Trump vs. Hillary: quem vai ganhar?

Dois políticos luso-americanos que estão de lados opostos da barricada discutem a mais polémica e disputada das eleições para Presidência dos últimos anos. Da face mais sombria de Hillary à vergonha que os republicanos têm de Trump, uma entrevista dupla com informação de dentro, de onde tudo está a acontecer.

Um nasceu numa ilha do Atlântico. O outro, à beira do Pacífico. Um é português, do Pico, naturalizado americano. O outro é americano, da Califórnia, descendente de açorianos de São Jorge. Um é democrata. O outro, republicano. Que ninguém se engane com diferenças: António F. Cabral e Devin Nunes têm muito em comum. São políticos luso-americanos, produtos das relações entre EUA e Portugal, e foi o sonho americano que levou os pais de um e os avós do outro a sair dos Açores e emigrar.

Esse tanto que têm em comum leva-os a encontrarem-se muitas vezes em Lisboa, na FLAD. Debatem temas comuns, como a Base das Lajes, que ambos defendem. Às vezes discordam, como há pouco tempo, a propósito das eleições americanas. Tony Cabral tem 61 anos, é um democrata clássico do Massachusetts. Devin Nunes tem 43 anos, é neto de açorianos, vaqueiros do Vale de São Joaquim, e a sua ligação à terra fê-lo republicano em estado de democratas. O início da carreira política de ambos foi no ensino, Devin no Board da universidade, Tony professor do secundário. Tony é congressista estadual desde 1991, Devin é congressista federal desde 2003.

«Hillary é a pessoa mais bem preparada para chegar aqui, numa eleição presidencial. Ela vai mudar o mundo, inspirar pessoas e empresas.» Tony Cabral, democrata

No debate da FLAD notou-se o entusiasmo de Tony com Hillary Clinton, e o desconforto de Devin com Donald Trump. Devin é amigo de Paul Ryan, o porta-voz dos republicanos no Congresso que é um “opositor” do trumpismo. Conservador – e católico –, Devin não pode estar agradado com a campanha de Trump, até porque também vai a votos. Desculpa o candidato com falta de experiência. «É estrela de reality shows, não sabe medir as palavras, e que são usadas contra ele próprio.» Lembra-lhe Schwarzenegger – «e outros candidatos do género, que nunca tinham chegado ao nível presidencial». Apesar das críticas, Devin fez uma recolha de fundos para a candidatura republicana, em Tulare, que rendeu um milhão e meio de dólares.

«Trump é estrela da reality tv, sem experiência política e o que diz volta-se contra ele. As pessoas querem os seus problemas resolvidos.» Devin Nunes, republicano

Ganhas as eleições para Hillary no Massachusetts, Tony tem feito campanha no mais disputado New Hampshire. Ele é um histórico apoiante de Hillary – esteve com ela nas primárias contra Obama. «É a pessoa mais experiente a alguma vez concorrer», diz em inglês marcado pelas consoantes lusas. «Ela vai quebrar este teto para as mulheres no mundo. Como secretária de Estado, faziam parte da sua agenda os assuntos das mulheres. É assim que as coisas mudam: ter pessoas a tomar decisões, não só ter um bom emprego, um bom título. Isso vai inspirar pessoas e empresas.» Ambos consideram que as eleições são um alerta para o establishment, para Washington. «Basta ver as sondagens», recorda Devin. «Nunca houve números tão baixos. Já deviam estar nos 40 e muitos, 50 por cento. Os americanos querem soluções para problemas e não os vêem resolvidos.» Para ele, Trump é efeito do descontentamento, mas Hillary é mais uma das causas. «A máquina política dos Clinton», como ele lhe chama, é viciosa e está viciada.

Tony vive entre Boston e New Bedford, zona pós-industrial que perdeu várias fábricas e 20 mil empregos nos últimos anos da crise. Sabe dos que lhe dizem que se estão nas tintas e votam Trump. «Temos de responder às suas frustrações e desejos. Há medo, perda de esperança… Temos de recriar uma economia que não deixa as pessoas para trás. Trump capitalizou nesse medo.»

O democrata chama à responsabilidade o partido republicano, a quem acusa de ter tentado dividir o país: «O único objetivo era travar Obama no Congresso.» Devin riposta: «Obama é que não quis trabalhar com o Congresso.» Tony espera que os republicanos conservadores voltem a tomar o partido. «Não há lugar do meio, ninguém com quem falar, com quem acordar, chegar ao consenso.» Devin não cede – embora tenha participado na reunião do Comité Republicano onde se discutiu o apoio a Trump. «Ninguém sabe qual vai ser o resultado. Tivemos umas primárias muito disputadas – e Trump ganhou. Temos de respeitar os desejos dos votantes», diz. Dia 8, ambos saberão o que os espera. E ao mundo inteiro.


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TONY CABRAL
Deputado estadual do Massachusetts, democrata
Tem 61 anos, nasceu no Pico, vive nos EUA desde os 14 anos e é congressista estadual, democrata, no Massachusetts, desde 1991. Antes foi professor de línguas nas escolas públicas. A sua atividade política na campanha de Dukakis catapultou-o, da comunidade portuguesa de New Bedford para a política do estado. Foi candidato a mayor daquela cidade de grande minoria portuguesa.

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DEVIN NUNES
Deputado federal pela Califórnia, republicano
Filho e neto de vaqueiros do Vale de São Joaquim, com origem na ilha de São Jorge, nos Açores. Republicano, foi diretor de agricultura para a Califórnia, nomeado por George W. Bush. Desde 2003 é eleito pelo 22º distrito para a Casa dos Representantes desde 2003. Preside ao Comité das Informações.