algo que pode estar sempre a mudar uma vez que também temos de ter cuidado para não limitar os criadores de conteúdos e não entrar no domínio da censura».

A medida foi contestada por vários dos principais youtubers (ChipDaddyTV, Philip de Franco, Markiplier), acusando a plataforma de censura e de não os deixar serem quem são. Um dos mais populares, PewDiePie, foi obrigado a mudar o discurso este ano até por outros comentários polémicos.

O mal continua para muitos pais ao ponto de Nuno Markl, em setembro, ter escrito uma carta aberta chamada: «Carta de um pai a youtubers tentando não ser maçador».

Em Portugal, a medida não afetou quase em nada os youtubers mais populares como SirKazzio (4,9 milhões de subscritores e mais de 900 milhões de visualizações nos seus vídeos), Wuant (2,4 milhões de subscritores e mais de 585 milhões de visualizações) ou D4rkFrame (3,2 milhões de subscritores e mais 387 milhões de visualizações), todos eles residentes na famosa Casa dos Youtubers.

Além dos filtros «anti-asneiras» não serem tão ativos em português, os jovens criaram uma solução: na edição dos vídeos, que já costuma ter muitos cortes no discurso para dar ritmo, é cortada a parte da asneira e o filtro nunca entra em ação, permitindo manter a rentabilização dos vídeos.

O mal continua para muitos pais ao ponto de Nuno Markl, em setembro, ter escrito uma carta aberta chamada: «Carta de um pai a youtubers tentando não ser maçador». Nela apela para que não digam palavrões e gritem menos e usem bem o poder que têm.

Isto porque o humorista de 46 anos tem visto o seu filho de oito anos, Pedro, a ser influenciado. Markl dá-lhes os parabéns pelo incrível sucesso, mas lembra-os da responsabilidade de comunicarem para «miúdos de oito anos ou até menos».

As sugestões do Youtube vão no sentido de os pais controlarem o que os filhos veem, ativando os vários filtros para crianças ou usando a apP YouTube Kids.

O humorista continua: «Vocês deveriam estar gratos – e suponho que estejam – pela fidelidade com que pessoas como o meu filho vos seguem e adoram. Vocês são novos heróis. E, nunca é demais frisar, vocês têm poder.» À carta de Markl seguiram-se outros depoimentos em colunas de jornais de pais preocupados.

Respondendo à pergunta do título, sim, é provável que, se o seu filho assiste aos canais destes jovens youtubers, ouça com frequência linguagem com asneiras (poucos usam o sonoro «pi»).

As sugestões do Youtube vão no sentido de os pais controlarem o que os filhos veem, não só ativando os vários filtros para crianças disponíveis na conta pessoal, mas usando a aplicação para aparelhos móveis, YouTube Kids. Só há um pequeno grande problema: ainda não está disponível em Portugal nem em iOS nem em Android.