Sobre um certo e-mail engraçadinho que andou por aí a circular

Notícias Magazine

– Ainda não falámos disso. Estavas inspirada no teu e-mail.
– Eu estranhei, mas não disse nada. Pensei que tivesses ficado chateado comigo.
– Eu, chateado? Não. Por que é que havia de ficar chateado?
– Pensei que tivesses ficado ofendido por te dar tantos recados.
– Não fiquei nada ofendido. Tenho é de te agradecer. Se não fosses tu eu não sabia o que é um termómetro.
– Eu estava no gozo. Eu sei que sabes o que é um termómetro. E aquilo só tem um botão, para ligar e desligar.
– Estás a ser engraçadinha.
– Vá lá. Ri-te. Não amues. Era uma maneira de te dizer que eu preparo muito mais coisas do que tu para as miúdas e que às vezes não basta que tu me ajudes. Quero é que tu faças. De manhã, por exemplo.
– Eu farto-me de fazer coisas. Estás a ser injusta.
– Ah sim? Quem é que prepara a roupa das miúdas no dia anterior, para elas terem logo o que vestir, quando acordam? És tu?
– Não. És tu. Mas sou eu que preparo as mochilas.
– Sim. Um casaco de malha, uma garrafa de água, uma peça de fruta e uma boneca. É a mochila que tu preparas. Todos os dias. Obrigado.
– E faço outras coisas também. Sou eu que as levo de manhã.
– Sim. E sou eu que as vou buscar.
– Sou eu que as levo à ginástica. E à música.
– É verdade. E o que é que eu estou a fazer nessa altura? Quando tu as levas à ginástica e à música?
– Sei lá. Estás a fazer coisas.
– Sabes, pois. Quando chegas a casa com elas, depois da ginástica ou da música, tens o jantar feito. Pronto a comer. Não aparece por milagre. Sou eu que o preparo. Nesse dia e nos outros todos. Quando é que foi a última vez que fizeste uma refeição para elas?
– Ontem. Ontem fui eu que fiz o almoço.
– Ontem foi sábado. Quem é que faz as refeições na semana?
– És tu. Porque chegas mais cedo a casa.
– E quem é que pensa nas refeições? No que temos no frigorífico, no que é preciso comprar, no que é preciso deixar a descongelar.
– És tu. Mas sou eu que vou às compras. Sempre.
– Compraste ovos, ontem?
– Ovos? Não. Não estava na lista.
– Quem é que faz a lista? Sou eu, não sou?
– Não me chateies. Fazes mais porque estás mais em casa. Eu chego mais tarde, estou a trabalhar.
– Pois estás. E quando eu estou com as miúdas, porque as vou buscar à escola, porque vou com elas comprar os ovos de que me esqueci de te pedir para comprar ou porque estou a fazer o jantar, não estou a trabalhar? Esse trabalho não conta?
– Conta, claro. Eu não digo que não conta.
– Então se conta, não passes a vida a dizer que não fazes mais porque estás a trabalhar.
– Estás a ser injusta outra vez. Farto-me de ajudar.
– Ora lá está. É isso mesmo. Tu ajudas. Eu faço.
– Porra, não era isso que eu queria dizer.
– Não te chateies com o e-mail. Era ironia. Para te rires e ficares a pensar. As minhas colegas fartaram-se de rir.
– As tuas colegas? Tu partilhaste aquilo?
– Achas que eu te escrevia aquilo e não mostrava a ninguém?
– Quem é que viu?
– Algumas pessoas. E os maridos delas.
– Os maridos??!!
– Não te enerves. Onde é que está o teu sentido de humor?

O e-mail em questão pode ser lido AQUI.

[Publicado originalmente na edição de 31 de janeiro de 2016]